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Tajiquistão

Tajiquistão: Visto, dicas de viagem, aonde ir e o que fazer

O Tajiquistão é o cadinho persa na Ásia Central, o único país da região que não se origina dos nômades túrquicos das estepes. Isso o torna especial e diferente.

Tive uma estadia curta no país, o bastante para sentir seu gosto. Abaixo, faço um balanço geral da minha experiência e depois forneço algumas dicas a quem cogita vir aqui.


  • O que mais gostou. Das paisagens montanhosas entrecortadas por rios rápidos de águas verdes por entre as pedras.
  • Visita obrigatória. O lago Iskanderkul, onde dizem que Alexandre, o Grande, acampou. Lugar maravilhosamente lindo.
  • O que não gostou. Das frescurites deste governo autoritário e excêntrico, que não permite que carros empoeirados circulem na capital (o que atrapalha seus passeios e faz com que você precise sempre se deter um lava-jato na volta), mas deixa o esgoto a céu aberto nas ruas. 
  • Queria ter visto mas não viu. As Montanhas de Pamir, no leste do país, mas é uma viagem que requer mais tempo, em geral uma semana (mais detalhes abaixo).
  • Comes & bebes a experimentar. Qurutop, o prato nacional: um mexidão de lascas de pão com iogurte, azeite, e salada, tudo misturado. Fica bom! (Eu o mostrei neste post.)
  • Momento mais memorável da visita. Sentir-me naquele miolo montanhoso, que há milênios configura um recanto remoto da civilização, enquanto dirigíamos pela rodovia margeada por um rio ainda límpido entre Dushanbe e Iskanderkul.
  • Alguma decepção. O interior da Fortaleza de Hisor, à qual cobram ingresso, mas cujo interior está todo renovado com lojas e já sem qualquer apelo histórico. Sugiro ver apenas por fora.
  • Maior surpresa. Descobrir as diferenças culturais dentro do próprio Tajiquistão, e que a região de Pamir não só fala um idioma diferente, como também seguem uma vertente diferente do Islã. Fiquei com vontade de voltar para conferir melhor essa diversidade — além da paisagem.

PRINCIPAIS DICAS

Visto & imigração. O Tajiquistão é dos poucos países da Ásia Central que ainda exigem visto para brasileiros (ou europeus), mas se trata de um visto eletrônico (e-visa) que você solicita no site oficial e imprime em casa. Custa USD 50, e é simples de obter.

Para a solicitação, não precisa foto digitalizada nem nada além do pagamento, seus dados pessoais, e um scan da página de identificação do seu passaporte em formato PDF. O passaporte precisa estar válido por no mínimo 6 meses após o fim da sua estadia, o que por sua vez é determinado automaticamente pois os vistos são de duração fixa (30 dias, etc.) Ou seja, você fornece apenas a data em que prevê entrar, e eles se encarregam de calcular o resto.

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Página oficial de solicitação do visto eletrônico para entrar no Tajiquistão. (O site é https://www.visa.gov.tj)

O pagamento se dá por cartão, e tanto Visa quanto MasterCard são aceitos. São USD 50 por um visto de 30 dias, mais USD 20 extras se você desejar também uma permissão para visitar a Região Autônoma de Gorno-Badakshan (Gorno-Badakhshan Autonomous Region – GBAO). Trata-se da região de Pamir, no leste do país. 

O e-visa é, em princípio, emitido dentro de 3 dias úteis, mas frequentemente leva mais que isso. Não se desespere; li bastante a respeito e vi que às vezes leva até duas semanas pra ser aprovado, mas sai. Se você é do tipo que fica ansioso com essas incertezas, recomendo solicitar o visto com algo de antecedência para ficar “de boa” se eles demorarem processando sua solicitação. O meu saiu em torno de 4 dias úteis. (Diz a lenda que, se mesmo depois de umas semanas não sair, você deve enviar um e-mail para este endereço, e essa pessoa faz a coisa acontecer.)

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Preenche-se um formulário de imigração no aeroporto ao chegar no país, mas nada além do habitual. Conserve o canhoto consigo até sair do Tajiquistão.

