Instalei-me na Rua Karl Marx, perto da Praça da Vitória e não muito distante da Praça de Lênin. Tudo na Bielorrússia remonta ao comunismo, ou à Revolução Russa de 1917, ou à vitória contra os alemães nazistas na 2a Guerra Mundial. O que mais há em Minsk são monumentos ou memoriais de guerra.
Instalamos-nos eu e Alina, uma amiga romena, por uns dias num apartamento ali arranjado pela nossa colega bielorrussa, Lena. Na Bielorrússia não há albergue barato nem pousadinha, só hotel caro para quando vem a delegação chinesa ou de algum outro país comunista, ou turista rico. Então o jeito é alugar um flat e pagar por diária, meio que por debaixo do pano.
Já na primeira manhã, após tirar eu uma breve pestana de poucas horas depois de chegar de madrugada e após pegarmos Alina na estação, Lena me manda uma mensagem de texto: “Os caras estão querendo saber quando é que você vai estar em casa pra eles irem aí pegar o pagamento“.
A idéia de que (bielo)russos vêm à sua porta cobrar dinheiro não é lá muito confortável.
Eu respondi à mensagem, não deu 10 minutos e um careca branco de olho azul já estava na minha porta. Aí você abre a porta com aquela cara séria de “não sou maria-mole mas também não quero encrenca com você” (lembre-se, nada de sorrisos demais aqui).
Não vou mentir: o cara foi até gente boa, embora — como todos os outros — continue falando russo mesmo quando está óbvio que você não entende nada.
Uma vez resolvido o pagamento, tínhamos Minsk para nós. Eu confesso: a cidade é um charme, e muito mais atraente do que eu imaginava.
Eu imaginava um lugar decadente, feio, acabado. Mas que nada, os prédios principais são super conservados (melhores que na Polônia, Eslováquia e outros locais que visitei), e as ruas são bem largas e boas.




Os carros não são do tempo da União Soviética — como você pode ver, à exceção daquele trabant velho ali no meio da foto. O tráfego é muito mais tranquilo que em qualquer outro país da Europa aonde eu já tenha ido (também, acho que ruas largas assim eu só vi na França ou na Alemanha, países muito mais ricos e populosos).


Você, naturalmente, não vai ver aqui nenhuma das suas franquias conhecidas do Ocidente (McDonald’s, Starbucks, Zara, Louis Vuitton…). Nada. Ao contrário, verá marcas de países comunistas, deste e outros, marcas que você sequer sabia que existiam. Entramos num mercadinho e encontramos bananas do Vietnã, por exemplo.
As coisas do dia-dia (pão, batata, ovos) são muito baratas. Já coisas mais “exóticas”, como chocolate (ou as próprias bananas do Vietnã), são comparativamente caras. Surpreso fiquei foi de encontrar coca-cola aqui. Tem. Não vi grandes supermercados, mas vendinhas de bairro tipo antigamente ou em cidade do interior.
Pizza, tem. Nós comemos uma numa tranquila lanchonete de esquina que se parecia com qualquer outra do Ocidente. As garçonetes também, e foram simpáticas. A única diferença foi que — como seria ao longo de toda a nossa estadia na Bielorrússia — só ouvimos músicas dos anos 80 pra trás, em inglês mesmo, aquelas pop retrô da época em que Madonna era jovem.


Eu não cheguei a presenciar, mas escutei dizer que todas as quartas-feiras têm havido protestos aqui em Minsk contra o governo autoritário de Lukashenko. As pessoas simplesmente se aglomeram numa das praças principais, e fazem silêncio.
Sim, porque se protestar abertamente vai preso. Na semana anterior haviam algemado até um diplomata sueco que estava no bolo, e depois soltaram. O regime não manda gente para a Sibéria, mas continua com aquele sabor de opressão dos tempos de União Soviética.
Surrealmente, eu soube que há uma nova lei na Bielorrússia: é proibido fazer compras em horário de trabalho. Se a polícia te pegar em alguma loja durante o expediente, tá despedido. Certa vez, contaram-me aqui, trancaram todas as portas de um shopping center durante o horário de trabalho (sim, na Bielorrússia tem shopping, apesar de tudo) para que ninguém escapasse, e a polícia foi checando um por um, e todo mundo que deveria estar no trabalho perdeu o emprego. Só quem pode é aposentado ou quem estiver de licença. Surreal ou não é?
Ao mesmo tempo, é curioso notar que, mesmo debaixo da opressão, as pessoas continuam a conseguir realizar pequenos prazeres do dia-dia.
Você, mesmo aqui, vê gente passeando tomando sorvete e crianças brincando com suas famílias na praça. Ou seja, a situação política e econômica aqui é sofrível, mas isso não necessariamente impede as pessoas de terem vida, de se virarem dentro do que é possível.
Em alguns aspectos, a vida aqui me parece até mais sossegada que no Brasil. Por exemplo, não senti ameaça de criminalidade em momento algum. Mas, não, eu não moraria aqui (só se estivesse muito apaixonado por uma linda bielorrussa e por alguma razão tivesse de morar aqui).





No post seguinte, os nossos bordejos pelo interior do país.
Gostei da cidade. Gostaria de conhecê-la. Quem sabe, um dia? Gosto dessa parte histórica.
Belas avenidas e boullevares. Muito bem arborizada.