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Honduras

Legado Maya em Honduras: As Ruínas de Copán

Copán são as principais ruínas Maya em Honduras, país que hoje corresponde ao limite sul dessa civilização. Os Maya cobriram desde aqui até toda a Guatemala e a maior parte do sul do atual México, inclusa toda a Península de Yucatán.

Eles seguem vivos, como eu sempre relembro. O povo nessas regiões do México, Guatemala, e em certa parte aqui em Honduras, todos são essencialmente Maya. Não só no sangue, como nas tradições. Consideram-se Maya, e centenas de milhares ainda falam uma das 30 e poucas línguas Maya — uma família linguística.

Esta região da Mesoamérica está pontilhada de antigas cidades-estado Maya como Chichén Itzá, Uxmal e Tulum no México, ou Tikal na Guatemala, entre outras. Aqui em Honduras, é Copán a principal e mais notável de todas. E ela é especial de algumas maneiras.

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Peça histórica com hieróglifos Maya em Copán, Honduras. Boa parte deles vêm sendo decodificados, mas nem todos ainda.

Eu havia chegado à cidadezinha de Copán Ruínas, próxima da fronteira com a Guatemala, um dia antes, como narrei no post anterior.

A cidadezinha amanhecia nublada, ela assim batizada para diferenciá-la de outras próximas (San Pedro de Copán, Santa Rosa de Copán…). O sítio histórico é, naturalmente, a alma do seu turismo. Chega-se lá a pé em coisa de 15-20 minutos caminhando, mas há tuk-tuks vermelhos para quem preferir.

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A praça principal de Copán Ruínas numa tranquila manhã de fim de semana. Era sábado.
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Copán Ruínas, com seu centrinho, parece saída de algum livro histórico.

Se podem bem passar uns dois dias inteiro aqui com tranquilidade. À tarde e à noite aparecem muitas banquinhas, as mulheres a vender coisas caseiras e os homens, artesanias.  

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Mulheres hondurenhas com suas tipicíssimas feições indígenas a vender lanches na praça à tardinha. Milho assado e mais.

Elas, vós vedes, são prova aí de que os Maya não desapareceram — só saíram dos holofotes da nossa mídia ocidental que privilegia gente branca. Aqui na América Central, isso não é diferente.

Você passeia, sente aquele cheiro de milho assando no fim de tarde, e o frescor de região um pouco elevada. Aquele frescor que retornaria pela manhã, antes do calor do dia.

Fomos então ver o que seus ancestrais erigiram, mas não antes de tomar café. Hoje, excepcionalmente foram dois cafés da manhã, porque o da pousada de Fernando foi chinfrim — com uns ovos mexidos na água, aquela coisa insossa. 

O recheio? Pasta de feijão preto, creme de leite, ovos, abacate e queijo.

Passei portanto, antes de ir às ruínas, com minha amiga italiana numa bodega digna onde pudemos, ali sim, comer algo adequado.

Pedi logo algo típico: um par de boli baleadas, umas tortilhas de farinha de trigo fechadas sobre um recheio como um pastel. O recheio? Pasta de feijão preto, creme de leite, ovos, abacate e queijo. (Definitivamente, não é ético comer isso quando for viajar de carro com outrem.)

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O par de boli baleadas com generoso recheio.
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O cardápio, com aquele plástico já pegajoso. “Comer Bien para Vivir Mejor!“, leiam ali. Eu gosto de gente que entende das coisas.
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A bodega simples com sua estética tipicamente latino-americana. Seu colorido, TV, e galões de água mineral.

Minha amiga italiana não comeu nada, pois estava “baleada” por conta de umas frituras de rua da noite anterior. Fernando, da recepção, lhe recomendou um sal de frutas da farmácia com sua visivelmente ampla experiência em comes & bebes que às vezes passam da medida.

No estás bien, hm?“, olhava ele a minha amiga com aquela afeição latino-americana por detrás do balcão. Mesmo baleada a minha amiga, que depois se recuperou, não deixaria de ver Copán.

Recomenda-se visitar as ruínas preferencialmente pela manhã, por razões que vocês logo compreenderão.