Seu visto eletrônico chega por e-mail. É apenas uma página, que você deve imprimir e levar. Não há adesivo no seu passaporte; os oficiais simplesmente carimbarão seu passaporte e também a folha do visto impresso. No aeroporto, preenche-se um formulário de imigração como em outros países. Tenha-o consigo preenchido antes de entrar na fila.

Os oficiais aqui não conversaram muito comigo, e a passagem foi tranquila. Uma vez dentro do país, conserve consigo o canhoto do formulário de imigração que preencheu na chegada, e guarde consigo também o visto impresso com o carimbo que recebeu na entrada. Na saída eles vão querer essa folha de papel carimbada e a reterão quando você for embora. 

Note que não é permitido portar (sem declarar à alfândega) mais que o equivalente a USD 2.000 em espécie na saída do país — como no Uzbequistão, só que aqui não vi nenhum aviso claro pra você declarar, depois é que descobri. Não vi problema algum no controle de passaporte; todos ali me pareceram bastante profissionais e de pouca conversa. Na alfândega é que um oficial atrás de uma mesa me perguntou quanto de dinheiro eu ia levando. “Em dinheiro, sem ser cartão.”, indagou ele. “Uns 400 dólares”, respondi-lhe eu. “Está bem. Está OK”, disse-me ele retornando meu passaporte com o cartão de embarque. Tenha as coisas em ordem.

Breve situação inusitada foi, já ao portão de embarque, o que me pareceu ser uma funcionária de uma aerolinha chegar com um envelope como que solicitando se eu poderia levar esses documentos pra ela. Achei aquilo tão surreal que fiz que não entendia muito de russo (mas entendi a palavra “dokumenty” e o tom da abordagem). Perguntei em russo se ela falava inglês, ela disse que não. Desistiu e foi a outros. Olho vivo pois há quem diga ser treta.

A internet também tem várias notificações de que os oficiais no aeroporto de Dushanbe têm o hábito de arranjar uma razão para pedir propina — 10 ou 20 USD que sejam. Basta uma falha sua com os papeis. Eles parecem alvejar quase sempre pessoas com passaporte asiático (cheguei a conhecer um indiano que disse ter passado por isso), e parecia ser mais comum há uns anos atrás, mas é bom ficar alerta. Não tenha paranoia — centenas de pessoas entram e saem do país todos os dias —, mas vale a pena redobrar a atenção e certificar-se de não trazer dinheiro demais. 

Apesar dessa breve burocracia e das indagações estranhas, não tive problema algum, e foi uma visita tranquila sem qualquer dor de cabeça.

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Clima, quando vir & melhor época. O Tajiquistão, como o restante da Ásia Central, tem um clima continental temperado, de invernos bem rígidos e verões bem quentes. As montanhas, no entanto, quebram um pouco disso e reduzem (bastante) a temperatura nas áreas mais elevadas.

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O lago Iskanderkul no verão.

A época de turismo vai em geral de abril a outubro. Julho e agosto são os meses mais quentes, quando às vezes passa dos 40ºC na capital Dushanbe. Por outro lado, pode ser uma boa época para ir às elevadas Montanhas Pamir, onde fica fresco. No restante do ano, as montanhas podem ser bem frias.

Já se você planeja uma viagem mais urbana — ou de terras baixas —, maio ou setembro podem ser os meses ideias, com temperaturas amenas. 

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Segurança. O Tajiquistão é relativamente seguro. Riscos de crime são bem baixos, mas fique atento para evitar tretas com a polícia. Eles podem arrumar pretexto para lhe cobrar propina, seja no aeroporto ou no trânsito se acharem de alegar que você violou alguma regra.

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Somoni, o dinheiro do Tajiquistão. 1 USD = 9,7 somoni (TJS), 1 EUR = 10,6, mas verifique as cotações atualizadas quando for viajar.

Câmbio & Dinheiro. O dinheiro tajique é o somoni, uma moeda até relativamente estável para os padrões da região (tem menos inflação que o dinheiro uzbeque, por exemplo).

