Berat
Albânia

Berat, Albânia: A cidade das mil janelas

Berat é uma cidade estonteante, tanto pela beleza cênica quanto por sua tamanha autenticidade. Ela é das cidadezinhas mais bonitas de toda a Europa (embora seja desconhecida até mesmo dos europeus, que pouco sabem sobre a Albânia, como comentei antes aqui.) Berat foi a minha cidade favorita no país. 

Fundada pelos gregos antigos nos idos de 600 a.C., Berat foi posteriormente usada pelos romanos e, em seguida, pelos bizantinos ou romanos do oriente (de Constantinopla). Sua fortaleza no alto de uma colina provia a defesa do lugar, com uma cidadela fortificada lá em cima onde as pessoas viviam. Ao longo da Idade Média, aqui foi uma área de fronteira entre os domínios bizantinos e dos eslavos que se instalavam nesta região. Os nativos albaneses, embora nem uma coisa nem outra, viviam sob a jurisdição de estrangeiros.

É a partir de 1385 que os turcos otomanos conquistam Berat (e o restante da atual Albânia) e dão à cidade o tom e o jeito que você encontrará aqui hoje. Embora as fundações de sua fortaleza sejam mais antigas, as casas marcantes — das mil janelas — são dos mais emblemáticos exemplos remanescentes da arquitetura turca-otomana. São casas, em geral, feitas de madeira e pedra, com pintura branca, janelas quadriculadas, e andares superiores às vezes mais largos que os de baixo. Como você pode ver na foto.

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Casario típico otomano aqui em Berat, Albânia.

Cheguei vindo de ônibus a partir de Gjirokastër. Havia um ônibus direto às 10:30h, e o trajeto leva menos de 4h de viagem. O veículo deixa você na rodoviária na parte moderna da cidade, de onde se pode caminhar 40 minutos até o centro histórico ou tomar um ônibus urbano (Berat é pequena, mas nem tanto).

Há uma longa rodovia por entre o pequeno Rio Osum e as montanhas. De um lado e de outro, o casario branco típico de Berat.

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O Rio Osum em Berat. Essa longa rua segue contornando a montanha e chega na parte moderna da cidade, relativamente pequena.
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O casario à margem do rio. Em Gjirokaster os telhados eram de pedra, já aqui eles são de telhinhas.
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Vista para um dos lados de Berat. (Sobe-se por escadinhas ou ladeiras entre uma casa e outra. Em geral não entram carros.)
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Mais de perto.

O meu albergue ficava numa dessas casinhas (Hostel Mangalem, este vale a pena recomendar). Mangalem é o nome desse lado que você vê na foto acima, esse “bairro”. Do lado de cá do rio, de onde tirei a foto, está Gorica [Góritsa], muito parecido.

Cheguei sozinho e fui atendido à porta por Seu Sebastião, um senhor baixinho, calvo e quieto-observador, de seus 70 e poucos anos. Pai de Berti, homem amistoso de seus 40 e poucos que administrava a pensão. É um negócio de família, como muitos aqui. Seu Sebastião às vezes usava um chapéu preto que, com seu casaco comprido, o fazia parecer um daqueles personagens antigos de fotos de imigrantes do começo do século XX.

O interior do albergue parecia um chalé, com paredes de pedra nua e vigas de madeira. Serviram-me um café turco, daqueles com o pó dentro, e enquanto eu estava no banheiro chegaram Hayley, uma australiana, e Wen, uma taiwanesa simpática, ambas de seus 20 e poucos anos.

Seu Sebastião, que não havia conversado comigo porque não falava inglês, já estava todo prosa em francês para cima da bonitinha Hayley quando cheguei ao dormitório e me apresentei às moçoilas. Ah, velho danado.   

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O interior da casa de estilo otomano. Nosso albergue, que mais parecia um chalé. As janelinhas, que você viu pelo lado de fora, por dentro são assim.

Seu Sebastião saiu para fumar um cigarro apesar da tosse, e Hayley e eu resolvemos subir até a Fortaleza de Berat (Berat castle), a cidadela no alto da colina.

A Fortaleza de Berat é a razão de ser desta cidade. Sua origem está nessa cidadela fortificada lá no alto, antes de as casas brancas de janelinhas otomanas serem construídas nos últimos séculos.

Há de lá do alto uma linda vista para as montanhas próximas a Berat. E, o que mais me animou: não é uma casca vazia, como costumam ser as ruínas históricas na Europa. Aqui, a cidadela continua habitada. Há nomes de rua e endereço, e ainda há as vovós vendendo bordados, e senhores — como Seu Sebastião, que disse ter nascido lá na cidadela —circulando e proseando pelas ruas.

