A Guatemala, na América Central, ainda não é assim um país muito cotado pelos turistas brasileiros. É mais daqueles países que se sabe que existe, mas do qual pouco ou nada sabemos a respeito.
Uma limitação a ser tratada com urgência, pois como vos mostrarei, este país é fascinante. Tanto por sua natureza quanto pela tradição cultural de forte raízes indígenas.



Esta viagem pelo país, e a minha impressão da Guatemala, conseguiam melhorar continuamente conforme a viagem progredia. Então não reparem na modéstia desta capital, a minha primeira parada.
As autoridades imigratórias guatemaltecas são um pouquinho descabidamente chatas, mas prometo-lhes que isso não é representativo do geral das pessoas daqui.
Eu chegava de ônibus, num TicaBus vindo de San Salvador, no país vizinho. A capital de El Salvador está a 240 Km da Cidade da Guatemala, e em algumas horas você faz o trecho na boa Rodovia Pan-Americana.
A sala de espera da companhia TicaBus em San Salvador parecia um daqueles consultórios médicos semi-populares no Brasil. Ar condicionado tocando o pau, cadeiras alinhadas daqueles assentos grudados uns nos outros em fileira, um dispensário de água mineral daqueles de galão, e pessoas com os olhos vidrados numa televisão que mostrava bobagem.
Víamos, neste caso, clipes latinos Telehit, estilo reggaeton ou coisa parecida. Aqueles arquétipos latinos modernos da mulher sensual e empoderada — mas que, apesar desse “poder”, continua à sombra do homem e obrigatoriamente sensual, para ele. E dos caras tiradões, de boné, óculos escuros, correntes em volta do pescoço e, às vezes, tatuagens — este perfil que adotou Enrique Iglesias depois da sua fase romântica, para criar uma identificação com o público latino-americano e vender mais, o que tem funcionado — mas atento aos valores tradicionais, como o casamento, a devoção religiosa e à família, etc. Aquela mesma estética Despacito, uma versão dançarina e mais cool do estereótipo do mexicano brabo.
É curioso assistir aqui a como esse híbrido latino-estadunidense, meio Miami, se faz presente na América Central lado a lado com a raiz indígena popular. No caso da Guatemala, a raiz indígena é visivelmente mais presente que nos países centro-americanos vizinhos (El Salvador e Honduras).

Falando em dinheiro, eu inicialmente estivera preocupado se o nosso ônibus não seria assaltado na estrada.
Ruben, meu recepcionista do hostel em Cartagena, na Colômbia, me havia no entanto dito com certa segurança que os maras, as gangues salvadorenhas, evitam esses incidentes envolvendo passageiros estrangeiros. “El TicaBus lo respetan“, veio a me dizer com certo divertimento, ele que já havia morado por aqui.
De fato, não houve incidentes, e durante o dia não costuma haver.
A minha única surpresa foi o oficial de imigração guatemalteco, um senhor com cara de funcionário público veterano, que quis ver minhas reservas de acomodação e a passagem de saída do país para me deixar entrar. Isto é comum em aeroportos, mas algo raro em fronteiras terrestres.
Eu tinha as acomodações reservadas (embora um roteiro que seria alterado no decorrer da viagem), mas não tinha ainda nenhuma passagem de saída da Guatemala, que se daria de ônibus para Honduras uma semana depois. Nem tudo se adquire pela internet.
“O, se me muestra una tarjeta de crédito, está bien“, interpelou o próprio senhor novamente nos dois segundos em que pausei para ver como lhe responderia que não tinha ainda passagem de saída.
Por sorte, eu tinha comigo cartões de crédito, que mostrei e ele se contentou. Fui o último a me juntar novamente aos demais passageiros do ônibus que já me aguardavam do outro lado.
Dali em diante, tudo seria tranquilidade. Até o taxista que me levou do terminal TicaBus na Cidade da Guatemala não tentou me enrolar (!), e ainda me ajudou a encontrar o endereço sem cobrar mais por isso.

Christian, o taxista, baixinho e de bigode, parecia um figurante de Chaves com sua cara redonda de índio mexicano (guatemalteco neste caso) e jeito risonho.
À pousada, uma senhora também baixinha e de óculos me recepcionou, destas senhoras que conversam. Ali ao lado, passando um pano no chão, a faxineira era uma recatada redondinha, com rosto e cabelo de índia, e saia longa colorida.