O melhor é, sem dúvida, trazer dólares americanos (USD). Não vi casas de câmbio em Dushanbe (não sei nas demais localidades, mas não apostaria muito); as acomodações é que muitas vezes acabam trocando a moeda de Abraham Lincoln pela daqui. Euro se troca, mas em geral só nos bancos.

Há caixas automáticos, mas fique atento pois, como no Uzbequistão, aceita-se Visa mas não MasterCard. Já nos estabelecimentos, poucos aceitam cartão. O mais habitual é pagar as coisas em espécie, em somoni.

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Os caixas automáticos aqui em geral não aceitam MasterCard.

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Custos & Acomodações. O Tajiquistão é um país bastante barato. Noite em dormitório de albergue custa em torno de 10 USD com café da manhã incluso, e daí pra cima há todos os níveis de conforto a partir disso. No entanto, não venha pensando demais em conforto, pois acomodações mais luxuosas só existem na capital. O interior é bem precário, de pousadas familiares bastante simples.

Alimentação também é barato — por USD 4-5 você se farta. Quem custa mais mesmo são os passeios, pois praticamente não há trens ou ônibus de interesse no país; quase tudo é feito em transporte particular arranjado.

Uma ida bate-e-volta de Dushanbe ao lago Iskanderkul sai em torno de USD 100 no total, a ser dividido pelo número de passageiros. (Tenha em conta que o motorista provavelmente vai querer receber em somoni. As acomodações é que aceitam receber dólar.) Já as idas às Montanhas Pamir são mais longas e mais custosas também. Normalmente, se faz em vans compartilhadas com outros turistas. Você pode escrever às acomodações pra descobrir quando há grupos saindo e juntar-se a um. Os preços que encontrei vão aí abaixo para sua referência.

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Estes preços são do City Hostel Dushanbe, como referência. Note que o valor grande é dividido pelo número de pessoas viajando.

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Montanhas Fann, nos arredores do lago Iskanderkul.

Aonde ir, e quanto tempo em cada lugar. O Tajiquistão é sobretudo um destino de trilhas, paisagens e montanhas, então os turistas em geral usam suas cidades apenas como base.

Dushanbe, a capital, é uma típica metrópole soviética com seus museus, praças e monumentos. Não é feia, mas não tem muito para entretê-lo por muito tempo. Eu diria que 2-3 noites na cidade são o suficiente.

Num dos dias, de preferência num fim de semana, arranje um táxi para ir à histórica Fortaleza Hisor, com estruturas do século XVI a 30Km da capital. Há madraças a visitar e, especialmente aos domingos (mas também às vezes aos sábados), há pessoas se casando lá, com banda, música, convidados a dançar e todo um espetáculo cultural pra você ver.

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Fortaleza Hisor, a 30 Km de Dushanbe. É um dos principais lugares históricos a ver no Tajiquistão.

Se você quiser fazer um bate-e-volta ao lago Iskanderkul (o que eu recomendo caso você não planeje ir até lá de outra maneira), adicione outra noite em Dushanbe.

Se você gozar de maior tempo, pode buscar trilhas (como a Seven Lakes hike) nas Montanhas Fann, e emendar com a cidade de Panjikent no norte do país. Não cheguei a conhecê-la, mas é um ponto-de-apoio habitual de onde arrumar passeios pelas Fann. 

Por fim, Pamir, que é a grande sensação do Tajiquistão, mas que requer tempo — pelo menos uma semana inteira dedicada só a essa região, pois as estradas são básicas e a rota é algo lenta. Não adianta tentar fazer só o comecinho, ou só uma parte, pois pelo que me dizem só fica interessante da metade pro fim, depois que você deixa mais a “civilização”.

Dizem que lá em Pamir tudo quebra: carro, sinal de celular, etc — é parte da aventura, que um dia eu pretendo ainda voltar aqui para fazer. Lembre-se de que para visitar Pamir você precisa antes solicitar a GBAO permit, a permissão imigratória para visitar a Região Autônoma Gorno-Badakhshan. Se você não tiver solicitado quando pediu o visto tajique, há agências que tiram essa permissão pra você depois de você já estar dentro do país. Dizem que sai até no mesmo dia, mas não é algo que eu tenha feito.

