La Paz oferece uma genuína mistura de cultura indígena e colonização espanhola. Apesar dos pesares que observei no post anterior, a cidade tem uma série de pontos interessantes a ver — e comidas típicas a experimentar (a Bolívia é um dos poucos países do mundo onde não existe McDonald’s!).
O centro histórico de La Paz, ainda que suas ruas estreitas e íngremes façam você se sentir emboscado quando passa um ônibus lançando fumaça preta no ar e eliminando o pouco oxigênio disponível aqui a 4.000m de altitude, tem um casario colonial bonito, e praças legais de ver. Prepare-se para os pombos.




Duas observações. La Paz é onde fica o governo, mas não é exatamente a capital. Formalmente, a capital da Bolívia é a cidade de Sucre. É o mesmo que se passa na Holanda, onde a capital é Amsterdã mas o governo e todas as suas instituições ficam em Haia.
Segundo, você talvez tenha notado que as igrejas aqui não são assim tão antigas assim, ainda que a cidade tenha sido fundada em 1548. Salvador e outras cidades coloniais têm hoje ainda igrejas dos idos de 1600. A razão é que La Paz tornou-se a cidade principal da Bolívia há relativamente pouco tempo, só no século XIX. Antes, era Potosí a maior cidade boliviana, e que chegou a se tornar a segunda cidade mais populosa do mundo no século XVII, atrás apenas de Paris. Lá havia a maior mina de prata da Terra, que os espanhóis exploraram sem dó — nem da terra e nem dos indígenas que escravizaram para esse trabalho. Dizem que era tanta prata que podia-se vê-la na superfície sem nem cavar. Foi o equivalente boliviano do que tivemos em Minas Gerais com Ouro Preto.
Como dizia Eduardo Galeano, escritor uruguaio, Portugal e Espanha tinham a vaca mas não bebiam o leite. Exploraram toneladas de ouro e prata das Américas, mas quem se industrializou e enriqueceu foram França, Inglaterra e Holanda. Seja como for, vale a pena caminhar por estas ruas de casario colorido do centro histórico de La Paz.



Já um lugar um tanto bizarro que eu visitei foi o Mercado das Bruxas, uma seção dos mercados de rua dedicada a remédios indígenas, ingredientes para rituais religiosos e coisas do tipo. Algo parecido com o que, sabendo onde procurar, você encontra na Bahia ou no Rio de Janeiro. Só que aqui é mais à vista.
Os produtos vão desde ervas e sementes medicinais até pó de lagarto seco para cicatrizar feridas e fetos de lhama (não me pergunte pra quê).


Esse mercado fica à beira da Rua Sagarnaga, famosa por seus brechós de têxteis e produtos andinos a preço de banana. Se você for também ao Peru, programe-se para comprar as coisas na Bolívia, pois são aproximadamente a metade do preço, e quase sempre os mesmos produtos.
Não, não comprei nenhum remédio, e nem lhama seca. Satisfiz-me com os mates de coca para combater o mal da altitude (ver Chegando aos Andes: Entre a altitude e as folhas de coca em La Paz, Bolívia).
E para comer? Certa vez eu estava passeando com uma amiga estrangeira no centro de Salvador, na Bahia, e ela — habituada à Europa — perguntou se poderíamos entrar em algum café para ela usar o banheiro. Eu tive que segurar a risada, e expliquei que ali havia restaurantes, bares, botequins, mas nada sequer semelhante aos aconchegantes cafés da Europa. La Paz é parecida, só que vi bem menos restaurantes, pois acho que o hábito brasileiro de almoçar em buffets na rua não chegou à Bolívia.
Você aqui se vira ou com comidas de rua (se não tiver resistência a essas comidas mais “povão”, estilo mercadão e parada de ônibus), ou em restaurantes de hotel e outros para turista, se quiser algo mais refinado. Eu fiquei com uma mistura dos dois.


Gosto dessas coisas simples, despretensiosas, e com sabor. Quando eu digo que a Bolívia me chamou a atenção por certos hábitos que eu não havia visto em outros lugares, as pessoas às vezes ficam sem entender. Mas nunca, em nenhum outro lugar, nem nos países ditos “os mais civilizados” como na Europa ou Japão, alguém havia me vendido salada de fruta no copo de vidro e dito pra eu levar embora e reencontrá-la na praça depois. Me chamou a atenção, primeiro, por não gerar o lixo dos copos descartáveis que hoje estão por toda parte. E segundo pelo nível de confiança e agregação social — no Brasil, as pessoas levariam o copo embora, e mesmo na Europa ninguém confia que você vá embora e volte pra trazer. Só vi na Bolívia, e adorei. (E a propósito, a salada estava muito boa.)

Vamos às partes mais sofisticadas agora, que você só acha em hotel e outros lugares pra turista — mas que valem a pena. A comida boliviana mais famosa mundialmente no momento provavelmente é o quínoa, este cereal que o povo daqui cultiva há muitos séculos e que descobriu-se ser riquíssimo em nutrientes — na Europa é um dos queridinhos dos macrobióticos e vegetarianos, mas custa um tiro. Aqui na Bolívia fazem de tudo com ele, desde sopa a hambúrguer, e até sobremesa.
As batatas, caso você não saiba, são nativas aqui dos Andes e foram domesticadas em dezenas de variedades. Então são comuns também. (“Batata, arroz, quínoa e macarrão — na Bolívia eles lhe servem quatro carboidratos no mesmo prato!“, comentou certa vez um amigo meu biólogo, revoltado.)



Eu volto na próxima com outras artes daqui da Bolívia.
Uaaaauuu, que beleza o centro histórico de Nuestra Señora de La Paz. Linda Plaza Murillo, Palacio, Catedral etc e tal. Belas ruelinhas com casarões bem cuidados, embora rodeados pela pobreza. Uma beleza para os olhos e para quem gosta de arte e História.
Adorei os pombos e as vendedoras. Lindas as crianças . Belos e descontraídos jovens arrulhavam como os próprios pombos nos seus coloquios.. Pareciam bem à vontade e felizes, embora a realidade do país.
Vale ressaltar a falta de propaganda estrangeira e de seus produtos . adorei. Nada em ingles …Que exemplo de tentativa de identidade e de recusa da aculturação norte-americana, tão comuns em paises outros como o Brasil.
Muito interessante o enfoque e a postagem. Parabéns, viajante brasileiro.. Gostei.