Visitar o Vaticano é algo que passa pela cabeça da maior parte dos cristãos. Independente de qual for a sua fé (se alguma), o coração de Roma é um lugar de relevância histórica inquestionável, e um dos destinos mais visitados do mundo.
Aqui estão nada menos que algumas das maiores obras do Renascimento italiano, como a Basílica de São Pedro, a Pietà, a Capela Sistina com seu teto pintado por Michelangelo, dentre outros tesouros religiosos e artísticos que têm do melhor da cultura e História italianas. Estamos na gema da Itália, só que fora dela. Como se seu coração fosse soberano do restante.
O Vaticano oficialmente é o menor país soberano do planeta. São em torno de mil pessoas vivendo numa área de 0,44Km², menor que qualquer bairro da sua cidade. Tecnicamente, a entidade soberana não é nem a Cidade do Vaticano, mas a Santa Sé, a diocese de Roma — a qual controla também as outras propriedades da Igreja Católica na cidade, incluso mas não limitado ao Vaticano.
Visitar essa milenar instituição e seus tesouros requer certo esforço e paciência, mas é recompensador.

Eu chegava a Roma direto da Grécia, de um pólo da antiguidade clássica a outro. A primavera deixava a capital italiana fresquinha e ensolarada, ainda sem aquelas imensas hordas de turistas que tomam conta do país no verão. Ainda assim, a Itália tem turistas o ano inteiro.
Instalei-me num aconchegante apartamento perto do Vaticano. Ele pertencia a uma simpática jovem italiana, Anna, gordinha e sorridente, dessas prendadas com as arrumações de casa, e casada com um membro da guarda do Vaticano. Não aquela guarda suíça empedernida, de cerimonial, mas a polícia verdadeira. Não cheguei a conhecê-lo, exceto pelos muitos porta-retratos dos dois pela mobília da casa.
Daqui eu estava bem posicionado. Andar é a melhor forma de se deslocar em Roma. Numa cidade de trânsito pesado e transporte público limitado — para o alto padrão europeu, onde as cidades em geral têm bondes elétricos, ciclovias, e calçadões pedestrianizados além do habitual dueto ônibus & metrô, comum mundo afora —, eu quis ficar numa distância que desse pra ir a pé às principais atrações da cidade.
Eu começaria pelo Vaticano, com a espetacular Basílica de São Pedro, o não menos espetacular Museu do Vaticano, e — aproveitando que o dia seguinte à minha chegada era uma quarta-feira, dia da audiência papal — ver pessoalmente o senhor Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco. Afinal, não dava pra vir a Roma e não ver o papa.

Sempre que está na cidade, o papa realiza uma “audiência pública” às 10h da manhã das quartas-feiras, na Praça de São Pedro. Não é bem uma missa, mas um passeio por entre os presentes para abençoar itens, bebês, e fazer uma homilia, um discurso sobre algum tema de relevância social. Ele o faz em italiano, mas há tradução em vários idiomas.
Não é necessário entrada ou ingresso de nenhum tipo. Basta chegar cedo e aproximar-se da grade, e o papa estará por ali a poucos metros de você passando naquele carrinho. Se você quiser sentar, aí sim é preciso obter um ingresso antecipadamente, que você obtém gratuitamente fazendo uma solicitação via fax e vindo coletar no dia anterior ou no princípio da manhã.
Na prática, faz muito pouca diferença, exceto pela cadeira e pelo trabalho extra que dá.
O site oficial do Vaticano é este. Muito importante olhar primeiro a agenda do papa para saber se ele estará presente. E se você quiser mesmo solicitar entradas para ficar sentado no centro da praça, aqui estão as instruções oficiais e contato em português.




Perto de mim na multidão, uma senhora brasileira conversava com a filha pouco antes de o papa aparecer. “O padre já veio duas vezes e me disse que o papa passa bem aqui“. De fato, passou.
Geralmente eu puxo conversa quando encontro compatriotas no exterior, mas às vezes me dá preguiça, aí eu brinco de brasileiro escondido e fico só escutando. A filha, uma morena bonita com ar de viajante independente, ainda teve tempo de comentar sobre como prefere ficar em hotel do que albergue, por já ter o seu “esquema de banheiro” (expressão que adotei desde então), e consolou a mãe quando esta chorou de emoção ao ver o papa passar.
Eu dali tentaria visitar o Museu do Vaticano e o interior da Basílica de São Pedro, duas missões hercúleas pelas filas quilométricas que se formam — o que não é ajudado pelo número grande de italianos malandros e outros turistas que as furam na cara dura. Não há divisor de fluxos, e a imensa fila é constantemente reposicionada pelos guardas, então é um prato cheio pra quem quer se aproveitar.
A coisa é tão perniciosa e crônica que eu tive que lidar com uma guia italiana destemperada que achou que eu tinha furado a fila e entrado na surdina “atrás dessa senhora” — que acontecia de ser a minha mãe.
Depois de 1h30min numa fila e 1h45min na outra, entramos. Já aviso que tentar visitar os dois lugares num mesmo dia é uma tarefa dura. É factível, mas toma o dia quase todo. A Basílica de São Pedro me pareceu mais fácil de ser visitada à tarde, pois todo mundo parecia ter a mesma ideia de “chegar cedo para entrar na Basílica antes dos grupos turistas chegarem”, só que todos os turistas têm a mesma ideia e às 9 da manhã há uma multidão de pessoas já à espera (talvez seja o pior horário).


