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Polônia

Conhecendo Varsóvia, a capital da Polônia

Varsóvia, embora conhecida de nome por quase todos, pouco figura nos roteiros turísticos dos brasileiros — ou, verdade seja dita, da maioria dos turistas que vêm à Europa. A capital polonesa foi bombardeada e 80% destruída durante a Segunda Guerra Mundial. Quase tudo é novo, do período comunista da Guerra Fria, e talvez por isso falte a Varsóvia a atratividade de outras capitais europeias. Mas isso também joga a seu favor: eu cheguei esperando a mais feia das cidades, e me surpreendi quando vi que não é bem assim.

Três horas de trem expresso separam Cracóvia, a irmã mais charmosa, de Varsóvia, a capital. Se pegar o trem pinga-pinga, como eu certa vez fiz por engano, leva o dobro do tempo, então recomendo se certificar bem. A minha primeira vez foi no verão, num trem lotado de turistas jovens, em que passei três horas e meia de pé. (A Polônia tem dessas. Em matéria de infraestrutura, se parece mais com o Brasil que com a rica Europa Ocidental.)

Desembarcando, logo avistei o prédio mais notável e simbólico da cidade: o Palácio de Cultura e Ciência, erigido em 1955 em estilo arquitetônico do Realismo Socialista. (Ele é às vezes chamado simplesmente de “centro de cultura”, ou pelo seu apelido “Pekin”, do seu nome em polonês: Palac Kultury i Nauki.)

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O centro cultural em Varsóvia, Polônia. O prédio é um dos grandes ícones da cidade.

Ali se faziam concertos, exposições de arte, e outras atividades culturais e científicas acessíveis a toda a população. Hoje, embora o ideário comunista já não esteja em voga na Polônia, o prédio continua abrigando museus, cinemas, e até uma faculdade. O prédio é obra do arquiteto soviético Lev Rudnev, que planejou também as sete “catedrais de Stálin”, prédios com esse mesmo estilo em Moscou. A de Varsóvia era às vezes chamada de “a oitava irmã”.

Caso você não note a semelhança, essa arquitetura soviética dos anos 1950 inspirou-se muito na arquitetura norte-americana dos altos prédios de Manhattan dos anos 1930, como o Empire State Building. Apesar da divergência política, ambos os lados da Guerra Fria partilhavam do modernismo. 

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Avenida em Varsóvia.

A quem está habituado (como eu) a cidades europeias de ruelas pitorescas em calçamento tradicional de centros históricos, o cruzamento quase paulistano entre as Avenidas Jerozolimskie e Marszalkowska no centro de Varsóvia quase assusta. São mais de 3 milhões de habitantes nesta região metropolitana, então não espere uma cidade pequena.

Karolina, a amiga que me hospedaria aqui (diferente da Karolina de Cracóvia), morava bem no centro. Contou-me que seu avô era um grande dono de terras antes da Segunda Guerra Mundial, mas que se sensibilizou pela ideia de distribuição de renda e repartiu suas propriedades de livre e espontânea vontade. Acabou compensado pelo Partido Comunista com um belo apartamento muito bem localizado no centro de Varsóvia, herdado então pela minha amiga, e que viria a me hospedar.

“Há quem diga que Moscou podia ser o cérebro do bloco soviético, mas que era Varsóvia o seu coração.”

Uma coisa notável em Varsóvia é que, ao contrário de Paris, Roma ou Londres, onde a Segunda Guerra Mundial parece estar num passado distante, aqui ela e a Guerra Fria continuam muito, muito recentes. Os danos e efeitos desses eventos e períodos continuam muito presentes, tanto na infraestrutura quanto na vida das pessoas. É, nesse sentido, uma visita histórica muito diferente daquela a outras capitais europeias — mesmo se compararmos Varsóvia a outras capitais do “leste europeu” como Praga ou Budapeste.

Se gosta de História da Segunda Guerra, não deixe de visitar o Museu da Insurreição de Varsóvia de 1944 (Warsaw Uprising Museum). É um museu amplo, repleto de coisas, e que conta dos meses quando os poloneses levantaram-se contra a ocupação alemã para tentar liberar Varsóvia dos nazistas. Eles acabaram massacrados, sem ajuda suficiente dos soviéticos ou dos americanos, mas o movimento ainda é muito celebrado pelos mais nacionalistas aqui na Polônia. E, não à toa, os poloneses continuam muito ressentidos tanto dos russos quanto das potências ocidentais.