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O Corredor de Wakhan, que liga o Afeganistão à China em puras montanhas, é hoje um parque ecológico que se pode visitar.

Os mais atrevidos, da cidade de Khorog já no leste do país, cruzam até a região de Ishkashim no Afeganistão. Parece haver um visto afegão especial para se visitar apenas essa região, que dizem ser mais tranquila num canto remoto do país onde o Talibã não perturba muito.

Para além dali há também o histórico Corredor de Wakhan, uma zona de amortecimento garantida ao Afeganistão como tampão entre o que eram os impérios russo (que incluía o Tajiquistão) e britânico (que incluía o Paquistão) nos tempos de outrora.

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Compras. O Tajiquistão oferece menos que seus vizinhos em termos de artesanato e coisas típicas a levar. Como se trata de um país montanhoso e com suas minas, há muitos produtos de pedra (ônix, etc.) por preços camaradas. Outra coisa são as maravilhosas frutas secas, que você encontra pelos mercados de Dushanbe ou no interior do país. (Certifique-se de levar umas que não estejam cobertas de poeira por excessiva exposição. Se você fizer o vendedor entender, ele lhe arruma umas mais novas.)

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Abricós (damascos) secos e muitas nozes & cia no bazar de Dushanbe. Tudo bem mais barato (e de melhor qualidade) do que os equivalentes que você encontra no Brasil ou mesmo na Europa. Levei uns damascos desses que deixaram meus amigos europeus embasbacados.

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Homens e mulheres aqui em geral estão em grupos separados.

Idioma & trato com as pessoas. As pessoas aqui falam tajique e russo. Inglês é pouco falado, exceto nas acomodações. Motoristas em geral não acertam uma única frase de inglês. No entanto, as pessoas muitas vezes são sociáveis e não acham o fim do mundo se você usar de mímica, etc. Vão se divertir. Se você precisar dizer algo mais complexo, em geral as pessoas mais jovens são as que melhor sabem inglês.

No mais, o trato das pessoas é um tanto como com os parentes persas dos tajiques no Irã. Mulheres e homens se comunicam — e até trocam olhadelas se for o caso —, mas há uma certa compostura social que exige certa distância entre os sexos. Isso no caso de Dushanbe; no caso de Pamir, dizem lá haver uma cultura mais solta, menos conservadora, até por eles serem muçulmanos ismaelitas em vez de sunitas, mas aí é algo que eu ainda preciso conferir quando voltar.


Se você ficou com alguma dúvida, quer algum toque, ou tem alguma pergunta que eu não respondi, é só pôr abaixo nos comentários.

Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

3 thoughts on “Tajiquistão: Visto, dicas de viagem, aonde ir e o que fazer

  1. Fiquei com uma dúvida sobre Pamir, como funcionam esses tours, eles levam a gente até uma cidade na região e a partir de lá fazemos as trilhas por nossa conta? Ou eles nos levam até os locais mais interessantes para visitar?

    1. Oi Nei, bem-vindo! Os tours até Pamir costumam ser completos. Eles vão com você até Khorog (a principal cidade da região), mas dali o ajudam a organizar atividades (trilhas) e trazem você de volta — a menos que você queira fica pelo caminho para, dali, tomar outros rumos, o que às vezes ocorre.

      O que não é certo é que tais trilhas ou outros passeios a partir de Khorog já estejam incluídos no preço. Isso aí vai ser preciso checar com quem lhe vender a ida até Pamir. Mas, no geral, sim, são passeios bastante completos em que eles ajudam você com tudo. Até porque é uma área um pouco inóspita, onde nem sinal de celular pega direito, então ficar totalmente por conta por ser um tanto desafiador.

      Haverá, é claro, coisas opcionais, como atravessar a fronteira e entrar no Afeganistão para visitar a cidade fronteiriça de Ishkashim. Alguns fazem. Não é raro que se permaneça em Khorog uns dias organizando essas coisas.

      Os passeios costumam ser bem tailor-made, com quantidade variável de dias e ajustável às intenções do grupo.

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