Foi numa primavera destas que eu fui a Londres pela primeira vez. Muito havia eu ouvido, como tantos, sobre o nebuloso clima londrino: chuvisco constante, névoa… aquelas coisas que a gente vê nos filmes. Não é a realidade 100% do tempo.
É fato que o clima de Londres está longe de ser exatamente mediterrâneo. Chove em média 106 dias no ano, portanto quase um terço do tempo, mas eu estava vindo de um lugar onde chove ainda mais: Amsterdã, onde quase metade dos dias no ano veem chuva. Também dei sorte, Londres na primavera foi um frescor surpreendente, com um delicioso sol fresquinho, tempo aberto, animação na rua e muitas flores.
Pode não ser a estereotípica Londres cinzenta, mas é uma faceta da Londres real. E num desses sortudos dias de primavera, eu fui passar o dia bordejando na capital.

Eu passei um par de noites num albergue acima de um bar antes de me juntar a uma amiga no bairro de Hammersmith, com aquele ar típico inglês de casario enfileirado na rua. Parece que você está em Harry Potter, Simplesmente Amor (2003), Penny Lane ou alguma outra referência tipicamente inglesa.


Visitantes pouco habituados à Europa podem não perceber, mas a Inglaterra é distinta do continente no que tange o jeito de suas ruas (como em muitos outros aspectos). Na Europa, nas capitais se mora geralmente em blocos de apartamentos. Visite Roma, Paris ou Praga e verá muitos prédios de época de vários andares. Não tanto em Londres, onde predomina esse visual de casas. (A Holanda também o tem, mas aí é porque Holanda e Inglaterra têm muita cultura compartilhada. As liberais potências navais se imitaram em muita coisa ao longo da História.)
Londres, ainda assim, é uma grande metrópole de 9 milhões de pessoas — a mais populosa da União Europeia antes do Brexit acontecer dia 31 de janeiro de 2020. Há de se ver com o tempo como a cidade mudará.
“Londres é sempre Londres“, disse-me certa vez um gordinho risonho inglês que encontrei num albergue nem me lembro onde. Eu lhe perguntara como ia a cidade, o que lhe pareceu talvez trabalhoso de responder. Tal qual o gato de Alice no País das Maravilhas, que desapareceu deixando só o sorriso solto no ar, ficou-me o riso do gordinho sem eu me lembrar onde estávamos.
Londres, de fato, tem suas marcas emblemáticas indeléveis. Como talvez o maior deles nos últimos tempos: o Big Ben. O nome originalmente se referia apenas ao sino que badala, mas acabou sendo entendido como todo o relógio instalado na Torre Elizabetana do Parlamento Britânico em 1859.


Apesar da grandiosidade monárquica e do seu peso de centro financeiro que alguns chamam de lavanderia global, o que há de principal a ver em Londres se percorre numa boa jornada a pé — se você tiver pernas.
Sim, há museus onde você pode passar horas, como a galeria Tate Modern para os fãs de arte moderna, o pomposo Museu Britânico (que eu mostro em detalhes no próximo post) para os fãs de História, ou o Museu de História Natural para os fãs de dinossauros, paleontologia e biologia em geral. Há também centenas de barzinhos e lugares descolados conhecidos por quem mora na cidade, mas o coração da cidade você pode conhecer sem precisar passar um ano inteiro aqui.
A primeira atração histórica que eu vi não foi nem o Big Ben, mas a Ponte da Torre (Tower Bridge) sobre o Rio Tâmisa, assim chamada por estar perto da mal-afamada Torre de Londres, onde por muitos séculos se prendiam pessoas nos seus calabouços (desde 1100 até 1952, para ser exato).



Fazia um friozinho primaveril — não um frio intenso, mas aquele friozinho gostoso, de bater um vento no rosto, que se resolve com um moletom simples. Um daqueles dias em que você sabe que poderá andar a fio sem suar.
Eu passara no agradável Borough Market, um dos muitos mercados abertos de Londres onde encontrar desde frutas a guloseimas feitas no dia (e toda sorte de quinquilharias). Lembro-me de ter comido um delicioso brownie propagandeado como gooey, que em inglês quer dizer algo como gosmento. Esse uso meio satírico da língua pelos ingleses é algo a se registrar. O típico bolinho baixo de chocolate recortado em quadrados estava ótimo — uma das poucas coisas que a cozinha anglófona sabe fazer bem, se querem a minha franqueza.

