Phnom Penh pode não ser o coração turístico do Camboja (este seria Siem Reap, com suas ruínas de Angkor), mas talvez exatamente por isso surpreenda tanto os turistas.
Um belo palácio, pagodes e templos no meio da cidade em linda arquitetura tradicional… Eu próprio fui surpreendido. A maioria das pessoas nem sequer sabe o nome da capital cambojana, então ei-la aqui finalmente lhes sendo apresentada.
Phnom Penh (ou “Colina Penh”) foi fundada em 1372 e se tornou a capital dos cambojanos em 1431, quando o Império Khmer ruiu. Com Angkor conquistada pelos vizinhos tailandeses no século XV, os líderes cambojanos fugiram cá mais para o sul.
Aqui é onde alguns dos principais rios do Sudeste Asiático se encontram, dentre eles o famoso Rio Mekong. Este sempre foi portanto um importante porto de comércio. Hoje, Phnom Penh é uma metrópole de 2 milhões de habitantes, úmida e quente feito cidades de latitude parecida no Brasil — Salvador (BA) ou Palmas (TO).



Apesar da semelhança climática, o subdesenvolvimento aqui excede aquele encontrado no Brasil. A violência não excede (só em períodos de guerra é que os asiáticos soltam os bichos), mas a pobreza, sim. Faz parte da realidade do Camboja.
Um pouco como no Brasil, você vê ruas comerciais repletas de camelôs, gente ambulante, alagamentos… e tudo aquilo lado a lado com prédios vistosos, feitos com o dinheiro que a maioria não tem. O Brasil é mais desigual (tem mais riquezas), mas o Camboja é mais pobre.

Contrastando com essa pobreza e a simplicidade geral do lugar, aqui não são tanto os prédios residenciais chiques, nem um centro financeiro, o que mais chama a atenção. São os monumentos religiosos e o Palácio Real. (Sim, o Camboja tem rei.)
Eu cheguei aqui à cidade num fim de tarde, após uma viagem de ônibus relativamente tranquila — ainda que ligeiramente perturbada por visões dos cambojanos comendo insetos e aranhas fritas no óleo.
Meu hotel era um pequeno prédio com jardim tropical, como mostrei acima. Uma varanda aberta onde tomávamos café da manhã (não, não tinha animais fritos no café da manhã). Um lugar bom, embora — como não é raro aqui no Sudeste Asiático — com funcionários jovens ligeiramente atrapalhados, feito estudantes num estande de feira de ciências.
Eu estava relativamente bem centralizado, com o centro da cidade ali à minha porta. Vamos dar uma volta para conhecer seus pontos principais.


Você em Phnom Penh se desloca numa combinação de pernas e tuk-tuk. Os tuk-tuks estão por toda parte, a cada esquina acenando para a sua cara de turista a perguntar se você não deseja uma corrida. Às vezes tive a impressão de que ser motorista de tuk-tuk aqui é para os homens de baixa renda o ofício-de-prontidão correspondente aos milhares de brasileiros que, em tempos de crise, viram motoristas de Uber. Só que aqui a coisa é um tanto mais “povo”.
Os tuk-tuks são baratos. Você negocia o preço, tudo em dólar, usado aqui corriqueiramente enquanto a desvalorizada moeda (o riel) local serve só como trocado.
Eu vagava pela cidade à deriva, andando aos lugares até ter me distanciado quilômetros demais do hotel, para daí então tomar um tuk-tuk de retorno. Fica prático.






Logo perto do meu hotel eu avistei e me aproximei de um templo budista — altos e coloridos como eles são aqui no Sudeste Asiático. Senti logo o naipe das ruas que me esperavam. Este templo, o Wat Langka, era uma ilha de tranquilidade.




O contraste entre céu e terra se fazendo presente assim na nossa cara me fez lembrar Luang Prabang, no vizinho Laos. A tônica é parecida, embora Phnom Penh tenha estas suas dimensões metropolitanas de capital.
Aqui perto, à saída do templo, estava o Monumento à Independência — e foi quando eu me dei conta de que, “peraê, esta cidade tem um certo porte“, ainda que eu praticamente nunca tivesse ouvido dizer nada a seu respeito.