Não demorou demais a chegar Luís, o dono, um senhor de seus 50 anos, daqueles de raciocínio afiado — com a auto-confiança que gente rica tem — e que às vezes olha você por cima dos óculos quando se põe a explicar algo. Descobri que a senhora conversadeira que inicialmente me recebeu era a mãe dele.
Minha primeira ventura às ruas da Cidade da Guatemala foi, em verdade, uma missão. Eu precisava adquirir quetzales, e neste país não parece haver casas de câmbio.
Ou se faz câmbio clandestino com cambistas de rua (inclusos aí os riscos de te passarem a perna com dinheiro falso etc.), ou em algum banco em horário bancário, o que já não era mais o caso. O jeito foi então sacar quetzales no caixa automático. Luís me indicou um — a um par de quilômetros dali — que seguramente aceitaria meu cartão estrangeiro.
Você pode usar dólares aqui e ali (taxistas aceitam, como Christian aceitou os meus, e hoteis e outras gentes que trabalham com turismo em geral também), mas não recomendo fazer isso por muitos dias, pois você ficará limitado (há muitos lugares que não aceitam, como no Transmetro, o principal transporte coletivo da cidade) e você perderá dinheiro pois farão sempre conversões que lhe serão desvantajosas.
De quebra, no caminho parei para comer naquele fim de tarde.



A Cidade da Guatemala pode não ser exatamente uma cidade turística, mas ela tem suas modestas atrações. Uma delas estava aqui bem perto de mim: uma maquete em alto-relevo de todo o país feita há mais de um século, em 1905, por um entusiasta da cartografia.



Enquanto que o interior da Guatemala é repleto de pitorescos lugares naturais e históricos, a capital é mais uma cidade “normal” latino-americana. Tem suas ruas feias e ruas bonitas, algumas avenidas agradáveis, prédios de época, algumas áreas mais seguras que outras, points de jovens, e uma praça principal onde estão a catedral e o palácio de governo.
Eu daqui tomaria o bom serviço do TransMetro para chegar rapidamente até o centro pela bagatela de 1 quetzal. Trata-se de um sistema de BRT, inclusive com veículos fabricados no Brasil, e que —ao contrário da maioria dos sistemas de transporte coletivo brasileiros — funciona bem, custando menos de R$ 1.



Talvez esta seja uma boa hora para dar um pitaco breve sobre a História da Guatemala.
“Guatemala” vem da língua náhuatl, dos astecas, Cuauhtemallan, que significa “lugar de muitas árvores”. Os astecas não viviam aqui — seu lugar era a região da Cidade do México, muito mais ao norte —, mas foram indígenas daquelas bandas que acompanharam Pedro de Alvarado e demais conquistadores espanhóis até cá. Como se sabe, os ibéricos usaram uma política de “dividir para conquistar” e a princípio fizeram alianças de conveniência com certos indígenas.
Aqui viviam povos Maya, divididos depois do esplendor civilizacional Maya do seu período clássico (250-900 d.C.). Como a Grécia antiga, esse não era um Estado unificado, mas cidades-estado dentro de um caldo cultural comum.
Quando os espanhóis chegam aqui em 1519, encontram já povos de origem Maya disputando entre si neste sul da Mesoamérica. Aliam-se a uns, traem outros, e por fim instalam aqui a Capitania Geral da Guatemala. Esta pertencia ao Vice-Reinado da Nova Espanha, que era basicamente o México.
Se você quiser saber mais sobre esse período pré-conquista, pode visitar o Museu Popol Vuh aqui na Cidade da Guatemala, um dos melhores acerca da civilização Maya.


Foi dia 25 de julho de 1524, Dia de São Tiago (um dos 12 apóstolos), este já tão venerado pelos espanhóis na sua História medieval contra os mouros, que decidiram transformar a traída cidade Maya de Iximche em Santiago de Los Caballeros de Guatemala. E assim iam fazendo suas atrocidades humanas e destruições culturais em nome de Jesus.
Essa cidade, contudo, não era a atual Cidade da Guatemala. A capital mudou de lugar por diversas vezes devido a desastres naturais. Veio para cá apenas em 1776 após o dito Terremoto de Santa Marta (1773) devastar a capital anterior, uma pitoresca cidade colonial atualmente conhecida como Antígua Guatemala, que eu visitaria a seguir.




Esse palácio ligeiramente esverdeado recebe hoje a respeitosa alcunha popular de El Guacamolón, em honra jocosa ao tradicional prato local de abacate amassado (guacamole).
Ele já não é mais sede de governo, mas — tal como em San Salvador — foi transformado em espaço cultural.
Pouca gente sabe, mas a América Central já foi uma República Federal da América Central, entre 1823 e 1841. Ela incluía, ademais, o estado mexicano de Chiapas. A capital era esta aqui, a Cidade da Guatemala.
Foi daqui da Cidade da Guatemala que, em 1821, toda a América Central declarou independência da coroa espanhola. Mas o século XIX seria difícil para esta região, com muitas tensões internas e externas.
Não foi pequena a interferência estadunidense, inclusive de aventureiros — como o flibusteiro William Walker — a se aproveitarem de discordâncias internas para saquear ou até tentar fundar aqui uma colônia anglófona, como pretendeu esse senhor.
Esse nativo do Tennessee, com seus mercenários, chegou mesmo a usurpar a presidência da Nicarágua em 1856 e a presidir por um ano, até que em 1860 seria capturado e executado pelos hondurenhos.


Como eu não fico só nos glamures e gosto de comunicar a realidade na sua inteireza, lhes mostro também umas voltas que eu daria por partes populares da cidade no dia seguinte.