A Torre de Londres me esperava do outro lado da ponte — graças a Deus e às mudanças governamentais, hoje uma propriedade pública desativada. O castelo-com-prisão foi erigido sob ordens de Guilherme o conquistador (William the conqueror — sim, William é Guilherme em inglês) a partir de 1066.
William não era um grande conquistador inglês, ele foi o grande conquistador que conquistou a Inglaterra. Eu lembro de me divertir horrores durante a aula de História perguntando-me entre os colegas se a Inglaterra já tinha sido invadida, como teria ocorrido se acontecesse isso e aquilo, etc. Essas coisas de curioso.
William era o duque da Normandia, no século XI uma região independente no atual norte da França. Ele foi quem liderou a campanha conquistar e dominar a Grã-Bretanha, que viviam séculos de divisões entre potentados anglos e dos Vikings, que aqui estiveram por 200 anos. O francês medieval passou a ser a língua da corte, daí muitas palavras francesas terem passado ao inglês (ex. oignon, francês para cebola, que virou onion).
Ganharia vida a Torre de Londres como fortaleza-castelo-calabouço quase pelo milênio inteiro, de 1066 para cá.

Atravessei a Ponte da Torre sobre o Tâmisa, e perto do outro lado já estava a famosa Catedral de São Paulo (St. Paul’s Cathedral), onde se casaram Princesa Diana e o príncipe Charles nos anos 80.



Hoje, Londres está longe de ser mais assim (talvez fosse mais pitoresca nessa época), mas a catedral segue sendo portentosa.
Dali, não é uma caminhada muito comprida até se chegar aonde estão Covent Garden, Neal Street, o maravilhoso Museu Britânico, e a Praça de Trafalgar. A famosa Abadia de Westminster e a própria Downing Street, morada de todo primeiro-ministro britânico, ficam ali nas circunvizinhanças. Como eu falei, tudo fica perto no miolo de Londres.
Você, é claro, pode num dia de chuva optar pelo tube, que é como os londrinos apelidam o seu metrô (“subway” aqui quer dizer túnel por debaixo da rua). Mas a primavera estava bela demais para tal.


O Covent Garden é um lugar antigo, que funciona como mercado e local de encontro de pessoas pelo menos desde os idos de 1600. No entanto, naqueles idos ele funcionava também como prostíbulo — era o “distrito da luz vermelha” de Londres. Continua a funcionar como área de entretenimento, mas hoje algo mais “família”.


A Neal Street, ali perto e no caminho para o Museu Britânico, é para os fãs do misticismo inglês. (A quem não sabe, os ingleses historicamente são dos mais envolvidos com ocultismo, esoterismo, etc. Boa parte dos grandes pensadores ingleses, incluso aí sir Isaac Newton, eram esoteristas de marca maior interessados em alquimia, astrologia e tais temas hoje afastados da ciência formal.)
Ela tem umas lojinhas bem legais, com vendedores com aquele ar de hippies veteranos dos anos 60. Isso faz parte da identidade inglesa.



Aproxime-se um pouco do Big Ben, e você não demorará a avistar a Praça de Trafalgar (Trafalgar Square), com a imponente Coluna de Nelson no centro. Isso refere-se a um episódio importante da História britânica.
O vice-almirante Horatio Nelson (1758-1805), mais conhecido hoje como Lord Nelson, foi quem liderou a esquadra britânica na resistência à tentativa napoleônica de invadir a Grã-Bretanha. A Batalha de Trafalgar (1805) foi a maior das batalhas navais dessas campanhas napoleônicas.
A batalha se deu perto de Cádiz na Espanha, no Cabo de Trafalgar, e a Inglaterra conseguiu superar as forças franco-espanholas no mar. Napoleão então mudou para uma tática de sufocamento, o tal bloqueio continental, impedindo nações do continente europeu de então fazerem comércio com os britânicos — que Portugal traiu, levando Napoleão a invadi-lo, e deflagrando a fuga da família real ao Brasil.
Nelson morreu em batalha. Seus restos repousam na Catedral de São Paulo, e há hoje essa coluna em sua homenagem.