Eu lhes disse que o Camboja tem rei, embora seja um arranjo sui generis em que o rei é eleito, em lugar de ter sua coroa automaticamente herdada de família. Porém, quem governa de fato é um primeiro-ministro, como em outras monarquias parlamentaristas.
Antes de eu ir lhes mostrar o Palácio Real, vale a pena uma breve explicação sobre a História política do Camboja em linhas gerais, para quem se interessa.
Este povo foi um poderoso império na Idade Média, o Império Khmer, do qual falei bastante anteriormente. Ele prosperou entre 802 – 1431 d.C., quando em declínio interno e sob pressão dos vizinhos tailandeses entraram num período de baixa. Nos idos de 1850, pediram proteção aos prestimosos franceses. Foi tipo pedir ajuda à máfia.
A França imperialista de então, encantada pelas ruínas de Angkor, decidiu que se era supostamente para o bem de todos e a felicidade geral da nação, ela ficava. Os europeus viviam aquela era em que achavam, muito convenientemente, que colonizar os outros povos, roubar-lhes a liberdade e explorar para si suas riquezas era uma missão civilizatória — o chamado “fardo do homem branco”.
O Camboja oficialmente se tornou protetorado francês em 1863, e assim o foi até 1953. A monarquia, contudo, permaneceu desde os tempos dos Khmer medievais e segue presente todos estes séculos. Ainda que nem sempre tivesse poder de fato, o rei aqui sempre foi uma figura simbólica de muito respeito, como na vizinha Tailândia.
O grande catalisador das independências na Ásia foi o Japão, ainda que com intenções nada libertárias. Pelo contrário: sua intenção era ele próprio ser a potência imperialista daqui, numa versão regional da famosa Doutrina Monroe: “a Ásia para os asiáticos”.
(Originalmente, essa doutrina política adveio do presidente estadunidense James Monroe, que em 1823 se opôs ao colonialismo europeu e determinou “a América para os americanos”. Viriam então os EUA a se tornar a potência a projetar seu poder sobre o continente. Os japoneses quiseram fazer o mesmo na Ásia no começo do século XX, colonizando Taiwan e a Coreia por muitas décadas. A partir dos anos 1930, tentariam ocupar a China e, com a Segunda Guerra Mundial, também a Indochina.)

O Japão na Segunda Guerra Mundial invadiu e tomou para si as várias posses europeias na Ásia. Quando a guerra acabou, os japoneses derrotados foram expulsos, mas as ex-colônias já não queriam mais retornar à chibata dos seus antigos mestres europeus.
O Camboja obteve sua independência junto com o Laos e o Vietnã em 1953 após a chamada Primeira Guerra da Indochina, em que a França por quase 10 anos trouxe seus exércitos de volta e tentou retomar o controle.

Estabeleceu-se um Camboja independente, e dentre outras medidas o rei deu fim ao uso do alfabeto latino na língua khmer (algo que no Vietnã, ao contrário, segue mantido).
Das tensões que permaneciam no ar internamente, da Guerra Civil Cambojana (1967-1975) e do brutal regime Khmer Vermelho (1975-1979) eu tratarei no post seguinte.
Por ora, basta saber que em 1993 o Camboja adquiriu sua constituição atual de monarquia eletiva e eleições democráticas. OK, não é assim tão democrático: o mesmo primeiro-ministro (o senhor Hun Sen) segue desde sempre no poder, pois seu partido sempre ganha.

(Olha a cara do malandrão. Aí eu tenho que aguentar conversa sobre corrupção ser particularidade do Brasil, ao contrário do mundo “lá fora”. Ou sobre um suposto “privatismo” brasileiro herdado dos portugueses e supostamente distinto das outras culturas. Foram teses provincianas de pensadores de sofá que, francamente, pouco ou não vieram cá fora conhecer o mundo como ele é.)
A eleição do rei cambojano é feita por um Conselho Real do Trono, e o monarca é sempre escolhido entre membros dignos de duas famílias cambojanas de sangue real.
O rei atual acontece de ser filho do rei anterior (o “pai da independência, integridade territorial… cuja estátua eu mostrei acima). É… Politicamente, nada de muito novo no front oriental. Ao menos as pessoas agora não estão mais se matando como há algumas décadas. O Camboja está mais paz e amor, se não democracia.




Dada a sua beleza arquitetural, o Palácio Real funciona claramente também como atração turística. Você pode bem passar um par de horas navegando aqui suas áreas e adentrando os templos.
Como na Tailândia, não estamos realmente num Estado laico. O budismo (de linha Theravada, a mesma do Dalai Lama) se mistura claramente com o governo, então há belos templos a ver aqui.





O pagode de prata nem é realmente um pagode nem tem aspecto de prata. Em verdade, nem é esse o seu nome.
“Pagode de Prata” foi o apelido dado pelos franceses, que pegou pela simplicidade. Seu nome oficial é Wat Ubaosoth Ratanaram, ou ainda Wat Preah Keo Murakot, ou Templo do Buda do Cristal de Esmeralda. (Eles aqui são pomposos nos nomes. Não confundir com a Tábua de Esmeralda que, segundo Jorge Ben Jor, foi Hermes Trismegisto que escreveu.)
A prata está no interior do templo, no chão. Seu piso são lajotas prateadas verdadeiras, embora hoje em sua maioria cobertas por tapetes para protegê-las do pisoteio. Eles não permitem tirar fotos do interior, mas lá há também um Buda de cristal verde que dá nome ao templo e outro, de ouro com mais de nove mil diamantes, elaborado pela realeza cambojana em 1907. Viva o luxo.
É tipo a Idade Média, meus queridos, o povo vivendo mal e as riquezas dentro dos templos.
Mas que os templos são bonitos, são.



