Bem-vindos a Manila, a mal vista e pouco conhecida capital das Filipinas.
Sim, “mal vista” porque quase que invariavelmente os guias de viagem — e o grosso dos turistas estrangeiros, além de alguns próprios filipinos — recomendam que você nem perca tempo aqui na capital: que siga direto para as praias.
Como costuma ser o caso, há um elemento de verdade nisso: é fato que os litorais e ilhas filipinas são o que há de mais especial no país. Mas há também muito exagero em depreciar Manila, e nada como vir pessoalmente conferir para tirar isso a limpo.
Sheryll, a minha amiga filipina que conheci em Cartagena, na Colômbia, eu reencontraria aqui.
Ela me recomendara os ótimos lugares aonde acabei por ir (El Nido, Coron, Bohol, Cebu), e de fato sugeriu que eu não me detivesse mais em Manila que um dia antes de tomar o voo de volta.
Em retrospecto, eu teria optado por permanecer um pouquinho mais, para quem sabe passar umas duas noites na cidade.



Manila hoje, e minha chegada
Manila me lembra Lima com a sua praia aonde não se vai. São Paulo? Talvez, com essa mistura de prédios altos, casario pobre, e rio poluído no meio. Bangkok? Há quem insista em comparar a capital filipina à capital tailandesa, mas ao fim das contas elas são diferentes. Manila compartilha com todas essas o fato de ser uma grande metrópole de terceiro mundo, com suas desigualdades ali embutidas.
Pelo lado de dentro, se você descontar a água — o rio e o mar — sobretudo na sua parte histórica Manila me lembraria mais a Cidade do México com aqueles prédios antigos da colonização espanhola.
Você nota a herança ibérica diante dos olhos, e vê o quanto essa divisão convencional por continentes não necessariamente casa com os aspectos históricos e culturais. Talvez mais valesse agrupar as Filipinas como um arquipélago do continente americano que da Ásia.

Tal como seus pares latino-americanos, Manila tem seus problemas, e não é lugar onde sair por aí andando de qualquer forma sem olhar aonde vai. Finja que está no Brasil, pois há tráfico de drogas, criminalidade, áreas aonde não se vai passear, e engarrafamento.
Entendi porque Sheryll recomendou que eu não passasse muito tempo aqui, mas ao mesmo tempo Manila tem sua beleza, seu legado histórico, e se pode andar por ela tal como se anda por uma cidade latino-americana.
Em verdade, ela tem uma área histórica circundada de um cinturão verde de parques e cuja conservação faria inveja a boa parte das nossas nas Américas.


Eu cheguei ao Aeroporto de Manila vindo de El Nido, saído de um paraíso natural para encontrar o bafafá urbano aqui da capital.
Cheguei por um dos terminais mais velhos do aeroporto, onde Sheryll me aguardava para irmos dar uma volta. Como voos aqui sempre atrasam, eu cheguei quase à hora do almoço, diminuindo meu tempo na cidade, mas deu para passar o grosso do dia nela.
Tomamos logo um táxi direto à região do Intramuros, a visitar a parte histórica que havia. Sinceramente, um lugar delicioso onde caminhar.
O que eu via do táxi no caminho eram vias compridas, parecendo uma Marginal Pinheiros ou algo do gênero, sem grandes apelos. Havia aquelas partes onde não se veem pedestres nas ruas, até que se chega ao centro histórico da cidade.



Intramuros: A preservada zona histórica de Manila
Chegamos, Sheryll e eu, direto à praça da catedral, dantes chamada Plaza Mayor pelos espanhóis. Como pela América Latina, também foi conhecida como Plaza de Armas e feita naqueles mesmos moldes, com o prédio de governo de um lado e a catedral do outro.
Hoje, ela se chama Plaza de Roma. Os ianques converteram-na em Plaza McKinley quando tomaram para si a colonização das Filipinas em 1899, com o nome do seu presidente à época, mas isso seria revertido. Os filipinos, mui católicos, adotaram o nome atual quando da elevação do seu primeiro sacerdote ao Colégio dos Cardeais do Vaticano. Em retorno, você hoje encontra um Piazzale Manila nomeada assim por Roma lá em contrapartida.
Como no caso das amplas praças latino-americanas, era um espaço aberto que, no entanto, o governador-geral Rafael Maria de Aguilar (ainda no tempo espanhol) converteu num jardim em 1797. Há planos para agora retornar a praça ao seu desenho original — uma “requalificação”, como anda na moda dizer, não só no Brasil. É uma praça tranquila e agradável, ainda com cara colonial.