Como que para ratificar que tudo está perto, a Abadia de Westminster (Westminster Abbey) também está logo aqui ao lado. Trata-se da igreja mais tradicional de todo o Reino Unido, onde os monarcas há séculos são coroados. Desde o normando Guilherme o conquistador em 1066, todas as coroações inglesas ou britânicas se deram aqui. (“Britânica” desde a união com a Escócia em 1707.)
É uma imponente construção gótica de época por detrás das árvores. Na realidade, a alcunha de “abadia” é defasado, pois se refere ao que ela era no seu princípio medieval, quando nos idos de 960 monges beneditinos aqui fundaram uma abadia monástica.
O templo gótico atual foi erigido entre 1245-1517. Só que, quando o rei inglês Henrique VIII rompe com o papa (para poder se divorciar e casar com outra sob bênçãos eclesiásticas, algo que o papa recusou), a Igreja Anglicana se desvincula do Vaticano. Westminster deixa de ser abadia e catedral, passa a se chamar uma Royal Peculiar na nova linguagem da Igreja Anglicana, uma paróquia diretamente sob as ordens do soberano (que agora era chefe tanto do Estado quanto da Igreja).



Em falando de governo e pompa, a rua mais poderosa de Londres — Downing Street., cuja casa n. 10 é a morada dos primeiros-ministros — fica logo aqui. Logicamente, não é de livre acesso.


O primeiro-ministro manda, mas sabemos que oficialmente a chefia de estado no Reino Unido continua simbolicamente nas mãos da monarquia. E o famoso Palácio de Buckingham, principal residência da monarca, também está aqui pertinho.
A quem estiver confuso, o país se chama Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte. Grã-Bretanha é esta ilha, que abarca Inglaterra, Escócia e País de Gales. Esses eram reinos independentes séculos atrás, mas desde 1707 estão nesta União sob monarca e governo únicos. Guardam certa autonomia, mas pouca. Daí a Escócia querer se separar.
O Palácio de Buckingham fica envolto no agradável Parque de São Tiago (St. James Park. Sim, James é Tiago em português.). Ele é a principal residência da rainha, e tem sua leva de guardas caracteristicamente uniformizados. Só não pense que a tumultuosa família real britânica fica o tempo todo dentro da mesma casa — eles frequentemente estão espalhados, cada um residindo preferencialmente num palácio, como em Windsor e outros. (Acho que diminui os atritos.)


É possível visitar o Palácio de Buckingham apenas no verão, entre julho e outubro, em datas exatas que são publicadas a cada ano. Ainda não era o meu caso aqui, então me contive em ver seu portão e a troca da guarda.

E, assim, num só dia você pode ver bastante do que há em Londres. Claro que não é tudo — residentes serão rápidos em dizer que ainda tem isso e aquilo (e eu aceito indicações!) — mas eu quis mostrar que o que há de mais famoso em Londres se pode ver ainda que seu tempo esteja curto.
(Se você realmente só goza de um dia em Londres, marque alguns desses pontos num mapa de aplicativo, comece cedo, prepare as pernas, e verá que poderá dar uma conferida em todos eles.)
O Museu Britânico, naturalmente, pode tomar horas, que eu recomendo investir para conhecê-lo em detalhes. Mostrarei-o melhor num outro post, já que eu pude passar mais tempo em Londres. Porém, como ele é gratuito, ainda que você só tenha 1h, entre. Fica como tira-gosto pra você depois voltar.
O Museu de História Natural fica afastado do centro, e requer metrô (o tube). Compre um Oyster Card, o cartão de transporte público em Londres, para deslocar-se gastando um pouco menos. (Digo “um pouco” porque tudo aqui é caro.) Ele vale a pena a quem for ficar alguns dias. Você o compra nas máquinas de estação de metrô, como em qualquer grande metrópole mundial hoje em dia.





Bela e histórica cidade. Belíssima arquitetura, construções magnificas, expoentes de porte do grande poderio que por seculos manteve a Inglaterra e depois o Reino Unido sobre grande parte do mundo conhecido. Belíssimo acervo histórico. Bairros, ruas e distritos interessantes. Acho lindos os ônibus vermelhos de 2 andares. Belos jardins e locais acolhedores. O histórico e famoso Tâmisa, a bela ponte, o Big Ben, aparecem como pontos bastante interessantes. Uma cidade digna de ser visitada. Obrigada. Gostei de ver Londres,