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Tanzânia

No Parque Tarangire: Entre Baobás e elefantes na Tanzânia

(Este será um post longo.)

Bem-vindos ao Parque Nacional de Tarangire, o primeiro dos quatro que eu visitaria aqui no país. Ele possui a maior concentração de elefantes da Tanzânia. Foi, portanto, ocasião de aprender mais sobre esses majestosos animais, conhecimento que compartilharei aqui com vocês.

Também foi dia de ver incríveis baobás, árvore ícone da África juntamente com o ébano. Porém, enquanto o ébano (ameaçado de extinção) é valioso pela madeira, os baobás são algo mais simbólico. 

As pessoas tradicionalmente chegam mesmo a fazer oferendas e pedidos sob a copa de um baobá. Não é uma prática exclusiva dos africanos — os japoneses têm costumes muito semelhantes no xintoísmo, assim como os mongóis da Ásia Central, os indígenas das Américas, e todos os outros povos animistas do mundo. Só que aqui na África a natureza é africana.

Eu tenho um prazer imenso em finalmente poder contar mais deste continente tão rico e que as pessoas de fora ainda tão pouco conhecem. Acompanhem-me.

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Grande baobá em Tarangire. É uma árvore realmente diferente. Ninguém sabe ao certo quanto tempo são capazes de viver, mas algumas com mais de 2000 anos já foram documentadas. Note como até os elefantes ficam pequenos em comparação.
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Elefantes africanos em Tarangire. Uma mãe com um filhote e um sobrinho.

Oi? “Sobrinho”? 

Sim. Elefantas normalmente dão luz a apenas um bebê por vez — como os humanos. A gravidez dura dois anos, então a menos que os pequenos ali sejam gêmeos (o que às vezes ocorre, como na nossa espécie), eles são provavelmente primos ou companheiros de idade.

Os elefantes se organizam em grupos de fêmeas liderados pelas mais velhas, com uma matriarca. A partir dos 14-15 anos, os machos jovens começam a passar mais tempo longe da família e vão viver sozinhos ou na companhia de outros machos adultos. Olha que semelhança com a nossa espécie.

Diferentemente dos humanos, porém, os elefantes machos têm ciclos de pico de testosterona no sangue. Esses picos (chamados musth) tendem a ocorrer no inverno, quando a concentração do hormônio se multiplica por até 60 vezes(!)

Imagina a loucura? Eles ficam mais agressivos e vão se reproduzir. Visitam os grupos de fêmeas, que também têm seu ciclo menstrual como outros mamíferos, mas não permanecem para tomar conta dos filhos. Isso fica por conta da mãe, tias, avó, e outras mulheres do grupo. (Como nas famílias brasileiras.)

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Era uma manhã nublada em Arusha. Tarangire nos espera.

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As plantas que eu vira na noite anterior no terreno do hotel, hoje mostrando a poeira acumulada nas folhas e que parecia uma ferrugem. Lá fora por detrás dos muros, o mundo, um mundo empoeirado pela combinação de transporte motorizado e ruas de chão.
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Bom dia desde Arusha. Fica todo mundo achando que a África é permanentemente quente, mas fazia uns 14 graus aqui pela altitude de 1.400m, apesar de estarmos quase na linha do equador (a 3°S de latitude, a mesma de Manaus, mas sem nem sombra da umidade).
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As vans que fazem o transporte e a casinha de vender chip de celular, nos arredores de Arusha.
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Vamos para o centro. Eu tinha algo breve a resolver na cidade antes de rumarmos para o parque.
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Certa vez uma leitora me perguntou por que, em diversos países, há templos grandes onde nem mesmo há infraestrutura mais básica. Prioridades. Na Idade Média como atualmente.
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No centro de Arusha. Aqui à esquerda, uma mulher de burca. A Tanzânia tem cristãos e muçulmanos, mas depois mostrarei melhor a parte urbana e social do país. (Se você nem reparou que ali havia alguém, a burca cumpriu sua função de invisibilizar a mulher no espaço público.)

