Timisoara bem possivelmente é a mais elegante de todas as cidades romenas. Aqui já não estamos mais na Transilvânia, mas no extremo oeste do país, quase fronteira com a Sérvia e a Hungria (ver mapa abaixo). Continua aquele pano de fundo histórico e arcabouço cultural da Europa Central, que detalhei anteriormente nas cidades transilvânicas (Brasov, Sighisoara, Cluj-Napoca, Sibiu), mas o ambiente de montanhas agora dá lugar às planícies e fazendas que caracterizam esta região de Banat.

Eu chegava aqui de Sibiu num trem da madrugada que veio praticamente vazio. Era 1° de janeiro, e poucos pareceram dispostos a se juntar a mim na viagem para esticar ainda mais aquela noite da virada. Folia na praça de Sibiu, uma hora e meia de sono no albergue ao lado do bar, e às 3h da manhã eu estava na estação prestes a rumar ao extremo oeste da Romênia. Fazia -3 graus de temperatura lá fora, um ar frio de uma noite escura sem neve.

Quando fiz a reserva, cheguei a temer que o trem pudesse ir lotado de bêbados em pós-festa, mas viajei quase só. Vi o condutor de vultuoso bigode passar pra lá e pra cá na ausência de passageiros.
Eu imaginava qual havia sido o destino de Andrea — uma caloura romena de seus 19 anos que volta e meia me dava umas olhadas perniciosas e, às 19h na noite da virada, já virava ávida uma garrafa de uísque na mesa da cozinha do albergue. Dois amigos, segundo ela ainda na escola, fumavam no lado de fora. Eles se revezavam entre a fumaça e o álcool, e pelo ritmo em que iam eu acho que já não se lembrariam de nada após as 22h. Ah, essa juventude.



Timisoara desmancharia rapidamente a impressão que eu tivera em Sibiu de que aquela havia sido a cidade mais bela que eu ainda não conhecia. Talvez Timisoara a supere — deixo para cada um avaliar.
Ao chegar, ouvi os sinos das igrejas badalarem — elas pareciam ser os únicos lugares em movimento naquele 1° de janeiro —, vi o resto de feirinha de Natal ainda fechado na Praça da Vitória (Piata Victoriei), e senti o início de um dia que certamente seria pacato. A fuzarca da noite anterior aqui parecia ter sido grande. Funcionários limpavam as calçadas. Revoadas de pombos circulavam em bando pelo centro histórico da cidade. Poucos moradores começavam a emergir de suas casas.



Vocês notarão por Timisoara um misto de influências arquitetônicas. Esse prédio cinzento escuro aí acima, por exemplo, já tem toques modernistas do começo do século XX.


Cheguei ao Hotel Central, onde à frente havia um ônibus da famosa companhia de turismo Fudeks. Entrei, tomei posse dos meus aposentos em nome de Portugal e Algarves, e depois fui conhecer as ruas da cidade.
Praticamente tudo de interesse turístico em Timisoara se faz a pé, ainda que ela seja a terceira maior cidade da Romênia (320 mil hab.). Seu centro histórico é compacto, mas permite umas boas pernadas para um dia ou dois, sobretudo se você for visitar museus. Neste caso, quase tudo estava fechado, então eu estava à mercê das igrejas — lindíssimas. Pelo lado de fora, via-se preservada por todo o casario as heranças húngara e austríaca da cidade.
Como ocorreu com a Transilvânia, estas também eram terras húngaras pela maior parte da História — desde os idos do ano 900 até eles serem conquistados pelos turcos em 1526, como cheguei a detalhar no post anterior. Esta cidade que os húngaros chamavam de Temesvár (“Fortaleza [do Rio] Temes”), contudo, só capitularia diante dos turcos em 1551. Os turcos governaram todo esse sudeste europeu por mais de um século; aqui neste caso, até serem expulsos pelos austríacos em 1716.
Como a cidade foi queimada na guerra entre austríacos e turcos, tudo o que você vê hoje no que os romenos renomearam como Timisoara data do século XVIII pra cá.









