Continuação de Paisagens andinas, lhamas e hotel de sal: Segundo dia do tour ao Salar de Uyuni
O Salar de Uyuni é daqueles lugares que, quando eu vi por foto pela primeira vez anos atrás, disse: “Preciso conhecer“, enquanto mirava vidrado e meio estupefato aquela imensidão branca “vazia”, de puro sal e céu.
Chegada a hora de finalmente vê-lo de perto.
Já era a terceira manhã do nosso tour saído de San Pedro de Atacama, no Chile. Havíamos passado pelas impressionantes lagoas coloridas no Altiplano boliviano e em seguida por outras paragens da região, como o cemitério de trens. Acordávamos hoje cedo, no hotel de sal, para sair antes do sol de mala e cuia rumo ao deserto de sal.
O Salar de Uyuni, na Bolívia, tem uma extensão de mais de 10 mil Km², a 3.656m acima do nível do mar. Você leva horas percorrendo-o de carro, guiado apenas por GPS. Não há estradas, trilhas, nem nada que indique caminho — só a imensidão.
Seu jeito dependerá um pouco da estação e da presença ou ausência recente de chuvas. Quando chove, o céu fica mais obscuro, nublado, enquanto poças d’água acumulam-se como espelhos refletindo o céu no chão. Já quando faz sol, temos um firmamento azul e uma imensidade de “cimento” branco a refletir a luz. Ambos são surreais à sua maneira, e eu tive a sorte de ver os dois neste dia.



O reflexo, naturalmente, quem dá é a água. Uma fina camada de água gélida na altura dos tornozelos. Venha preparado com algum calçado impermeável ou alguma havaianas ou calçado aberto que lhe permita molhar os pés (ou dê a louca e fique descalços).
O chão é de grânulos e pedrinhas de sal, e — é claro — o teor salino da água é bastante alto, então acumula-se uma camada branca de sal nos seus pés quando a água depois seca. Nada demais, mas a água é bem fria. Acredito que estavam uns 12 graus do lado de fora, que subiriam ao longo do dia.
Com um casal de brasileiros que encontrei, fizemos o mundo virar de ponta-cabeça na caminhada abaixo. Escutem o vento no descampado, e notem a câmera fazer o mundo girar.
Ao final do vídeo, é até fácil esquecer que estamos todos de cabeça pra baixo, tão apurado é o reflexo.
Seguiríamos viagem — você leva uma manhã inteira de carro para cruzar o salar —, até que deixamos as poças infinitas de água para trás. A paisagem agora se transformava-se no que normalmente vemos em documentários sobre a Antártida ou o Ártico, aquele deserto branco que mais parece gelo.






Claro que, como muitos já sabem, após maravilhar-se com a imensidão a coisa mais divertida de se fazer aqui é brincar com a perspectiva. O próprio motorista já veio equipado com uma caixa de brinquedos pra isso, embora alguns turistas também tenham trazido os seus.

Neste vídeo de 10s eu pulo nas garrafas tipo Chapolin Colorado em miniatura.
O sol já subia quase alto quando o céu limpou e nós nos acomodamos no carro. Depois de um tempo pirulitando pelo deserto de sal, você se aquieta. Ainda faltam horas de direção em linha reta até sairmos daqui.
“O que acontece se o pneu estourar?” é uma das perguntas mais típicas. É por isso — por segurança — que o trajeto é sempre feito de manhã, em rotas já mais ou menos pré-estabelecidas, e em grupo. Você verá vários outros grupos visitando no mesmo horário, quase como uma fileira de carros 4×4 de rally.
Dali a um tempo chegamos a (mais) um hotel de sal que era como uma ilha naquele deserto. Algumas bandeiras e um marco com o nome da Bolívia eram quase que as únicas referências visíveis no lugar. Mais adiante, havia um povoado onde almoçaríamos.