A minha breve parada aqui neste centro de Arusha foi para alterar uma passagem de avião, fruto do imbróglio com teste de Covid-19 no aeroporto de Estocolmo uns dias antes.

Eu precisei trocar a data deste voo doméstico como consequência. Liguei na central de chamadas da companhia aérea aqui da Tanzânia, e me disseram que havia uma multa de cerca de USD 10 pela troca. Tudo bem. Só que não poderia ser paga por cartão, ainda que eu o tivesse utilizado para comprar a passagem online. Pagamento só em espécie. (Valha-me…)

— “Você não tem alguém aqui na Tanzânia, que pudesse vir no escritório e pagar por você?“, perguntou-me pelo telefone o funcionário da companhia áerea.

— “Não“, respondi eu ao telefone ainda lá da Suécia. “Mas daqui a uns 3 dias eu vou estar aí“, completei, apostando que desta vez tudo correria bem e eu estaria mesmo. 

— “Eu vou transferir a sua passagem então, e quando você chegar, você vai ao escritório e paga. Você tem que pagar até domingo.

Demos um jeitinho. As pessoas fiquem aí na ilusão de que jeitinho é algo só brasileiro. (No Brasil, da próxima vez você tente dizer à GOL ou à LATAM que passa lá até domingo para pagar pessoalmente.)

Era sexta-feira, então eu fui “sextar” no escritório da Precision Air, pagar os tais USD 10 a essa aerolinha tanzaniana que às vezes zoam chamando de “Imprecision Air” por seus atrasos. Eu não experienciaria atrasos, mas rolou mesmo certa imprecisão no pagamento.

Quanto foi mesmo que lhe disseram que era para pagar?”, perguntou-me a jovem moça no escritório da companhia.

Eu, brasileiríssimo, nem pestanejei com essa de possivelmente reverem o valor da multa. Ele me disse tanto, e eu vou pagar aquele tanto. O valor é aquele.

Obrigado. Bom dia pra você.

Despedi-me das duas moças, carregando comigo o papel impresso com a nova reserva confirmada do voo — como é de praxe aqui na África, onde eles gostam de ver as coisas no papel. Dão-lhe um papel dobrado no envelope quase como era nos tempos dos carnês de passagem aérea dos anos 90.

No andar de baixo do prédio simples onde entramos, com dois lavabos improvisados à entrada para higienizarmos as mãos, meu guia tanzaniano cumprimentou novamente os jovens guardas mui armados — aquela turma de 20 e poucos anos e farda militar, carregando rifle, visão comum na África. Foram simpáticos, embora me parecesse que havia demais deles ali, uns 5-7 sem fazer nada, conversando entre si e prestando continência pra os conhecidos que entravam, naquele ar de brodagem.

Era hora de sair da cidade e tomar a estrada rumo ao parque. Eu voltaria a Arusha dali a uma semana após minhas expedições pelo interior. 

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O movimento na saída da cidade.
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O mercadão. Aqui, um barraca de roupas. O que a bela moça de vermelho levava na cabeça eu não sei, talvez mandiocas.
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Transeuntes, barracas, e bananas.
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O auê de motos, vans — com seus dizeres cristãos ou islâmicos — e o caminhar na beira da pista.
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Dentro do jipe vencendo o congestionamento.

Aí você veja que soa surreal — cruel — falar em “distanciamento social” com pessoas que vivem diariamente nessas condições. A polarização política se tornou tamanha no Brasil que muitas pessoas pararam de pensar: se você critica o isolamento como medida, está supostamente descreditando a ciência.

