O meu primeiro dia do ano foi literalmente cavernoso. Depois da fuzarca de réveillon em Ljubljana (post anterior), a cidade estava deserta. Recebi mil recomendações sobre cafés a visitar, mas tudo estava fechado. Meu café da manhã foi portanto extraído de máquinas automáticas. Uma delícia. Na verdade, foi melhor do que eu imaginei: consegui um iogurte de côco, um sanduíche, e de quebra um pacote de batata chips. Senti-me como se tivesse feito uma feira, naquela entradinha despretensiosa numa avenida em Ljubljana. A caminho da rodoviária.
Como era feriado (1 de janeiro), muito da cidade estaria fechado, e resolvi deixar pra visitá-la depois. Iria eu às Cavernas de Postojna [lê-se Postóina], uma das maiores atrações da Eslovênia. São 20 kilômetros de cavernas, usadas para turismo desde a época do Império Austríaco dos Habsburgo no século XVII. O próprio imperador esteve aqui certa vez, e o destino era popular na Áustria. Inclusive, é estranho ver pixações do tipo “Eu estive aqui” datadas de 1800 e coisa. (A gente, não sei por que, às vezes tem a ilusão de que as pessoas antigamente eram muito cuidadosas com a natureza. Não aqui.).
Mas vamos ao passeio.




A viagem de ônibus é curta, e deu pra ir farofando no caminho. Você tem umas visões campestres do interior da Eslovênia, ali naquele quase-Alpes, e chega a Postojna, uma cidadezinha com a cara e o jeito típicos do centro da Europa (vá ao interior da Áustria, ou da República Tcheca, e verá as mesmas construções, o mesmo jeitão das cidades).
Nesta aqui, havia um micro-centro com restaurante, ringue de gelo para patinação, e pouco mais que isso. As cavernas ficam a 1km de caminhada, uma caminhada agradável e tranquila. Eu, sozinho, sem conhecer ninguém num raio de muitos quilômetros, fui tomado por aquela sensação de estar à deriva, de “estar por aí”, despreendido, como andarilho. A sensação é boa se você souber apreciá-la. Não é o tipo de coisa que você talvez vá querer para todo o sempre, mas de vez em quando, faz bem.



Era ainda de manhã, e o local estava abrindo. À entrada das cavernas, há uma infraestrutura para turistas: um restaurante, uma lojinha de souvernirs etc., além, é claro, da bilheteria. A entrada podia ser “franca” na época dos imperadores da Áustria, mas hoje não é mais. Mas não é caro. Visitei primeiro um museu dentro das cavernas, onde é possível ver a salamandra sem olhos, acostumada a viver na escuridão. Em seguida, tive um almoço chinfrim ali naquele restaurante mesmo — onde comi batata amassada e a sobremesa foi a banda de limão que veio pra espremer sobre a salada. Eu disse que o dia foi cavernoso.
Há horas fixas para a entrada nas cavernas maiores, o que ocorre só com os guias, e em grandes grupos. Lá dentro você pega um trenzinho (que faz você se sentir em Os Caçadores da Arca Perdida) e depois há um longo trecho a pé. A visita toda dura umas 2 horas, então é bom você gostar de caverna. Mas, a menos que você seja claustrofóbico, é difícil não se maravilhar com todos as estalactites e estalagmites. (Se você até hoje não sabe qual vem de cima e qual vem de baixo, faça como eu, que associou estalac-tite ao teto — é a que vem de cima). Elas são formadas pelos minerais nas goteiras d´água. Aqui me disseram que o processo constrói 1 centímetro a cada século. Portanto, um estalactite de 2m levou 20 mil anos para se formar. Faz você olhar para eles com mais respeito.








Prepare-se porque há muita gente. Tantas que os guias dividem os grupos por idioma. Os italianos, claro, eram os mais sonoros. Às vezes você tinha a impressão de que ia desmoronar tudo. Fui no grupo anglófono, com um guia bem amistoso. Foi nos mostrando a “sala branca”, a “sala vermelha”, e assim por diante. Até que “E esta aqui é a sala negra”, e pum, apagou as luzes. Dá uma sensação de impotência imensa, quando você se dá conta do quando depende do sentido da visão, e que a sua chance de achar a saída no escuro éa zero. Ia ter que viver igual à salamandra.
Duas horas de passeio depois, saímos. Como os dias de inverno aqui são curtos, já não havia lá muita luz, mas já era bem melhor que o escuro. Voltei ao restaurante e tive a melhor refeição do dia: a merenda da tarde, um belo bolo esloveno.

Fiz a caminhada de volta à cidade, e ainda fiquei ali enrolando um bocadinho. Havia que esperar até a chegada do ônibus de volta a Ljubljana. Na falta de outra coisa, fiquei ouvindo música na praça pública, assistindo à criançada patinar no gelo melhor do que eu. Eu precisaria de um pinguim igual ao desse menino aí abaixo.


Deixo vocês com algumas fotos da região da entrada das cavernas, tiradas ainda à luz do dia. Belo cenário invernal.