A capital pode não ser ela própria a Guatemala de raiz, mas desde aqui eu já via esta mistura de História colonial — das construções do século XIX ao evangelismo popular do século XXI — sobrepondo-se à matriz indígena que estava aqui antes, e que neste país segue bem viva.
Eu ainda provaria umas guloseimas pela rua, batendo papo com um e outro, como essa senhora.

A graça de viajar pela América Latina são as pessoas.

Apesar da má fama centro-americana, achei as ruas da Cidade da Guatemala mais seguras que as do Brasil. Ou menos inseguras. Você detecta bem quais são as áreas “esquisitas”, como diz um amigo meu carioca.
A cidade pode não ocupar muito na agenda, pois é Antígua a parada obrigatória neste país. Para lá eu iria, mas não sozinho. Uma amiga italiana estava por chegar. A esta altura eu tinha tido meu primeiro contato com a simpática Guatemala.




Vista esta capital simples, hora de ir ao interior.
Ihhh que bela capital, com sua ampla e bonita praça, seu monumental Palácio esverdeado, que os raios do sol parecem amarelar, com sua requintada arquitetura. Um espetáculo. A catedral é outro destaque . Um primor. Belíssimas as linhas.
E que ares agradáveis tem essa cidade !.. Arborizada, com suas belas e floridas ruelas, suas charmosas e elegantes construções de época, com arcadas,balcões, partes levadiças entre as ruas, seus tons queimados, locais amplos, muito verde nas cercanias, bem cuidados jardins e por ai vai.. Curioso esse mapa da Guatemala. Criativo e diferente.
Adorei a bela paisagem. De filme mesmo. E o guatemalteco honoris causa… Olhe que o senhor me inventa cada uma hahaha. Linda paisagem. Parece das ilhas gregas.
Ora ora, o senhor tem sangue indígena heimmm? que beleza. Há mesmo muitas pessoas com sangue indígena no pais inteiro. Muito interessante. Assim pode perceber com mais propriedade sua influencia e cultura. Tenho muita simpatia pela causa indígena.
Que riqueza de produtos da terra e de comilanças. Este é um dos pontos altos e fortes da latinoamerica, farta de produtos saborosos, vistosos e naturais. E viva a influencia índia, autóctone de latinoamerica..
E que maravilha parece ser esse Tamal. Um abará de milho haha. Uauu. E o senhor como bom latino e nordestino não deixa passar a oportunidade de experimentar e se deliciar com as iguarias. Pelo visto é um dos itens dos quais o senhor não abre mão nessas aventuras haha. Está certo o Senhor, meu jovem. Parecem ser maravilhosas. Aqui no NE do Brasil há muitas frutas semelhantes a essas ai. E algumas comilanças parecidas embora com outros ingredientes e às vezes de outras origens, como é o caso aqui do abará que é cozido em folha de bananeira, mas parece ser de origem africana (?) e com dendê e feito com feijão fradinho.. E que belos abacates. Aqui também há inclusive uns com pescoço. E que apelido para o verde Palácio hahaha. Adoro abacate.
Meu amigo, que beleza, que riqueza de produtos e de cultura !… Esse Mercado é simplesmente fantástico ! … maravilhoso!… quantos produtos, verduras, frutas , raízes, folhas etc e tal… Quanto coisa bonita, boa, saudável, natural, nesses mercados e embaixo dessas arcadas vendidas por gente do povo com suas belas roupas de um colorido maravilhosos. São de encher os olhos. Beleza de cultura. Um encanto.
Aconchegante essa sua acomodação. Lindinha Amei a pousada. Adoro essas acomodações assim, simples com pátios, plantas. Uma graça.
Achei essa praça principal ajardinada linda. E a catedral com sua bela cúpula azul e dourada um monumento.
Belíssima essa foto do senhor de braços abertos em meio à praça, com o portentoso Palácio Nacional ao fundo. Maravilha.
Uma agradável e surpreendente descoberta: A cidade da Guatemala, capital da Guatemala . Uau. Gostei. Valeu, joven viajero,
boa tarde , meu sonho de consumo é conhecer a guatemala, gostaria se possivel receber dicas de hospedagem, ,e quanto mais ou menos gastaria para passar uns 10 dias na guatemala entre passagem , hospedagem e comida,desde ja agradeço.
Eu entendo a lingua espanhola pouco.
Bem-vinda, Luciene! A Guatemala é um país fantástico!
A hospedagem sempre depende do seu estilo, se algo mais em conta ou com maior conforto. A cidade de Antigua, em especial, tem muitas opções super agradáveis. Isso também vai definir o preço das diárias e o orçamento para uma viagem de 10 dias. Quanto às passagens, às vezes sai mais em conta voar para San Salvador, em El Salvador, país aqui vizinho, que vir direto à Cidade da Guatemala.
Depende também se você está vindo sozinha. Se houver mais alguém, já dá para dividir as diárias da acomodação pela metade.
Eu recomento que você dê uma olhada também neste post com dicas gerais aqui sobre a Guatemala e os países vizinhos que visitei.