Eu sou cientista, mas percebo o quanto essa diretriz saiu de um escritório confortável em Genebra, sede da Organização Mundial de Saúde na Suíça, sem contato quase nenhum com a vida real de centenas de milhões de pessoas. Lockdown na China, onde as pessoas têm delivery de comida por aplicativo, ou na Europa com todos os confortos e wi-fi é uma coisa; em lugares mais pobres, a realidade é outra.

A gente aqui na África tem cólera, malária, ebola… você acha que Covid vai fazer muita diferença? Diferença ia fazer se trancasse o povo em casa.

Sistematicamente, impõe-se pensamento europeu sobre a África. Vocês ficam aí achando que o imperialismo acabou, ele só mudou de forma e de roupagem.

A gente aqui na África tem cólera, malária, ebola… você acha que Covid vai fazer muita diferença? Diferença ia fazer se trancasse o povo em casa. Não tem como; as pessoas na África vivem dia por dia“, diria-me depois um tanzaniano em Arusha no meu retorno.

Sem me estender demais nesse tema, mas se você acha que Trump e Bolsonaro foram os únicos polêmicos, é porque a mídia ocidental não cobre tudo. Houve o presidente da Bielorrússia sugerindo vodka e sauna como tratamento, e o presidente aqui da Tanzânia dizendo que as pessoas apenas orassem pois o coronavírus “não sobrevive no corpo de Cristo“. 

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Covidol, um tal coquetel de ervas que surgiu na África para combater a Covid-19. Não me perguntem sobre a eficácia.

Surgiu até mesmo um coquetel de ervas, dizem que inventado em Madagascar, e que circulou em partes da África. Apareceu fake news dizendo que o presidente da Tanzânia havia aprovado, o que depois se negou, e eu sei que os tanzanianos no geral ficaram à base de chá de alho. 

Limão, laranja, alho, gengibre, folha de mamoeiro e folha de nim“, uma árvore indiana que existe aqui, narrou-me meu motorista enquanto dirigíamos. Diz ele que o misturão fica amargo, mas que botou a família toda para tomar. (Fez até vídeo que me mostrou com as folhas fervendo na panela.)

Seja pelo alho, seja pelas orações, pelo ambiente ou pela genética, a África tem passado relativamente incólume pela pandemia. Nada da hecatombe que previam. Claro que morreram pessoas — oficialmente 21 na Tanzânia, número certamente subestimado; mas não haveria como esconder se fossem 500 ou 1000 por dia como no Brasil, ou com defuntos se acumulando nas ruas como ocorreu no Equador.

Aqui já ninguém usava máscaras. Apertávamos as mãos como em 2019, até que ao chegar a Tarangire você já não sabe mais que tempo é. Tarangire é atemporal, como os baobás.   

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Zebras a caminhar pelas planícies secas do Parque Nacional Tarangire, durante esta estação seca (julho a outubro). Em novembro, as chuvas retornam e verdejam a paisagem.
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Estouro de gnus correndo em direção à água.
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Grupo de zebras numa lagoa em Tarangire.
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Com um cupinzeiro maior que eu, na entrada do parque.

Eu depois tratarei melhor da logística, custos etc. com relação a como fazer um safári aqui na Tanzânia. Por ora, vale a pena apenas compreender um pouco da geografia e do arranjo da coisa, para ficar claro como estas visitas funcionam:

Safári significa “jornada” em árabe, a língua de muitos caravanistas e mercadores que vinham cá na Idade Média. Hoje, se tornou nome para um passeio de carro na natureza.

Você não sai caminhando pelos parques, por razões de conservação e também pelos riscos. Salvo raras exceções, você permanece dentro do veículo — geralmente uns jipes com teto que abre para cima. 

Você passa sempre por uma entrada com bilheteria, onde obtém o ingresso, ainda que os parques não tenham cerca e os animais sejam livres para circular ou sair. Eles, no entanto, preferem os ambientes sem humanos e portanto ficam no parque.

♣  Dentro dos parques há pontos designados onde se deter para comer, ir ao banheiro, etc. Não é permitido atender a esse tipo de chamado da natureza em qualquer lugar.