Já se você quer mais uma coisa do dia-dia, não deixe de ir às onipresentes cantinas do tempo comunista, que continuam tradicionalíssimas aqui na Polônia — e uma ótima opção caso você queira algo autêntico, com comida polonesa típica, e barato. Eles aqui a chamam de milk bars (bar mleczny em polonês), ou “bares de leite”, embora não se sirva leite. O nome é porque quando surgiram, ainda no fim do século XIX, esses estabelecimentos serviam laticínios, mas com o tempo se tornaram restaurantes populares. No tempo comunista, com a alergia a coisas finas, ricas e “capitalistas”, esses locais se popularizaram ainda mais.

O detalhe é que tudo é em polonês, e as pessoas quase não falam inglês. Karolina me ajudou a pedir, mas vá mesmo sem intérprete, pois é parte da sua experiência de viagem.

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Típico menu de cantina “milk bar” na Polônia. Tudo muito barato; pelo equivalente a R$5 você pode fazer uma refeição; mas também tudo está em polonês.
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Você pega fila e a comida pelo buraco na parede, das tias lá atrás. Como nos velhos tempos. (Sim, hoje em dia há Coca-Cola.)
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As comidas são sempre pratos típicos poloneses. Aí temos salada de beterraba (eles adoram beterraba), e uma espécie de nhoque de batata com molho de cogumelos (eles aqui também amam cogumelos).
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Como eu quis experimentar de tudo, peguei também uma sopa de beterraba com creme (tipo a borsh russa) e uns conhecidos pieroguis, aqueles bolinhos com recheio de batata, repolho, ou carne. (Eles aqui na Europa Central e do Leste às vezes curtem uma banha animal, então me vieram pedaços de gordura de porco em cima.)

Vocês já percebem como Varsóvia dá uma experiência diferente daquela tida pela Europa Ocidental.

Porém, e apesar da destruição da cidade na Segunda Guerra Mundial, há, sim, um simpático centro histórico reconstruído em Varsóvia, na linha do que existe Europa afora. Ele foi restaurado à imagem que se tinha dele de antes da guerra, com a ajuda de pinturas, fotos antigas, e dos idosos que sobreviveram e lembravam para contar.

Se você não souber que ele é reconstruído, dificilmente perceberá — a menos que tenha um olho muito clínico pra isso. Antes de vir aqui, escutei pessoas o dispensarem somente por ser renovado. E talvez por vir com expectativas bem baixas eu me impressionei bastante com ele. Achei-o lindo e agradável.

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A Praça do Mercado no centro histórico de Varsóvia, com seu casario reconstruído. As casinhas se parecem com aqueles brinquedos de madeira de antigamente. (Agora você sabe de onde eles foram inspirados.)
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Igreja restaurada nas ruelas do centro histórico de Varsóvia.
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Ruas do centro histórico. (Eu, como brasileiro habituado à nossa diversidade étnica, sempre acho curioso como os europeus são parecidos entre si, sobretudo os do norte e os do leste, mais etnicamente homogêneos. Essa mulher em destaque na foto parece até que é sobrinha do finado Papa João Paulo II.)

E aqui você se familiariza também com alguns personagens históricos que eram poloneses.

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A casa onde nasceu Marie Sklodowska Curie em 1867. Ela, que adotou o sobrenome do marido francês (Curie), foi a primeira mulher a ganhar um Prêmio Nobel, e é ainda a única pessoa a ter ganho Prêmios Nobel em duas ciências distintas — um de química e um de física. Hoje a União Europeia tem um prestigiado programa de bolsas científicas que carrega o seu nome.
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Eu na minha primeira vez em Varsóvia, no verão, com uma estátua do senhor Nicolau Copérnico (1473-1543), o polonês do Renascimento que formulou o modelo heliocêntrico. Sua demonstração de como era a Terra que girava em torno do Sol (e não o contrário) chocou a sociedade do seu tempo.
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Eu no frio de novembro no centro histórico de Varsóvia.
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Igreja neoclássica, reconstruída, e com a imagem do Papa João Paulo II, que era polonês e que continua muitíssimo bem quisto aqui na Polônia.
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As longas avenidas de Varsóvia no outonal novembro.

Está feito o convite para virem conhecer.

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O prédio do centro de cultura sob o céu do entardecer em Varsóvia.
Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

One thought on “Conhecendo Varsóvia, a capital da Polônia

  1. Muito charmosa Warsawa, com suas largas e belas avenidas, sua arborização e seu lindo Centro Histórico, Só um especialista para descobrir que foi reconstruído, Muito bom trabalho. Ficou lindo e original. Gostei da cidade e das comilanças. Um pouco mais arejado o astral que da Krakow, em que pese a deselegância das construções soviéticas. Gostei desse modernismo a la Chicago e cia. Valeu, viajante.

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