Vamos a um breve pano de fundo histórico. Copán teve o seu esplendor durante os séculos V e IX d.C. Dizem que aqui já existia um povoado desde o dito Período Pré-Clássico dos Maya (1000 a.C. – 250 d.C.). Porém, foi a partir do século V d.C. que esta cidade ganhou notoriedade, após se formar aqui uma dinastia oriunda de Tikal.

Copán chegou mesmo a ter 20 mil habitantes, estimam os arqueólogos. Para efeito de comparação, se imagina que essa era a população de Atenas nos áureos tempos de Platão e Aristóteles.

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Construções Maya do primeiro milênio depois de Cristo, em Copán, Honduras.
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Edificações de pedra por entre as árvores.

As árvores, porém, não são as únicas companheiras naturais destas ruínas Maya…

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Olhem quem anda também por aqui.

Recomenda-se visitar as ruínas de Copán logo de manhã (umas 9h) porque é quando as araras estão mais ativas e presentes, antes de o dia esquentar muito.

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As araracangas, que mostrei também no post anterior, são símbolo nacional de Honduras. Elas são uma espécie nativa (Ara macao) das 17 que ainda há de arara no mundo (todas as Américas).
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As araracangas voam livres por entre as árvores das ruínas de Copán.

Ver essas belas aves circulando coloridas para lá e para cá dão um toque todo especial a Copán. Aqui pode não haver edificações tão imensas quanto aquelas de Tikal ou do México, mas as araras fazem a diferença.

Vê-las voar livres faz você se sentir em alguma ecotopia, n’alguma situação paradisíaca tirada de algum mito tropical.

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Araracanga solta me olhando.
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Um grupo. Elas na natureza em geral vivem em casal ou em pequenos grupos.
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Concordo que parece um quadro.

Copán é notável não somente pelas araras como também pela quantidade de hieróglifos Maya gravados na pedra.

Aqui, são muitas as estelas, nome que — na etimologia grega, diferentemente da latina (na qual significam estrelas) — refere-se a pedras erguidas verticalmente, quase como obeliscos.

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Uma milenar estela Maya em Copán. Este foi, senhoras e senhores, o rei Uaxaclajuun Ub’aah K’awiil, coroado aqui em julho de 695 d.C. Os Maya sempre foram bons de calendário, vocês sabem disso, e seus hieróglifos até hoje registram essas informações.
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Outra, num nicho.

Eu sei que essas estelas lembram sarcófagos, mas não o são. São marcos decorativos, históricos, e de homenagem a figuras importantes. Elas, em geral, contam com hieróglifos que relatam os feitos ou a época de governo daquela pessoa. São dedicatórias póstumas, por assim dizer.

A exceção é a notável Escadaria Hieroglífica, talvez a parte mais impressionante de todo o sítio. Ali são 63 degraus com mais de dois mil hieróglifos contando a História dinástica de Copán. Algo singular.

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A Escadaria Hieroglífica. Em mais de 2.000 hieróglifos Maya, ali se registrou a História de Copán no século VIII. (Está coberta para evitar deterioração.)
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Esta estela, que os espanhóis à época julgariam ser algum “deus pagão”, se crê ser a figura de um monarca Maya daqui. Um pouco como os europeus também representavam seus imperadores.
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A escadaria hieroglífica mais de perto em detalhes. Seu significado ainda está sendo decodificado.

No sítio como um todo, eu diria que se passam umas 3h de visita. Depende, é claro, também do seu ritmo.

Afora toda a área externa, Copán tem um diferencial de que aqui também é possível adentrar algumas dessas estruturas — à là Indiana Jones nas Américas.

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Arena do famoso Jogo de Bola dos Maya, no qual usavam uma bola de borracha (planta nativa aqui da América tropical) e dois times competiam.
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Das muitas rochas gravadas aqui com figuras algo sacerdotais, incluso alguém com a máscara nariguda do deus Chaac, da chuva.
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Olha o tamanho destas estruturas milenares. Por ali você adentra.
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Hieróglifos Maya no interior.
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Corredores.
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A chamada “Mascarona de Arara” (Mascarón de Guacamayo) esculpida. Isso tem mais de 1m de largura. As araras figuraram bastante na mitologia Maya.

O lado interno não é tão extenso, mas não deixa de dar uma sensação especial.

Para os que curtem os detalhes, vale a visita ao adjacente museu aonde foram levadas algumas das peças mais frágeis, e onde há também reconstruções imaginadas do que seria Copán na sua época.