Há pousadas (lodges) tanto no interior quanto nos arredores dos parques, para a hospedagem dos visitantes. Eles têm cozinha, banheiro… tudo. Depois mostrarei. A quem for acampar, há espaços designados para camping.

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Os jipes de safári aqui na Tanzânia. Todos eles são praticamente idênticos, independentemente da empresa que você contratar.
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O interior do jipe, para vocês compreenderem onde estamos. Dá para ficar de pé aí (se você tiver menos de 2m de altura). Há espaço para seis passageiros — mas neste caso não havia outros. Na frente, o motorista vai do lado direito, pois aqui é mão inglesa. No banco do carona ia um baú de comidas para o dia, adquiridas sempre com a acomodação da noite anterior. As empresas de safári geralmente fornecem água à vontade, em garrafas plásticas que você deve levar de volta consigo.

Foram apenas umas 2h de estrada desde Arusha até aqui. A África tem dessas, a vida selvagem não está muito distante da vida urbana das pessoas.

Descemos à entrada do parque para Ally, meu guia e motorista, resolver a papelada, e eu fiquei a circular e ver os pássaros. Foi onde tirei a foto com o cupinzeiro. Como eu já havia pago tudo de antemão à empresa, aqui foi só aguardar o guia resolver os trâmites — coisa de 20 minutos.

As aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá no Brasil, nem como as da Europa. Achei fascinante ver pássaros que eu nunca antes havia visto.

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Pássaro azul-brilhante nativo da África Oriental. Não me consta que tenha nome em português (algum moçambicano nos informe se houver). Seu nome científico é Lamprotornis superbus. O superbus é mesmo pela cor soberba.
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Vê ali um pássaro amarelo e vermelho, meio pintado?
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Ei-lo, pássaro nativo também muito típico — e atrevido, chega perto sem pestanejar. Seu nome científico é Trachyphonus erythrocephalus.

Você não demora muito a se deslumbrar com a natureza africana. Eu a misturo com as pessoas porque o ambiente é todo um, uma coisa integrada. Tampouco admiro o esquema comum entre visitantes de países ricos de vir do aeroporto direto para cá e depois ir embora sem ter contato quase nenhum com as pessoas — como se quisessem ver a África sem ver os africanos. Mas entendo, pois a natureza aqui é mesmo bela.

O céu começava aos poucos a limpar naquele fim de manhã. O calor não era tanto, mas aumentava conforme o dia avançava. Lá pelas 10h, tirei minha jaqueta. A temperatura subia de uns 12ºC ao amanhecer a uns 26ºC à tarde, para com o pôr do sol despencar de novo.

A secura da estação era perceptível de todos os lados. O chão seco mostrava não ver chuva há muito tempo. As gramas e matos estavam amarelados, às vezes marrons. Os animais, já adaptados àquela secura sazonal, punham-se frequentemente próximos aos corpos d’água onde zonas mais verdes perseveravam.

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Zebras e gnus. Eles convivem bem uns com os outros, pois temem os mesmos predadores (felinos, crocodilos), e seus sentidos de percepção se complementam.
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Grupo de zebras “de boa”.

Você aí sabia que zebra late? Sim, um latido agudo que soa parecido com o de um cachorro de médio porte. Eu escutei, e achei que estava ficando doido. Achei surreal. 

O propósito, entretanto, não é o mesmo. Zebras não são carnívoras, são unguladas como os cavalos, e portanto seu latido não tem nada a ver com ameaça. Como defesa elas dão coice — e, diferentemente dos domesticados cavalos, não gostam muito de chamego de gente se aproximando. Esse latido faz parte de um universo de vocalizações e comunicação uns com os outros, e que ainda não se conhece totalmente.