Fazia uma manhã daquelas tropicais de calor não-agressivo. Fevereiro aqui é um ótimo mês para vir aqui, sem grandes chuvas nem calores exagerados. Era um calor amigo, daquelas manhãs de sol em que você sai bem-disposto à rua. Como o mar está próximo, há também uma bem-vinda brisa.
Sheryll me perguntou se eu queria primeiro circular para depois almoçar ou comer já de imediato. Comigo, almoçar primeiro é de lei. Não me fale em sair andando por aí com fome que me dá nervoso.
Detivemos-nos então num Max Restaurant logo ali. É uma rede bem onipresente nas Filipinas, destas que adaptam a moda fast food à culinária e gostos locais — é tipo uma versão avançada e filipina do Giraffas, em que meio que há de tudo.
Eu comi um peixe assado enrolado na folha com legumes, e depois dividimos uma sobremesa típica: o fantástico halo-halo.


Eu acho fascinante notar como a gastronomia é dos elementos culturais mais arraigados que sempre há. No Brasil, apesar de 500 anos de História pós-Cabral, o ingrediente mais conspícuo da culinária brasileira — os chefs todos concordam — segue sendo a mandioca indígena. Seja no México, no Peru, na Bolívia, suas culinárias tradicionais todas remontam a antes dos espanhóis.
Nas Filipinas, a coisa é similar. Porco, peixes assados, e doces com coco já são típicos desde antes de Fernão de Magalhães aportar por aqui em 1521. Por hoje, há também as trocas de influências regionais. Sobremesas parecidas se encontram na Indonésia (ex. cendol) ou na Tailândia (ex. os “rubis vermelhos” tailandeses) com seus muitos cocos e gelos e muito coloridos doces.
Com o estômago já forrado, vamos agora circular. Intramuros se revelaria uma curiosa área de ar latino-americano colonial bem forte, mostrando mesmo que as Filipinas foram por mais de 300 anos uma colônia espanhola.





Parece o Velho Oeste, na sua acepção original hispânica, antes da cessão da Califórnia aos Estados Unidos em 1848. As semelhanças estão por toda parte.


Sheryll e eu fomos à catedral logo ali, ver essa Basílica Menor e Catedral Metropolitana da Imaculada Conceição, construída em 1571.
Curiosamente, ela era inicialmente uma paróquia vinculada à Arquidiocese da Cidade do México (!). Somente em 1579 é que adquiriu maior autonomia. Seria o miolo espiritual da cidade que os espanhóis aqui constituíam como capital da sua colônia no século XVI.
A saber, Manila já existia antes dos espanhóis. Diz-se que um povoamento do povo Tagalog (um dos principais dos que vieram a ser chamados de filipinos, e cujo idioma é o dominante hoje no país) com o nome de Maynilà já aqui havia desde pelo menos 1258. Foi onde os ibéricos erigiriam sua cidade fortificada.
A ideia de murar a cidade — nem sempre presente na colonização latina mundo afora — se deu devido aos constantes ataques de piratas estrangeiros, sobretudo chineses, naqueles idos de 1500-1600. Foi quando Intramuros surgiu como tal.




Hoje não se diz, mas essa igreja foi toda derrubada durante a Batalha de Manila em 1945, na Segunda Guerra Mundial. Por um mês, houve aqui a mais intensa guerra urbana de todo o teatro asiático da guerra.
Norte-americanos e filipinos, estes mortos em grande número pelos japoneses, encerrariam ali três anos de ocupação das Filipinas pelo Império do Japão. As Filipinas se veriam finalmente independentes, também dos Estados Unidos, em 1946.
Quem não caiu no bombardeio de 1945 e remanesce originalérrima é a barroca Igreja de Santo Agostinho, hoje Patrimônio Mundial da Humanidade tombado pela UNESCO. Esta, de 1607, é a mais antiga igreja de pedra ainda na construção original em todo o país.