Antes de sair das filas e passar às artes do museu, meus ouvidos ainda foram brindados com a sábia observação de um grupo de jovens norte-americanos atrás de mim, comentando entre si sobre os custos e conversões de dólar pra euro, e notando — cheios daquela confiança que lhes é característica — que um destino barato mesmo é certamente a Noruega, onde 1 dólar vale 8 da moeda de lá. A gente tenta superar o estereótipo do norte-americano jeca, aí se depara com essas.
(O problema não é não saber, mas posar de que muito sabe e dizer bobagem. Os rapazes terão um choque quando forem a Oslo e se derem conta de que uma cerveja lá custa o equivalente a 10 dólares. A Noruega provavelmente é o país mais caro do mundo.)
Mas passemos das pérolas às artes. O Museu do Vaticano — ou, para ser mais exato, os museus do Vaticano, pois são vários em um — formam um dos maiores e mais ricos tesouros artísticos do mundo. São 70.000 obras, 20.000 delas em exposição. Aí temos a inigualável Capela Sistina, pintada por Michelangelo, e mais um tanto de pinturas e esculturas. Nunca dá pra ver tudo, mas é fundamental vir com tempo (no mínimo, o equivalente ao que você gastou na fila para entrar).
















Os museus do Vaticano são o que há de mais rico a se ver nesta micro-cidade, e o que toma mais tempo, mas ainda resta a Basílica de São Pedro a quem tiver gás (daí eu ter dito que ver ambos num mesmo dia requer esforço).
Mais uma maçada de espera em fila, mas no interior lhe aguardam outras obras do mais alto calibre, como o túmulo de São Pedro e a Pietà de Michelangelo.


Eu diria que em 30-60 minutos você vê todo o interior (o que certamente será menos do que você gastou na fila para entrar, mas c’est la vie).
Embora tenha havido aqui um templo cristão, sede do Bispo de Roma (também conhecido como Papa) desde ao menos o século IV, quando o imperador romano Constantino legalizou o Cristianismo e o tornou religião oficial do império, a basílica que você visita hoje é um produto do Renascimento italiano. Esse movimento artístico e intelectual, que retomou obras, valores e pensamentos da antiguidade clássica, produziu alguns dos mais famosos gênios da humanidade, como Leonardo Da Vinci e Michelangelo Buonarroti.
(Caso você esteja a se perguntar sobre a Mona Lisa, obra mais famosa de Da Vinci, ela está no Museu do Louvre em Paris. E sobre a Última Ceia, a original se encontra no refeitório do convento de Santa Maria delle Grazie em Milão, no norte do país.)
A temática de muitas daquelas obras renascentistas foi religiosa, e muitas ficaram com a própria Igreja, várias delas aqui no Vaticano. A Pietà, uma das mais famosas esculturas de Michelangelo, está no interior da Basílica de São Pedro e mostra Maria com Jesus morto nos braços.

Agora pasme e prepare o babador para saber que Michelangelo tinha apenas 24 anos quando terminou essa escultura. *Silêncio*






E, apesar de todo esse esplendor, eu talvez vos choque ao informar que a Basílica de São Pedro não é a sede oficial do bispo de Roma (ou seja, do papa), e portanto não é uma catedral. Ele mora aqui, mas sua sede histórica oficial é a Catedral de San Giovanni Laterano, noutra parte da cidade.
No post seguinte eu retorno com a visita a outros pontos-chave de Roma, a cidade eterna.
Maravilhosa, épica, essa visita à cidade eterna. Linda Roma, Lindo o Vaticano, Maravilhoso esse Papa Francisco, humano e divino; que à semelhança do Pobrezinho de Assis tenta dar um rumo mais cristão à Santa Sé. Difícil tarefa ja que a Igreja de Roma é tradicionalmente Conservadora e pouco dada à mudanças nas suas ações, posturas e convicções. Boa sorte Papa Francisco. Torcemos pelo senhor e pelo Cristianismo. Que ele se volte para os pobres e excluídos.
Belíssimo esse Museu do Vaticano. Obras ímpares e de uma riqueza de detalhes e significação impressionante.
A Basílica é um espetáculo à parte. Belíssima. Valem a pena a fila e a espera. Magnifica, histórica, extraordinária na sua arquitetura , beleza, significação, riqueza de detalhes e decoração. La Piètá é maravilhosa. Parece viva. Linda postagem. Belo destino de viagem. Imperdível. Valeu, viajante. Maravilha.
Oi Mairon. Feliz 2020. Eu fico na posição de querer que você viaje muito para escrever mais a respeito. Parabéns. Você devia pensar num livro.
Conheci Roma no inverno de 2007. Foi uma viagem mágica. Peguei filas, mas poucas. E alguns dias foram ensolarados. Ah, as massas…
Oi Daniel,
Obrigado, e perdoe a minha demora em responder — eu lhe confesso que fiquei um tempo matutando o que diria a respeito do livro. Pois fique certo de que ele virá 🙂
Que o ano esteja se desenrolando bem pra você, e que venham bons meses aí pela frente. Quem sabe até um reencontro com as massas na Itália no horizonte, após o pânico de saúde passar.
Obrigado pelos desejos de apoio às continuadas viagens! Virá mesmo ainda bastante por aí.