Você talvez não imaginasse, mas este mundo da socialização animal ainda é relativamente pouco conhecido. Avançou imensamente nos últimos 50 anos, depois que caiu por terra aquela bobagem intelectualmente preguiçosa de que animal tem só “instinto” e não aprende nem comunica nada. Mas ainda estamos na ponta do iceberg no que se refere a cognição e comunicação animal.

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Zebra das planícies (Equus quagga). Esta é uma das três espécies de zebra que ainda há; as outras duas são mais raras. Todas são africanas e têm esse mesmo estilo listrado característico; as diferenças são mais de hábitat e de tamanho.

Os elefantes, então, são um mundo extremamente fascinante. Vivem até cerca de 70 anos na natureza, têm uma memória proverbial, e demonstram impressionante empatia para com os seus. Sofrem de estresse como os humanos (isso é medido com análise de substâncias no sangue, não muito distintas das humanas), velam seus mortos, podem ficar tristes e até deprimidos.

Essa acontece de ser uma área de meu interesse científico, e lhes digo que quando comecei a estudar o tema há quase 20 anos havia um tabu muito grande na comunidade científica acerca de se estudarem emoções — tidas como característica exclusivamente humana — nos animais. Era mal visto. Você era acusado de “antropomorfismo”, ou seja, querer ver coisas humanas nas outras espécies.

Mas quem determinou de antemão que essas emoções eram exclusivamente humanas? Isso foi um resquício de antropocentrismo religioso na ciência, convertido num humanismo supremacista que via todo o resto da vida na Terra como inferior.

Hoje, já se veem os seres vivos mais como diferentes do que necessariamente como melhores ou piores. (Como é que você vai se comparar com uma árvore, ser vivo que se alimenta de luz?)

Os cientistas que passam anos ou décadas acompanhando populações de elefantes conseguem distingui-los um por um, apontar diferenças de temperamento individual (personalidade, se vocês se atreverem a usar um termo mais ousado), e estamos ainda começando a compreender seus movimentos de orelha e vocalizações que por vezes são infrassons inaudíveis à percepção humana.

Há mais de 2000 anos, Aristóteles tinha o elefante como “o animal que supera todos os outros em sagacidade e entendimento.”

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Grupo de elefantes em Tarangire.
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Eles adoram se roçar nas árvores assim. Eles podem comer até 100 Kg de gramíneas e outras plantas por dia. Têm de 2-3m de altura, e os machos — que são maiores — podem pesar de 6 a 7 toneladas. A espécie do elefante africano (Loxodonta africana) é a maior de todas as três existentes. Nela, as fêmeas também têm presas (essas estruturas ósseas ao lado da tromba). Há ainda o elefante africano da floresta (Loxodonta cyclotis), menor, e o elefante asiático (Elephas maximus), que pertence a um gênero distinto.
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Um macho solitário em Tarangire. Repare como ele é um tanto maior. Suas presas ósseas também podem ficar muito maiores que as das fêmeas.
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Fêmeas juntas de um baobá, cuja casca é macia e adocicada — para o gosto dos elefantes —, além de conter água, o que lhes é útil na estação seca. Os baobás do parque ficam todos assim, meio rapados.

Paramos para almoçar dentro do Parque Tarangire num lugar alto e com vista para o rio que lhe dá nome. Tarangire, numa das muitas línguas locais, quer dizer “meandros”, o que se refere às muitas curvas que esse rio tem.

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Tomando sol na testa, com a vista para o Rio Tarangire com o que lhe restou nesta estação seca. As chuvas depois o enchem.
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Elefantes, pequenos vistos daqui, ao redor do que sobrou de água. A mudança climática global não está sendo nada boa para estes rios, pois as secas têm por vezes sido mais duras, assim como às vezes as chuvas vêm com mais violência e causam enchentes.
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Há uns espaços assim onde os visitantes param para almoçar. Não há nada à venda; é só mesmo o espaço, com banheiros (usáveis, mas traga o seu próprio papel por garantia).

