Não é todo dia que eu encontro flores de lótus no meu caminho. Neste dia eu encontrei.
Estamos nas vizinhanças de Da Nang, a maior cidade do Vietnã central. Nós vínhamos de dias na chuvosa Hué, e ver novamente o azul do céu fez-me sentir como no clássico Mito da Caverna, quando o indivíduo finalmente se liberta e encontra a luz. Eu sei, o mito de Platão é metafórico, mas às vezes a gente sente a coisa ao pé da letra. Passe uns dias de chuva em Hue e veja se não.
A caminho da simpática cidadezinha de Hoi An, aqui perto, faríamos antes uma visita nas chamadas Montanhas de Mármore (Marble Mountains).
Ou Ngũ Hành Sơn em vietnamita, o que literalmente significa “montanhas dos cinco elementos”. Lembrando-lhes que, na cosmologia tradicional chinesa e vietnamita, há cinco elementos da natureza em vez de quatro: água, terra, fogo, madeira e metal.



Esta região recentemente caiu nas graças do Instagram devido a uma foto da Ponte Dourada (Golden Bridge), inaugurada em 2018 por um resort numa outra colina aqui perto.
Muita gente viaja à Tailândia, acha parecido, e supõe que se tratam das mãos de Buda, mas isso é imaginação. (Você dificilmente se lembrará de ter visto qualquer imagem do Buda com essas mãos assim.)
Não há definição oficial sobre “De quem é a mão?“. A única descrição que encontrei sugere que sejam as mãos do espírito-deus dessa montanha. A religiosidade no Vietnã é assim, naturalista.

Os vietnamitas não são majoritariamente budistas, embora haja budistas por aqui. A maioria dos vietnamitas (70-75%) se declara “sem religião”, o que não quer dizer que sejam ateus, mas sim animistas. Ou seja, creem em espíritos da natureza.
Como na China, a grande maioria das pessoas aqui segue uma mistura à là volonté de princípios confucionistas, budistas ou taoístas — aqui chamados de “os três ensinamentos”, ou tam giáo em vietnamita — junto com uma série de práticas tradicionais, como os incensos, as oferendas, e a reverência aos ancestrais. (Na minha ida a Hong Kong eu tratei sobre como são tais práticas lá na China. Aqui no Vietnã, é semelhante.)


Os dragões, ao contrário de como são vistos no Ocidente, aqui representam nobreza e magnanimidade.
Os vietnamitas têm, inclusive, muitos dizeres com dragão no meio. Por exemplo:
“Cabeça de dragão, rabo de camarão” (Đầu rồng đuôi tôm). Quando uma coisa começa boa ou bonita e termina ruim ou feia.
“Um dragão visitando a casa do camarão” (Rồng đến nhà tôm). Usado para destacar aomildade (sic) de um anfitrião que se diz indigno da honra de receber tão ilustre visita. (Use com a próxima pessoa que lhe fizer visita e assista à reação da pessoa. Diga que no Vietnã se fala assim.)

A forma mais habitual de visitar estas Montanhas de Mármore é com algum tour que o traga aqui. Se você fizer o trecho Hue — Hoi An (muito comum entre turistas e com saída todos os dias), parte deles se detêm um tempo aqui para a visita. Você arranja de véspera com sua acomodação; não precisa reservar nada pela internet.
Há um preço módico de entrada aqui se você quiser usar o elevador, disponível pra quem não quer ou não pode subir a longa escadaria ao alto. Há mais escadas lá em cima, porém menores.

O ambiente nestas montanhas e cavernas, aí sim, é bem budista, mantido pela minoria budista no país. Apenas 13-15% dos vietnamitas declaram seguir essa religião, embora algo da sua estética, princípios e valores estejam já difundidos sociedade afora.
O monge e escritor Thich Nhat Hanh (tenho um trabalho danado para escrever corretamente este nome…), por exemplo, é nativo desta região do Vietnã. Ele tem muitos livros publicados internacionalmente, inclusive no Brasil, sobre o chamado “budismo engajado“, algo mais socialmente presente que o budismo de butique importado pelos norte-americanos e focado só no melhoramento individual.
Se vocês gostam da temática, é só procurar os livros dele. Um dos mais famosos foi traduzido no Brasil como “Sem lama não há lótus: A arte de transformar o sofrimento“, pela Editora Vozes.



Só para constar, eu não cheguei a ver propriamente mármore (polido) nestas montanhas. Elas ganham esse nome porque suas formações rochosas assim são, mas não espere encontrar aqui nenhuma lustrosa igreja italiana com mármore reluzente.
As formações aqui são bastante rústicas, e o encanto é exatamente esse. Por dentro dos meandros, no seio das rochas, cavernas onde se encontram imagens de Buda ali postas como se fossem figuras humanas reclusas e em meditação.
Por alguma razão, vê-las aqui neste ambiente as faz parecer quase vivas. Dão a impressão de que uma se dirigirá a você a qualquer momento, quebrando o silêncio das pedras e goteiras na caverna.





A quietude reconfortante, curiosamente, se contrasta com a sensação de que você está tudo ali, menos sozinho.
Do lado de fora, em alguns jardins, finalmente as flores de lótus em diversas cores se abriam, elas que simbolizam o desabrochar também da alma nas religiões orientais. Escolha a sua favorita.



O lugar é todo muito agradável, aquele ambiente natural tranquilo entre as plantas, rochas, e templos.


Esta foi uma parada curta. Vistas as lótus, seguíamos o nosso caminho para a cidade antiga de Hoi An, à beira-mar.
Uaaauu que natureza maravilhosa, pujante, arrojada, magnifica. Uma beleza. E que maravilha de templos, de arquitetura, de significação cultural e religiosa. Soberba manifestação cultural integrada à maravilha da natureza; Belíssimo sitio. Parece mesmo habitado pelas criaturas ali representadas. A força e grandeza da natureza parecem torna-los vivos. Muito interessante. Apesar de não apreciar cavernas, não se pode deixar de perceber as belezas nelas existentes. Preciosa a postagem e belíssima a região.
O senhor, meu jovem, como sempre parece perfeitamente integrando à paisagem hahah. Parece parte dela .
Respondendo à sua pergunta quero elogiar a beleza e a delicadeza das lotus e lhe dizer que prefiro a rosa, claro com suas belas folhas verdes, as cores da Estação Primeira de Mangueira, que creio que o senhor sabe, é uma das mais antigas e belas escolas de samba das favelas do Rio de janeiro, vencedora de muitos carnavais e que hoje veio para a Sapucaí, que é um sambódromo, com um polêmico enredo sobre um ”Jesus da gente”, representando o Mestre Jesus pobre, preto, favelado e injustiçado.
Amei a postagem e a região. Bela a ponte com as mãos do deus natureza. Muito sugestiva e adequada.
Obrigada por mais uma mostragem das belezas da Ásia, uma região para la de charmosa e interessante.