O sol abriria no dia seguinte. A cidade ficava ainda mais bonita. As referências dos nomes de hoje (União, Vitória, Liberdade) naturalmente remetem ao sentimento romeno atual pós-comunista e também diante dessas regiões semi-estrangeiras em seu país. Mas o que os seus olhos verão no centro histórico é quase tudo anterior a 1918. O Império Austro-Húngaro pode ter sido derrotado nos campos de batalha, e assim na política, mas culturalmente ele continua presente.



Como em outras cidades da Romênia, há aquela diferenciação entre a catedral ortodoxa e a católica, já que há gentes de diferentes religiões. De quebra, ainda há a igreja ortodoxa sérvia, distinta da romena. A Sérvia está a 30Km daqui, e ela também era parte da dupla coroa austro-húngara, onde as populações de diferentes etnias viviam misturadas pelo império.







Eu falo muito da bagagem cultural da cidade, mas o que Timisoara tem mesmo de fama entre os romenos é por ter deflagrado o início da revolução de 1989, que derrubou o regime comunista de Nicolae Ceausescu.
Era dezembro de 89, o Muro de Berlim já havia caído há um mês, e a derrocada dos regimes autoritários no leste europeu espalhava-se como fogo em palha. Aqui, o estopim foi uma tentativa do governo de expulsar um pastor da igreja da minoria húngara de Timisoara. Os romenos então aproveitaram a oportunidade para reclamar o fim daquele regime repressivo. Assim foi, como aconteceu nos demais países vizinhos, mas a Romênia foi a única a executar os antigos governantes. Nicolae Ceausescu seria morto ao lado de sua mulher no Natal daquele ano.

E a História segue sendo escrita. Eu encerrava aqui esta minha terceira visita à Romênia. (Mais tarde, sentado atrás dos guichês de imigração no aeroporto, acho que nunca havia visto oficiais tão sexy. Quase caio na besteira de fotografar uma, mas resisti à tentação — teria me causado possíveis problemas se alguém visse.)
Deixo vocês com algumas outras fotos de Timisoara, inclusive à noite, quando as luzes se reacenderam e a feirinha de Natal estava a pleno vapor.








Óoooooooohhhhh que belezura de cidade é esta, meu jovem amigo!… hahaha terei que rever também a minha afirmação de que a anterior seria a mais bonita hahah. São tantas as diversas belezas que ficamos assim indecisos, mas pelo que pude ver aqui na postagem essa é a mais charmosa e parece ser das mais desenvolvidas. Que região magnifica!… Que belas cidades. Um primor. Vale muito ser conhecida.
Amei a cidade como um todo: desde o casario, os monumentos, as igrejas varias, as largas avenidas, as belas praças, os pombinhos, passando pela arquitetura arrojada e bela e seus charmosos calçadões.
A decoração de Natal/Ano Novo é linda. Difícil saber qual a mais bonita dessa bela Romênia. Lindas barraquinhas bem dispostas e bem arrumadas, cada uma mais bonitinha que a outra, na charmosa praça e diante de antigas, históricas e charmosas construções. Linda cidade. Suas luzes, decorações e cores são um espetáculo à parte. Magnifica região, belíssima cidade, bela postagem. Parabéns pela escolha dos lugares.
PS: adorei o nome da famosa empresa de turismo hahahahaha
Nasci na Romenia de onde sai aos 10 anos. Voltei algumas vezes, já adulto. Conheço bem Sibiu, Predeal, Sinaia, mais proximas. Alem de Bucarest, claro, cuja região central nada mudou praticamente no ultimo seculo. Namorei a ideia de visitar Timisoara, meio distante de Bucarest onde devo estar no proximo mes. Quem sabe…..as viagens de trem são tranquilas.
ola! vc passou um dia só? estou marcando de ir pra la queria saber se em um dia vc passeia bem ou necessita de ao menos 2. obrigada
Oi Melissa! Com um dia bem passado você vê todo o principal da cidade — que são as ruas históricas, praças e igrejas no centro. Eu passei mais de um dia, mas peguei bem de leve. Se você bater perna com mais intensidade, consegue ver tudo num só.