Eu aqui em Délhi me sinto um Indiana Jones, de tumba em tumba a visitar. Já sei de onde veio toda a inspiração pra aqueles filmes. Os islâmicos que dominaram esta região eram fissurados por construir tumbas para si mesmos, mausoléus para amores ou amigos, e coisas do tipo. Fizeram inúmeras no tempo em que dominaram esta região, entre os séculos XII e XIX (até a derrota para os ingleses, que então “libertaram” os hindus do norte da Índia do jugo islâmico; vocês sabem como isso funciona). São, verdade seja dita, dos monumentos mais belos da cidade.
A Índia, apesar de ser um país de maioria hindu, tem um passado islâmico que poucos ocidentais conhecem. Todo este norte da Índia (onde fica a capital) foi posse de soberanos islâmicos por séculos. Não “árabes”, mas islâmicos oriundos do Afeganistão e que aqui constituíram o Império Mogol (não confundir com mongol), um dos maiores da Era Moderna.
Todos os grandes monumentos a visitar no norte da Índia, com o famoso Taj Mahal, os palácios do Rajastão, e os vários sítios aqui em Délhi são praticamente todos de origem islâmica.
O que estamos acostumados a ver como o país “Índia” surgiu apenas no século XX (mais precisamente com a independência do Reino Unido em 1947). Até então, e desde muito antes de a Coroa Britânica fazer destas terras colônia sua, isto era um agregado de vários reinos que englobavam também o Paquistão e Bangladesh — a região que os europeus chamavam de “as Índias“. Vários soberanos disputavam território. Os próprios portugueses, quando aqui vieram no século XV, se impuseram fazendo “jogo de alianças” com soberanos da costa onde comerciavam especiarias.
O islã, surgido no século VII, era apenas uma religião minoritária na Índia, até que no século XII o que hoje são o Paquistão e o norte da Índia foram invadidos por exércitos da Ásia Central. De 1206 a 1526 se constituiu aqui o Sultanato de Délhi, que tinha esta cidade como capital e ia do atual Afeganistão ao oeste da Índia.

Em 1526, foi a vez dos sultões de Délhi sofrerem uma invasão do centro da Ásia, da parte dos turcos-mongóis herdeiros de Gêngis Khan (ou, ao menos, assim se declaravam). Naquele ano, o grande líder Babur venceu o sultão de Délhi na Batalha de Panipat e conquistou este território. Iniciou-se assim o Império Mogol (Mughal em inglês), cujo nome na verdade é uma corruptela de como os árabes e persas chamavam este povo que lhe estava a leste. À época, temos nesta pouco estudada (por nós) parte do mundo os chamados 3 impérios da pólvora: o Império Turco-Otomano, o Império Persa Safávida, e o Império Mogol. A alcunha de “da pólvora” é porque, na visão de alguns historiadores, o uso dominante de canhões e artilharia ente os idos de 1300-1700 por esses impérios deu-lhes grande vantagem competitiva em suas conquistas da Europa à Ásia.

Durante todos esses séculos, é curioso notar, tivemos o caso de líderes islâmicos/muçulmanos governando uma população majoritariamente hindu (com ainda algumas minorias cristãs aqui e ali). É curioso porque, em geral, atribui-se aos islâmicos no Ocidente uma tolerância exclusivamente às religiões cristã e judaica, o chamado “povo do livro”, que compartilha com os muçulmanos a mesma origem bíblica e cultural. No entanto, aqui na Índia o pragmatismo falou mais alto, e houve mesmo governantes que tinham uma esposa islâmica, outra hindu, e uma terceira cristã.
O filho de Babur, o conquistador, foi Humayun (1508-1556), cujo mausoléu é um dos principais pontos a se visitar em Délhi. Mirza Nasir ud-din Baig Muhammad Khan Humayun, mais conhecido pelo seu último nome, morreu ao tropeçar em sua biblioteca e cair escada abaixo (veja você). Sua esposa então ordenou a construção de um belo mausoléu onde repousaria o seu corpo.



