Muitos brasileiros sabem do Harlem, famoso bairro barra-pesada de Nova York, mas poucos já ouviram falar da linda cidadezinha holandesa que lhe deu nome: Haarlem, assim com um “a” a mais, em holandês.
Em 1624, ainda no princípio da colonização europeia da América do Norte, os holandeses assentaram-se lá num pedaço de terra e fundaram o que mais tarde se tornaria Nova York. De início, chamava-se Nova Amsterdã (Nieuw Amsterdam).

Foi aquele o mesmo ano em que atacaram Salvador, a então capital do Brasil, na dita “Era Dourada” da história holandesa, de suas expansões marítimas. O Rio Hudson, que desemboca em Nova York, era à época chamado de Rio Maurício, em homenagem a um Maurício de Nassau (príncipe e regente holandês entre 1618-1625) da mesma linhagem do outro Maurício de Nassau que viria a governar um pedaço do Nordeste do Brasil entre 1637-1644. Os holandeses estavam por toda parte.
Qual foi a minha surpresa ao saber que iria morar na Haarlem original — uma cidade que eu nem sabia que existia.
Eu me preparava para mudar-me do Canadá à Europa, e acostumar-me a um jeito de vida muito diverso. A filiação afetiva e institucional dos norte-americanos (e de tantos brasileiros) por automóvel e rodovias seria agora substituída por um entorno feito para trens, bondes elétricos, densidades urbanas maiores, e um povo com hábitos muito distintos. Morar na Europa viria a ser das experiências mais significativas da minha vida.

Quando eu cheguei era um setembro, miraculosamente ainda ensolarado e relativamente caloroso para quem conhece o notório clima cinzento e chuvoso holandês. Brumas de manhã, pores-do-sol à tarde, e todas as descobertas de um lugar novo.

Haarlem fica a meros 15 minutos de trem desde Amsterdã, e é uma visita recomendadíssima pra quem busca ver o charme das cidades holandesas sem necessariamente o aspecto de “vida noturna” que tem a capital. Faz um ótimo e fácil bate-e-volta a partir da capital. (Trens na Holanda não requerem compra antecipada, nem têm reserva de lugares. Basta chegar à estação, comprar a passagem, e embarcar no próximo trem. O mesmo para a volta. Pode ficar tranquilo que os trens aqui nunca esgotam.)












Aqui eu morei por 4 meses, indo à universidade em Amsterdã de segunda a sexta, aproveitando a animação interiorana aos sábados, e amaldiçoando a tranquilidade excessiva do lugar aos domingos, quando (até recentemente) sequer os supermercados abriam.
Certa vez, tive que voltar de uma festa em Amsterdã no último ônibus (mais baratos que os trens), e acabei dormindo no caminho: fui parar na garagem. O motorista não me viu e não me chamou. Tomou um susto quando eu acordei e o abordei no ônibus escuro já na chegada. Eu acabei tendo que fazer o que nunca antes havia feito na vida (e que jamais voltei a fazer desde então): pegar carona no meio da noite em um carro aleatório que me abordou na rua. Por sorte, eram outros motoristas saindo do trabalho. Coisas da segurança da Europa.
Não teve jeito: eu me mudaria para Amsterdã. Mas não deixei de incluir um passeio a Haarlem sempre que amigos vinham visitar a Holanda. Alguns chegavam a dizer que, pela tranquilidade e ausência de hordas de turistas, até preferiam-na à capital holandesa, mas aí eu deixo a seu critério descobrir.


A quem ficou curioso, os holandeses em 1667 trocaram a então “Nova Amsterdã” — com seu vilarejo adjacente de “Haarlem”, que viraria o bairro — pelo Suriname, país caribenho no norte da América do Sul, nosso vizinho. Como resultado da Segunda Guerra Anglo-Holandesa (1665-1667), na qual os ingleses invadiram e tomaram as posses holandesas na América do Norte e os holandeses por sua vez tomaram as valiosas ilhas e terras caribenhas produtoras de especiarias (açúcar) dos ingleses, o Tratado de Breda (1667) consolidou as coisas como elas estavam. Nova Amsterdã ficou com os ingleses e foi rebatizada de “Nova York”; já o Suriname permaneceria como colônia holandesa até adquirir sua independência em 1975.
Os holandeses seguiam no que mais lhes interessava à época: o enriquecedor comércio mundial de especiarias. Desenvolveriam, nessa sua “Era Dourada”, uma das mais esplendorosas cidades à época: Amsterdã, a “Veneza do Norte”.

Mairon, o Maurício de Nassau pelo qual o rio Hudson era chamado anteriormente não seria por conta do Príncipe João Maurício de Nassau, filho do Guilherme de Nassau, ao invés do nosso governador neerlandês?
A propósito, continue a postar sobre a Holanda!
Muito boa observação, Nuno! Revi a questão e, de fato, era um outro “Maurício de Nassau”, filho de Guilherme “o taciturno”, que regia a Holanda à época. O nosso governador neerlandês no Brasil (este, sim, “João Maurício de Nassau-Siegen”) é mais jovem e só aparece depois. Obrigado por me chamar a atenção, fiz a retificação no texto.
E obrigado pelo encorajamento! Vem bem mais aí sobre a Holanda.
Essa Holanda maravilhosa, linda, com sua arquitetura sui generis, com cidades que mais parecem saídas de algum livro de contos, seus belos canais, suas flores e jardins sobretudo interiores, seus charmosos e históricos moinhos, suas belas praças, pontes enfeitadas de flores, assim é a Holanda, assim é Haarlem!…
Ruelinhas lindas cheia de canteiros floridos, lugares gostosos de visitar, estar, papear e descansar!… bem arborizada e com um belo rio. Seu casario chama a atenção pela beleza e pelos tons, Linda cidade, lindo país, Um encanto, Impressionante o porte da sua catedral. `Parabéns, jovem viajante. Belo recanto,
Olá, Mairon! Em quanto tempo dá pra conhecer Haarlem? Mês que vem vou ter 4 dias inteiros em Amsterdã. Vale a pena passar um dia em Haarlem?
Oi, Heitor!
Haarlem é coisa pra umas quatro horas de passeio. Se for um sábado, vale bastante a pena pois o mercado (9-15h) no centro é adorável, e tudo fica bem alegre. Já se for domingo, não vale a pena pois quase tudo está fechado. Meio de semana eu diria que compensa, de preferência uma tarde. Haarlem tem muitos lugares onde tomar café, uns drinks ou lanchar, mas poucas opções de almoço “sério” (que não seja sanduíche ou merendas de rua), então a minha recomendação seria ir passar uma tarde lá, ainda mais neste tempo de primavera/verão.
Conheci Amsterdã e fiquei encantada, já quero marcar a próxima viagem.
Olá, Mairon!
Saudações de Portugal!
Espero que esteja tudo bem consigo, mesmo com o Covid!
Eu tb conheço bem a Holanda, vivi em Leyden durante 4 anos e agora vou a Amsterdam muitas vezes para pesquisar para o meu Doutoramento. Mas concordo consigo: adoro a Holanda e as tulipas são a minha flor preferida. Delft é um miminho e adoro empanturrar de Poffertjes! A propósito, a data em latim nas portas de Haarlem é 1649. Parabéns e continue a postar!
Olá, Elizabete!
Obrigado! Que alegria ter a visita de alguém que também experimentou a Holanda como moradora, com seus pequeninos segredos às vezes pouco conhecidos fora do país (como as poffertjes!) e suas lindas flores.
Bem observada, a leitura do ano ;-).
Saudações aí a você em Portugal também, e seja sempre bem-vinda!