Havia uns outros poucos turistas — eu não era o único maluco que resolveu aproveitar a pandemia para visitar estes parques em plena alta estação com mais tranquilidade. Vi vários turistas aqui da própria Tanzânia (a classe média e alta de Dar es Salaam), famílias de indianos, alguns chineses, e muitos casais europeus jovens.

Da comida eu falarei mais no próximo post. Este foi um almoço meio tardio, já passado da 1h da tarde (tarde demais pra o meu gosto), e o sol mostrava inclemência semelhante à que ele tem no Brasil, embora menos quente.

Era aquele céu azul sem nuvens. Tínhamos mais um par de horas aqui no parque antes de rumar para a acomodação nos arredores dele — meu primeiro lodge.

Fomos ver mais elefantes, e cheguei mesmo a poder descer do carro numa hora tranquila diante de um imenso baobá de não sei quantos séculos.

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Parados sob a sombra de um enorme baobá.
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Com a emblemática árvore, no Parque Tarangire.
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Para a sorte dos baobás, sua madeira é esponjosa — não serve para construção. Essas árvores também conservam água num interior oco para melhor resistir à estação seca.

Dizem que, no passado, o miolo desse velho baobá serviu de esconderijo para caçadores, gente que vinha obter marfim — osso de elefante — e aqui se escondia dos guardas do parque. Você ainda vê marcas humanas no interior da árvore.

Hoje, a situação na Tanzânia está melhor em termos de caça e comércio ilegal de marfim, sobretudo depois que a China baniu a importação desse material em 2017.

Antes de qualquer pessoa ativar a sinofobia que se tornou habitual nestes tempos, vale lembrar que foi a demanda ocidental por coisas ordinárias, como bolas de bilhar e pentes feitos de marfim, que destroçou as populações de elefantes daqui ao longo do século XIX e parte do XX. Claro que não se vai permitir agora a outros povos fazer a mesma m***** ter a mesma inconsciência.

É preciso um esforço global pela conservação dos elefantes. O turismo, nisso, ajuda bastante por trazer renda à população local mantendo os elefantes vivos e com seus ossos inteiros.

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Elefanta e filhote em Tarangire.
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Eles não reparam que você fique perto, contanto que não os incomode. (Se incomodar, eles podem derrubar o carro.)

Comendo, os elefantes rompendo as plantas levantavam um aroma semelhante ao de mirra no ar. 

Detivemos-nos ali com o motor desligado, os elefantes a nos observar de soslaio enquanto os víamos e ouvíamos comer, o silêncio do parque agora interrompido apenas pelo vento e pelo quebrar dos galhos por suas fortes trombas. 

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Por entre os baobás. Hora de deixar o parque.
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A quem ficou curioso, os baobás têm frutos, estas bagas grandes (do tamanho de um mamão grande), cujo exterior parece uma cabaça, e no interior há essa massa branca com sementes dentro. Faz-se um pó amarelado disso, rico em vitamina C e com gosto azedo, que os africanos às vezes adicionam no tempero, em sucos ou caldo de cana. (Foto de Tom Rlkens, do Wikimedia Commons.)

Deixamos o parque no cair da tarde e retornamos às estradas com pequenas casas ou bares nas suas beiras, onde as pessoas conversavam. Era o horário das 16-17h, em que as crianças uniformizadas faziam seu trajeto de volta da escola, a pé sabe-se lá por qual distância.

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As beiras de pista na nossa saída de Tarangire naquele fim de tarde.
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Crianças fazendo sua procissão de retorno da escola no fim de tarde. Esse por alguma razão tirou os sapatos e os levava nas mãos. Caminhava descalço. (Se você quiser, medite nesta foto ouvindo a música do maravilhoso compositor queniano Ayub Ogada, Koth Biro — “a chuva está vindo”.)

Minha acomodação era um luxo nesse contexto, ainda que objetivamente não o fosse. Era toda de madeira, com poltronas e cadeiras de campanha diante do pôr do sol africano majestoso que se apresentava.