Esta igreja de Santo Agostinho — personagem cujo dizer eu recobro no banner da página, na sua observação lá no século IV de que “o mundo é um livro e quem não viaja lê apenas uma página” — e o seu convento adjacente é dos lugares mais autênticos e belos que há para ver aqui nestes Intramuros. Todo o espaço exsuda a aura da Era de Ouro das conquistas espanholas pelo mundo.





O agostiniano Frei Andrés de Urdaneta (1508-1568) foi para as Filipinas um pouco o que o também espanhol José de Anchieta (1534-1597) foi para o Brasil. A Ordem dos Agostinianos, por sua vez, fez papel semelhante àquele prestado pelos Jesuítas nas Américas (embora os jesuítas também tenham vindo para cá).
O quadro ali mostra uma versão imaginada do que teria sido a chegada do espanhol Miguel López de Legapzi às Filipinas em 1565, a iniciar a colonização ibérica deste arquipélago que formaria as Índias Orientais Espanholas.
Eu já contei sobre a História das Filipinas neste post introdutório e neste outro post sobre a chegada dos primeiros ibéricos com a esquadra do português Fernão de Magalhães em 1521. Foi seguido por aquela do espanhol Legapzi em 1565, a que daria realmente início à colonização espanhola, que se estendeu por mais de 300 anos até 1898.
Este convento-museu, naturalmente, trata bastante do papel dos agostinianos durante a colonização. É claro que realçam suas benfeitorias, como a defesa dos nativos diante dos abusos físicos que os europeus impunham, o letramento dos filipinos, dentre outros.
Os agostinianos aqui também enfatizam o compromisso da ordem com a mensagem do amor de Jesus. Seu símbolo, inclusive, tem o Coração de Jesus. Está gravado numa porta de madeira do século XVII aqui exposta.





Se você gosta de História, a visita também conta bastante da integração comercial entre as Filipinas e as Américas dentro do império, com os galeões espanhóis a fazer o trajeto Manila-México-Espanha.


É claro que os galeões traziam bem mais. Traziam milho, cacau, amendoim, tabaco, tomates, pimentas coloridas e mamão — todos estes, produtos nativos das Américas, além de gado e cavalos trazidos da Europa.
Levavam da Ásia especiarias (cravo, canela, gengibre, noz-moscada, etc.), porcelanas da China, produtos laqueados oriundos do continente ou do Japão, tapeçarias persas e roupas de algodão da Índia que chegavam daquelas bandas ao porto de Manila, além de chá, madre-pérola, leques e um sem-fim de outros produtos que tinham a Europa como destino final, transitando pelo México de Acapulco no Pacífico até o porto mexicano de Veracruz no Atlântico.

Estivemos no Forte Santiago, e terminamos por visitar o Baluarte San Diego. São muitos os vários sítios históricos a ver no Intramuros, um lugar onde realmente se pode passar o dia entre uma coisa e outra.