Esse esplendor arquitetônico dos pavilhões contrastam com a cidade do povão, como disse no início.
Eu no dia seguinte retornaria a dar minhas voltas à beira do rio, vendo-o tão escuro, certamente poluído. Foi aquela visão de pobreza molhada que chega a dar uma agonia na pessoa.
Desculpem-me lhes mostrar, mas é que seria desonroso da minha parte se eu fizesse como a Prefeitura de Pequim e escondesse os pobres.


À orla do rio, fui parar num simpático café-butique filantrópico chamado Filhas do Camboja (Daughters of Cambodia), uma organização beneficente voltada às vítimas de tráfico de mulheres para prostituição. Ocorre muito às cambojanas. O café é um lugar simpático onde você aprende mais sobre o trabalho dessa organização, come um doce, e pode adquirir alguns dos souvenirs sobre liberdade e direitos.

Eu fui parar também no Mercado Central (Phsar Thmei), pois mercados centrais sempre dão um pouco da alma de uma cidade. Aqui em Phnom Penh, ele é menos um feirão e mais um mercado de artesanatos. É aonde vão turistas buscando souvenirs.



Eu gostei de olhar. Circulei, rodei, virei, mas a única compra que fiz acabou sendo de uma bobagem para consumir na hora…

Eis aí um pot-pourri do que é Phnom Penh nas suas diversas facetas.
Estejam apresentados, mas eu retorno no post seguinte para mostrar mais alguns pontos históricos da cidade e completar a andança pelo Camboja.

Linda, essa capital. Um belo calçadão, uma bem cuidada orla com banquinhos para sentar e apreciar a natureza, o verde e o movimento , um formoso e possante rio, apesar das águas barrentas, uma linda, ampla e bem arborizada avenida, muito verde, esbeltas palmeiras, recantos agradáveis e acolhedores, exuberante tropicalidade, magníficos templos, belíssimo palácio com seus belos e decorados jardins, gente alegre, participante, ruas e avenidas cheias de pessoas, crianças, enfim, apesar dos bolsões de pobreza e das visões de abandono e vulnerabilidade, tudo muito bonito.
Encantei-me com o palácio, seus jardins e linhas arquitetônicas. Adorei os tons e cores. vibrantes e alegres. Os templos são de uma beleza e riqueza de detalhes estonteantes. Essa arquitetura é um espetáculo. Magnifica. Adoro esse tom laranja com verde. Linda combinação. As bandeiras cambojanas dão um toque especial de graça, colorido e beleza. um espetáculo. Linda a Árvore do Viajante.
Belas e ajardinadas praças. Com direito a aves por perto. Lindas.
Esse mercadão é um show. Bem arrumado, limpo, cheio de luzes, de gente bonita, produtos bem apresentados, parece um shopping Center.
Muito bem. Bela cidade e linda postagem. E o senhor é culto para sua juventude, meu amigo. Até Casimiro de Abreu, poeta brasileiro, que lembrava num belo poema seu 8 anos, foi citado ai em meio” à tarde fagueira” só não havia laranjais ai.. Por isso o senhor não completou os versos hahaha
Gostei bastante do Camboja e da sua capital. Merece. Achei mais bonita que Bangkok, capital da Tailândia que vi aqui em uma das viagens do senhor.
É de se lamentar esse desempoderamento da população, essa desigualdade que é uma enfermidade gritante também aqui no Brasil. Uma doença crônica do capitalismo de periferia onde uns ganham tanto e a maioria nada tem. Padecemos desse mesmo mal, meu jovem amigo viajante.
Muito triste ver as pessoas sem o mínimo necessário para uma vida digna. Ainda bem que a violência ai é menor. O Brasil aqui padece dessa outra doença da violência generalizada, em particular em relação à mulher. Por falar nisso muito interessante essa iniciativa de ajuda às mulheres vitima de tráfico e envolvidas pela prostituição muitas vezes forçada. É uma outra triste realidade. Cafeteria simpática. Parece ser um bom trabalho.
By the way, muito interessante a foto de um Buda, um Iluminado e do Mestre Jesus, outro Ser de Luz, no mesmo outdoor. Aprecio essa tolerância e intercambio religioso. Muito bom. O Céu e a Terra agradecem hahah.
Muitos bons comentários e histórico, como sempre. Prazer em conhecer Phnom Penh, bela capital do também interessante país Camboja.