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Do interior da minha acomodação, diante do sol poente na África.
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Cadeira de campanha, e todo este estilo rústico. Claro que era um luxo neste contexto, mas combinava com o ambiente. Eu tinha a minha própria “cabana”, com banheiro próprio, e havia a parte principal onde estavam os funcionários e ficava o restaurante.
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Tomei um belo banho quente a céu aberto, eu que amo banheiro externo. (Sim, há água quente, o que vem a calhar pois esfria bastante ao cair do sol, e as manhãs pode ser gélidas.)
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Deram-me pipoca, como a algum orixá, antes do jantar.
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Chegamos a ver uma girafa perto dali, pois a natureza está ao lado. Nós estamos nela. Mostrarei mais delas nos próximos posts.
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Boa noite desde África, às vizinhanças de Tarangire.
Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

3 thoughts on “No Parque Tarangire: Entre Baobás e elefantes na Tanzânia

  1. Mairon,
    Mais uma viagem sua que está na minha lista de desejos!
    Muito legal acompanhar suas andanças pelo mundo e as suas impressões sobre tudo.
    Parabéns!
    Abraços,
    Nilton

  2. Uuuuu, meu jovem amigo viajante, que maravilha… Fantástica essa natureza. Que lindo esse parque.. Que magníficos animais . Nossa, que emoção deve ter sido para o senhor ver de perto essa natureza bela essa fauna que enche os olhos de quem ama os animais e a vida selvagem. Amo tanto um quanto a outra.
    Fiquei encantada com os grandes mamíferos e com a magnifica vegetação. Adoro savanas . E que monumentais esses baobás!.. Uuuuu Coisa de cinema, diria um velho amigo. Portentosos, gigantes, magníficos. e que cupinzeiro!… arremaria… Enorme.. Ora ora. Quem diria que cresciam tanto.
    Que belos esses pássaros.. Lindas plumagens. E que surpresa saber que as zebras latem hahaha ora ora..
    Curiosas essas informações sobre hábitos e atitudes dos elefantes. Nada sabia sobre isso. Muito bem.
    O senhor esta certo ao comparar o abandono da cria com o que ocorre com muitos dos lares brasileiros, com o agravante de que os daqui raciocinam, ou deveriam hahaha
    Ahahahah adorei o Covidol hahah aqui no NE temos muitas dessas receitas. E olhe que tem gente que toma e jura de pé junto que não terá o tal corona. E tomara que estejam certos. Aprovei as pipocas e as puxadas para os Orixás das segundas-feiras. Bem África e NE.
    Curioso o carro com mão inglesa.
    Aprendendo sempre nessas viagens do senhor. Viagem maravilhosa!…
    O pôr de sol é um verdadeiro deslumbre. Parece surreal. Espetacular. Eita solão bonito. O do cerrado brasileiro também é muito bonito.
    Que bela vegetação e que belos espécimes, tanto animais quanto vegetais.
    Que lindos esses elefantes, as belas zebras, essa girafinha fofa. Não conhecia aquele’outros que se parecem com os bovinos do Brasil. Interessantes.
    Nossa que poeirento o lugar!… E que colorido banzé esse das estradas e povoações. Tem cara de algumas cidades brasileiras, sobretudo nas periferias, e latino-americanas.
    Curioso o garoto preferir andar descalço.
    E que beleza de acomodação, com direito a água quente , chuveiro ao ar livre, mosquiteiro, cama de príncipe, belo cenário e espreguiçadeira para relaxar.. uaaaauu. como diz o povo aqui, ”o senhor não é fraco não ” hahaha É isso ai.
    Estou amando essa viagem e espero pela próxima postagem.
    Belo parque linda viagem. Destaque para os baobás, os grandes mamíferos e o sol. Magníficos. Valeu. que venham mais belezas.

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