Viajar de trem pelo Vietnã é uma experiência bastante asiática — aquele aroma e sensação de voltar no tempo dos colonialismos inglês e francês, como ocorre também na Índia. É outra forma de dizer que a coisa é meio velha, “tradicional”.
No caso do Vietnã, não pensemos tanto em século XIX britânico dominando as Índias, mas em franceses do meado do século XX. Os franceses, que colonizaram o Vietnã de 1858 a 1945, completaram em 1936 a linha ligando Hanoi no norte a Saigon (hoje Cidade Ho Chi Minh) no sul. Os vagões foram modernizados, pero no mucho.

Há ar condicionado, merendas a bordo, mas não espere nem de longe os serviços de alta velocidade que você encontra em outras partes da Ásia, como Coreia do Sul, Uzbequistão, China, pra nem falar no Japão.
Eu diria que viajar de trem no Vietnã é mais uma coisa de experiência — para sentir como é, ver a paisagem rural do lado de fora, etc. — que de conforto ou praticidade. Sobretudo hoje com a Vietnam Airlines oferecendo uma alternativa de boa qualidade e baixo custo.
Comigo, eu planejei percorrer todo o compridinho Vietnã em trem (ver mapa abaixo). De Hanoi no norte à interessante cidade de Hué no centro são 11h, e de lá à Cidade Ho Chi Minh são outras 20h. (Se você se detiver no Vietnã central e partir de Da Nang, serão 17h de lá a Ho Chi Minh). Já o percurso inteiro de uma vez dura 33h, saindo de Hanoi à noite, passando o dia seguinte inteiro no trem, e chegando a Ho Chi Minh na madrugada do terceiro dia.

No entanto, acabei dissuadido de fazer tudo de trem pelos próprios vietnamitas. Acabei optando por fazer metade em trem, metade em avião. Não me arrependi.
Uns breves toques sobre as passagens antes de eu relatar a minha experiência.
Como comprar? Os trens vietnamitas requerem reserva antecipada. Não dá para simplesmente aparecer na estação. O site oficial, contudo, só aceita cartões vietnamitas.
O site 12go.asia oferece serviço de reservas para a região do Sudeste Asiático e aceita cartões estrangeiros. Comprei através dele para a Tailândia, mas por algum motivo não consegui processar o pagamento desta vez. Experimente; pode ter sido um problema temporário.
Acabei reservando através do Hanoi Friends Travel & Inn, onde me hospedei na capital. A maioria das acomodações no Vietnã o auxiliam a reservar passagens de trem ou avião sem dificuldade. Os custos todos são módicos aqui, dos países mais baratos do mundo. (A quem gostar de acomodação informal, estilo hostel, mas com opções também de quartos privativos, eu os recomendo).
O que esperar?
Minha experiência foi no mais confortável dos trens. Eu não estava exatamente no “trem povão”, mas no 4-berth soft sleeper, o que significa ar condicionado e camas para 4 pessoas por compartimento.

O ar condicionado é um tanto potente, como você logo nota. Embora fosse inverno (e em Hanoi isso signifique uns 15-22ºC), dentro do trem parecia estar ainda mais frio. Também não me convenci de que a limpeza do ar condicionado estivesse uma maravilha; pelo contrário.
Não vi vagão-restaurante, mas às vezes passava um carrinho vendendo merendas básicas e bebidas quentes (leia-se café ou chá).
Eu havia saído de Hanoi às 19:30, tudo já escuro, e não sei se demorei a capotar no sono. No outro lado do compartimento, um calado casal vietnamita de meia-idade acomodou-se; ele esparramando-se folgadão com ela, toda cheia de cuidados, no mesmo leito. Depois ela subiu e foi se deitar lá em cima quando o marido já estava roncando.
A noite foi toda de chuva. Aliás, Hanoi neste inverno havia-nos poupado de água, mas chuva seria presença cotidiana nos meus dias a vir.
O banheiro numa episódica ida de meio da noite deixou algo a desejar, embora fosse utilizável. Vou poupá-los de detalhes sórdidos.
A cama em si é confortável o bastante, embora o cheiro e temperatura no ar condicionado velho não fossem assim uma Brastemp. Às 6h em ponto, um rádio indesligável se pôs a tocar, aquela estática de rádios do tempo da guerra, uma voz de taquara rachada excessivamente empolgada — como se fosse uma coordenadora de escola militar — iniciando o exercício dos alistados ♫ Wuuuu, lararara…! ♫
Depois eu soube que é uma canção para as crianças saberem da marcha que não se deteve, de norte para sul, à época da agressão estadunidense. Eu me solidarizo com o sofrimento dos vietnamitas, mas esse despertar militaresco no rádio eu dispensava.
Caso você esteja aí curioso, fiz um brevíssimo vídeo depois que a música ganhou contornos mais líricos.
Como você nota, o exterior é bem rural. Não imagine paisagens à là National Geographic perto da linha do trem, mas roçados de várzea. Era água até onde a vista alcançava, tudo alagado.


Às vezes avistávamos uns búfalos domesticados caminhando, e de outras vezes alguns agricultores com seus chapéus redondos.

Aproximando-nos de Hué, já víamos pela janela do trem também alguns ciclistas heroicos com umas lindas e longas capas de chuva coloridas, a pedalar rápido sobre aquelas estradas de terra fazendo suas capas plásticas esvoaçarem.
Passou um carrinho vendendo coisas de café da manhã, e tivemos que ir na base do “não tem tu, vai tu mesmo“. Em meio a uns biscoitos, o que havia de mais sustança era um arroz com pedaço de carne no prato de isopor. Embora não fosse assim o supra-sumo do sabor, eu gosto desse arroz pegadinho.
O exterior estava inspirador para logo desembarcarmos em Hué naquela manhã.

Não havia sido uma noite ruim, mas tampouco eu diria que foi uma adorável noite “super tranquila, super recomendo”. Vale como vivência, e como banho de realidade.
Falando em banho, chegamos a Hué debaixo de chuva. A estação se encontrava em reforma, então desembarcamos por entre as poças e o lamacê.



Hué seria uma visita inesquecível, por várias razões. A seguir eu conto como ela se deu.
Nossa, que horror. O senhor se mete em cada embrulhada, meu amigo..arremaria. E que lugar que chove é esse. Notre Dame; Deus me livre hahah.
A viagem de trem nao pareceu tai ruim, pelo visto, mas eu prefiro trem com vagão restaurante haha. Gosto de viajar de trem. E durante o dia. Para ver a paisagem.
A comilança parecia boa.
Achei linda a plantação de arroz.
E isso ai. Valeu
Oi Mairon, tudo na paz? Estou planejando uma viagem sola para Tailandia, Camboja e Vietnan, janeiro próximo, se a pandemia deixar. Penso como vc, viajar sozinha não é assustador, é libertador! Vou ler todos os posts para compor meu roteiro. Obg pelas dicas! Abs