Eu não sei o que estava fazendo que demorei tantos anos para vir visitar as Filipinas.
Salvos certos exotismos como o balut, confesso que me senti quase em casa por aqui. Aprendi bastante, e vi o quanto enganados estão aqueles que pensam que Filipinas são só praias e mar.
Sheryll e eu começávamos a olhar o telefone, as horas, e o momento de ir. Eu tinha um voo naquela noite.
No formoso Hotel Bayleaf, às margens da muralha, acabamos por entrar para tomar um café com churros. Eu, que estava com meus pesos filipinos contados, acabei tomando emprestado de Sheryll para pagar quando tiver a fortuna de voltar aqui. Sigo devendo.
Detestaria estar devendo ao meu vizinho, mas adoro a sensação de estar devendo dinheiro à minha amiga cá deste outro lado do mundo. (E é óbvio que eu não vou fazer uma transferência bancária.)
Meu motorista de aplicativo estava por chegar. Aqui, usa-se o Grab, que comprou a licença do Uber em Manila, então saiba qual ter à mão.
Uma longa e silenciosa viagem de carro me levaria ao aeroporto pelas avenidas extensas de Manila ao que, por alguns momentos, eu via o mar.
Encontraria Ninoy Aquino em polvorosa. Eu não sabia se era alguma data especial, mas um padre rezava missa que ecoava pelo aeroporto. Não era uma simples capela: há missa completa, com padre, comunhão e música religiosa alta das caixas de som do andar das partidas, e dezenas de fieis filipinos a assistir dos assentos dedicados naquele espaço. Nunca vi isso em outro lugar do mundo.
Aliás, muita coisa por aqui que, embora já tenha carimbado o meu passaporte em mais de 100 países, eu nunca havia encontrado em lugar algum do mundo. As Filipinas são únicas, singulares assim.
Uuuuu que cidade interessante!… Portentosa, pujante!.. com grandes edifícios. Tem traços mesmo de algumas fotos de Sao Paulo.
As fotos são fenomenais. Cada uma mais bonita do que outra.
Belíssima essa foto de abertura. Que monumento essa basílica!. O estilo parece com as da Latinoamérica. Lindos tons, bela cúpula e muito verde, combinando com o bege. das paredes. Uma das minhas combinações favoritas. Essas portas decoradas lembram as de Notre Dame em Paris. Tudo bem cuidado, limpo, e com um diáfano céu azul. Linda. Bwlo estilo, bela estrutura. Muito bonita.
Uuuu esse pôr de sol é espetacularrr, extasiante. Uma festa na Natureza. Que tons maravilhosos. Parece Photoshop, incrivelmente belo. Que fotografia!… fascinante. Meu jovem, que beleza!… que natureza esplendorosa. Um espetáculo para os olhos. Fiquei deslumbrada. Parece que está havendo um incêndio no céu!… e a cidade ficou linda com seus contornos elegantes e as primeiras luzes. Muito bonita a foto.
Linda essa outra foto de Manila à beira mar. Bela, com esse céu azul profundo, as fofas nuvens brancas e essas águas serenas e azuladas. Linda foto. Parece um postal e dá ideia da beleza e do porte da cidade.
Já essa outra foto nos mostra as áreas mais modestas em meio aos edifícios, tornando a cidade parecida com grandes cidades brasileiras.
Que maravilha essa área verde com espelho d’água. Bonita e bem cuidada. Um charme.
A área histórica é uma graça, um encanto, com seus arcos, pontes, cantos e recantos encantadores, ruelas, flores em caramanchões, mesinhas, lojinhas, pracinhas lindas com charretes, casarios, gente para lá e para cá, lindinha. Amei.
Essa plaza de Roma é uma graça linda. Tanto pode ser Ásia ou Latinoamérica. A dúvida é tirada pela presença gostosa dos curiosos tuk-tuks. hahah. E quanto verde. Linda..
Esses templos e o museu são de uma beleza ã parte.
Belos vitrais e lindo o altar Mor da Basílica. Essa igreja de Santo Agostinho é uma riqueza. Seu interior é esplendoroso. Um charme. Muito bonita
E que convento!. Uauu. lindo, charmoso, com bela área interna e externa, espaçoso, elegante e bem preservado. e que recantos agradáveis. Como bem diz o senhor, a cara da colonização espanhola, assim como esse forte, nesse caso, ibérica pois aqui no Brasil, de colonização portuguesa, também os há.
Essa orla não deixa nada a dever à Riviera francesa.
Linda postagem. bela, interessante e visitável cidade. Com certeza.
A comilança está con una buena cara. Adoro comida com coco.
Muito instrutiva e interessante a postagem. Adoro História. Merece destaque esse intercâmbio econômico e socio-cultural que os ibéricos, nesse caso os espanhóis, fizeram ao longo das suas conquistas e colonizações. E como são semelhantes esses legados ibéricos .
Amei a sua descrição e impressão que teve e fez das Filipinas. Concordo com o senhor, meu jovem amigo brasileiro e acrescento que gostaria bastante de a conhecer. Qui lo sa?