O museu cobra um ingresso separado. (São USD 15 para o sítio como um todo e USD 12 para o museu. Eles aceitam pagamento em dólares ou em lempiras, a moeda aqui de Honduras.)

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A entrada para o museu em Copán.
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Aqui uma estela original, e ali em vermelho uma representação de como eram as estruturas à época, incluso com sua coloração.

Os Maya em geral recobriam suas obras de pedra com estuque (stucco), uma argamassa moldável de gesso, água e cal, que era então pintada. É o que você vê ali na foto em vermelho, verde e amarelo.

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Arara esculpida em pedra, e reconstituída.
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Escultura de um escriba Maya.
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Fachada de um templo. Aqui é reconstrução, para mostrar o desenho arquitetônico Maya.
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Como estamos na Honduras moderna, vi também estas figuras típicas no museu. (Daria para se fazer uma longa análise desta imagem.)
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Figuras Maya de outrora gravadas em pedra.

Faça-se saber que as mulheres tinham maior poder nas sociedades tradicionais Maya — ainda que estas fossem patriarcais — do que vieram a ter hoje, após séculos de influências ibéricas.

Existem cerca de 6 milhões de pessoas identificadas como Maya aqui Mesoamérica afora: na Guatemala, no sul do México, em El Salvador e aqui em Honduras. Há, é claro, um número ainda maior de pessoas mestiças. 

Jovens Maya na Guatemala
Jovens Maya em seus trajes tradicionais. (Foto de Eric Walter.)

Eis Copán, com suas lindas ruínas sobrevoadas por araras coloridas.

Eu me preparava para, já no dia seguinte, seguir caminho rumo ao sul em direção à Nicarágua, a conhecer outras bandas desta riquíssima América Central.

Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

One thought on “Legado Maya em Honduras: As Ruínas de Copán

  1. Uuuu.. que viagem linda. Cada postagem mais interessante que a outra. E as artistas principais belas coloridas, graciosas, e voando soltas , parece que o senhor encontrou o paraíso das araras na terra. Que espetáculo, surreal. Não imaginava que houvesse um lugar com tantas araras, tao belas e soltas assim,
    Ja havia visitado ha um tempo atras um sítio no Pantanal no MS mas era pequeno e elas estavam mais restritas em grandes viveiros. Esse parque ai é lindo. E elas soltas são um verdadeiro espetáculo.
    Belas essas ruínas. Soberbas e enormes. Os tons das pedras e a luminosidade criam efeitos muito bonitos. A vegetação continua linda, de um verde maravilhoso, e o azul do céu deixa o cenário encantador. Linda a relvinha que cobre parte dessa campo.
    Nossa!….. Quantos hieróglifos.quantas inscrições… Que belos monumentos.. Pensei que eram totens, esses monumentos compridos. E que escadaria bonita. Tudo muito bem preservado. Impressionantes essas inscrições na escadaria. E originais,
    Adorei o museu e achei belíssimas as demonstrações de como seriam os originais, A America Latina e suas cores lindas, fortes, como seu povo. Tudo muito bonito . Lindíssimas as cores. Gosto desses tons fortes e vistosos. Só não me agradaram as tocas parecendo as catacumbas de Roma haha.
    Que povo interessante. E as pessoas nem sabem que ainda existem e que são tao resilientes e mesclados hoje. Muito pouco se sabe deles. Apenas um pouco do seu legado. Povo bonito, simpático, de pele e cabelos lindos… Merecia maior visibilidade na História e no mundo atual. Que bom que essas viagens do senhor, meu jovem amigo, resgatam um pouco essas civilizações.
    E que fofura essa cidadezinha. Parece mesmo cinematográfica e saída de algum filme histórico. Linda. Gostei da limpeza e conservação tanto do parque quanto da cidade. Com ótima aparência.
    Quanto às comilanças e às bodegas, são uma onda hahah. Adorei a multiplicidade de idiomas na bodega. E, data vênia, permita-me dizer que achei muito prudente os cuidados éticos hahaha. Muito procedentes, tambem, hahaha.
    Mas que bela regiao. Fantástica. Rica de história, cultura e beleza. E pelo visto com uma certa conservação. Gostei. Que venham mais belezas.

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