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Uma rua de calçamento de pedra segue até a entrada da fortaleza. Mas nós cortamos caminho na colina, seguindo umas ovelhas, e entramos por uma porta lateral.
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Lá no alto, com vista para a parte mais nova de Berat e as montanhas.
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Pastores albaneses. (Esse povo perigoso, que os europeus em geral crêem serem todos criminosos.)
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Ruelas lá já no alto, parte da cidadela fortificada. Hayley comprando uns bordados.
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Ruelas. Tudo de pedra. Muitos ainda vivem aqui na cidadela de Berat.
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Estruturas do tempo dos bizantinos. (Sim, ali é uma galinha mesmo. Como eu disse, as pessoas ainda vivem aqui. Não é meramente uma atração turística.)
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Bordados feitos pelo povo daqui e vendidos informalmente. A qualidade é boa, são realmente feitos à mão, mas barganhe o preço.
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No arredor, as elevadas muralhas. No interior, as fortificações misturam-se às casas onde as pessoas moram. Essa cidadela existe desde o tempo dos bizantinos na Idade Média.
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Cidadela de Berat, com vista para as montanhas lá atrás.
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Cidadela de Berat.
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Posando nos muros da cidadela de Berat, lá no alto.
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A vista para as montanhas.
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Do outro lado, vista para o Rio Osum e uma igrejinha cristã ortodoxa de arquitetura bizantina.
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Reservatório de água para a cidadela, do mesmo estilo encontrado hoje em Istambul (na Cisterna da Basílica), dos tempos em que era chamada de Constantinopla.
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Pessoas seguem morando aqui desde os tempos da Idade Média.
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Vendinhas improvisadas pelos próprios morados de Berat para os turistas que vêm à cidadela. Há muita coisa feita à mão.

Descemos ao pôr-do-sol de volta à parte baixa de Berat para encontrar uma bela lua cheia subindo no céu. Vistas muito bonitas que eu nem fazia ideia de que encontraria aqui na Albânia.

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Fim de tarde em Berat com a vista para as montanhas albanesas e a lua cheia já no céu.
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Anoitecer.
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À noitinha, Hayley, a taiwanesa e eu viemos comer num restaurante típico. Jantamos uns deliciosos legumes preenchidos com arroz temperado, receita típica turca e daqui dos Bálcãs.

De manhã, no dia seguinte, conheci a mãe de Berti, esposa de Seu Sebastião, uma senhora com aquele espírito de mãezona e que, embora não acertasse a conversar conosco em outra língua que não fosse o albanês, tratou-nos com a maior afeição e aconchego. Parecia que éramos visitas na casa dela.

Eu precisava retornar à capital Tirana, mas ainda aproveitei a manhã para dar uma caminhada pelas ruelas do bairro de Gorica, no outro lado de Berat. Vi mais daquilo que tanto me encantou nesta cidade: as ruas antigas ainda cheias de vida, tão diferentes daquelas que você encontra em lugares já abandonados pela gente local e dominados pela indústria do turismo (como no caso de muito de vilarejos costeiros da Croácia, por exemplo). 

Deixo vocês com as fotos finais desta cidadezinha tão encantadora e cheia de um charme despretensioso.

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Ponte de pedra entre os dois lados de Berat.
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Atravessando o Rio Osum.
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Ruelas simpáticas no bairro de Gorica, autêntico e ainda cheio de moradores que estão aqui há muitas gerações.
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As ruas de Berat seguem com vida. Encontrei bem mais moradores que outros turistas.
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Pelas ruelas, em meio ao casario tradicional de Berat.
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Portinha e vista para o bairro de Mangalem do outro lado do rio.
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A outra ponte, esta moderna, onde distintos senhores faziam a travessia. Recantos da Europa que você, muito provavelmente, ainda não conhecia.
Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

One thought on “Berat, Albânia: A cidade das mil janelas

  1. Meu jovem, que espetáaaaculo, que maravilha, que deliciosas paisagens, que lindas as inúuuuuuumeras janelinhas, que gostosura de cidade, de cidadela, que bucólico ver os campos com seus românticos pastores, as ovelhinhas e até uma galinha, tudo isso emoldurado por belisssssimas montanhas de um colorido surrreal, parecendo de ouro de Ofir e secundadas pelas neves eternas de portentosas, brancas e belas montanhas. Um espetáaaaculo digno nos mais célebres pintores. Uma beleza. Deslumbrante.
    Lindas casinhas em gostosas e vivas ruelinhas com pedras portas talhadas em madeira e flores. Gente simples, pacata e simpática. Um verdadeiro paraíso, com direito a pontes e rios. Uma graça. As paisagens são primorosas e as janelinhas lindas. Magnifica região. Òtima postagem. Maravilha meu jovem. Acendeu o apetite para conhecer a Albânia e suas belezas. Amei.
    Quanto aos pré- conceitos pré-fabricados pelos meios de comunicação,sobretudo do Ocidente, preenhes de falta de conhecimento e de pedantismos, ja são sobejamente conhecidos. Lamentável.
    Mas o importante é que a verdade sempre aparece e aqui nessas postagens ela é palpável. Bela região. Merece ser visitada e reabilitada. Parabéns. grande abraço.

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