O vilarejo perto daqui, como outros tantos pelo interior da Bolívia, parecia um feirão sobre um chão de terra batida. Este era voltado especialmente para turistas com produtos de rocha, de tecidos ou de madeira, com aqueles padrões coloridos típicos andinos ou em figuras de lhamas. Aqui almoçamos antes de seguir para ver o famoso Cemitério de Trens perto de Uyuni, cidade que dá nome ao salar.
Visto o principal, o tour ganhava tons de encerramento, e daqui iniciaríamos o caminho de volta até San Pedro de Atacama.


EPÍLOGO: O Cemitério de Trens e o caminho de volta
O Cemitério de Trens se trata de um lugar onde se acumulam locomotivas importadas dos ingleses no fim do século XIX e começo do século XX. Havia um projeto de se ligar as minas de prata e estanho daqui com o porto de Antofagasta, no que é hoje a costa chilena. A coisa não decolou, o sal segue a carcomer a ferragem, e temos até hoje — a céu aberto — esta ilustração histórica do sub-desenvolvimento.
Hoje, chegam os grupos de turistas estrangeiros para ver o lugar. Uma bandinha tocava em busca de uma moeda enquanto nuvens de chuva se formavam com rapidez no horizonte. Eram meados da tarde.


A chuva quase nos alcançou quando corríamos de volta ao carro, os pingos grossos a bater nas janelas ainda antes de ligarmos o motor. Dali era uma curta distância até a cidade de Uyuni, lugar belo, onde nos deteríamos um par de horas.



O que vi de mais bonito na cidade de Uyuni foi uma turista finlandesa enquanto aguardava sem nada para fazer na agência com cheiro de mofo. Gustavo, nosso motorista que gostava de pronunciar “Collor de Mello” com Ls demorados, havia se despedido e agora aguardávamos um outro, que não vinha. A chuva caía intermitente lá fora, aquelas chuvas de verão que despencam e passam, para daí a pouco despencar de novo quando você pensa que já passou. Eu havia ido a uma bodega na pracinha principal para usar o wifi e o banheiro após pedir um chocolate quente que me fez cliente, e voltei à hora marcada à agência para ver que o motorista novo não estava à hora marcada.
Finalmente, apareceu o margarido, um boliviano jovem de feições morenas andinas, daqueles pessoas que você acha que não usam óculos e que de repente põe óculos. Era tão tranquilo e pacato que eu não tive coração para demonstrar qualquer insatisfação pelo atraso. Coitado, pagaria um karma danado logo dali a pouco. Numa blitz à saída de Uyuni, um policial invocou que a foto na sua carteira de motorista não era ele. Senti um certo cheiro de corrupção no ar, mas não demos propina. O motorista voltou algo abalado para o volante, e seguimos estrada à frente.
Perdoem-me os que gostam de autoridade policial, mas mundo afora já fui mais importunado por polícias que por ladrões.
Dormiríamos no mesmo lugar onde passamos a primeira noite. Chegamos lá já com tudo escuro, eu a reconhecer algumas crianças que nos olhavam com aquela cara de quem vai avisar à mãe que o carro de turistas chegou. Fazia frio. Instalamos-nos nos quartos apertados da casa com cheiro de cimento, e acho que fui dormir sem banho. No dia seguinte, chegaríamos de retorno a San Pedro de Atacama à hora do almoço. Era bom retornar ao conforto.
Daqui, após ver esse esplendor, eu passaria apenas uma noite em San Pedro, para no dia seguinte rumar à Patagônia chilena no extremo sul do país. Vejo vocês de lá.

Meu jovem, quase sem palavras para falar dessa postagem e desse lugar encantado. Parece mesmo que foram transportados para o céu!………Uaaauuu… que beleza, que espetáculo, Incriiivel a região , espetaculares os efeitos, lindíssimas as paisagens e interessantíssimas as brincadeiras. Curiosíssimas. Adorei, Lugar fantástico. Extraordinário. Parabéns pela escolha do passeio e pela postagem. .Obrigada por nos oferecer tao belo e insuspeitado presente. Maravilha. amei. Valeu, jovem viajante brasileiro. Surrealllll
Interessantíssimo o local, Incrível, e tao pouco conhecido. Belas nuances e efeitos. Uma riqueza natural.