O nome do maior templo budista do planeta tem origem e significado desconhecidos. Borobudur, na Ilha de Java, é um grandioso complexo do século IX na Indonésia. Desde então, os budistas jamais construíram algo maior.
São mais de 500 imagens de Buda num gigantesco zigurate — que lembra aquelas pirâmides escalonadas da Babilônia — de base quase quadrada com 118m de cada lado.
No alto e às margens dos seus vários andares, múltiplas estupas significando a elevação espiritual e gravuras em alto-relevo nas paredes.
As escadarias, é claro, requerem pernas fortes. O sol, inclemente durante o dia nestas latitudes equatoriais, por sua vez castiga a cabeça do visitante. Eu vim a Borobudur em pleno dia durante a minha primeira vez na Indonésia — um espetáculo. Desta vez, eu o faria de madrugada, à aurora, numa visita toda especial.


Antes de ser Patrimônio Mundial da Humanidade tombado pela UNESCO…
Antes de se tornar patrimônio cultural da humanidade, Borobudur foi um símbolo da majestade budista e do poderio econômico da Dinastia dos Shailendra aqui na Ilha de Java.
No post anterior, eu contei como esta ilha — e muito da Indonésia — foram hindus ou budistas na Antiguidade e no medievo. Somente com a chegada dos navegadores comerciais árabes (e, mais tarde, europeus) é que parte destes povos do Sudeste Asiático se tornaria muçulmana ou cristã. Hoje, em Java e na Indonésia como um todo, cerca de 90% são seguidores de Maomé.
Na época do primeiro milênio d.C., porém, correntes hindus e budistas é que disputavam as mentes e corações dos javaneses e demais indonésios. Em Java, à altura do século IX, eram duas as principais dinastias que disputavam poder na ilha: os Sanjaya hindus e os Shailendra budistas.
Eles não eram poderes pequenos, limitados a disputas intestinal aqui dentro da ilha. Eram poderes marítimos que comerciavam com o Sudeste Asiático continental, dominavam partes do que são hoje a Malásia e a Tailândia, e daí que traziam até cá os saberes e artes da Índia.

Borobudur pré-data em algumas décadas o também grandioso templo (hindu) de Prambanan, mostrado na postagem anterior. Borobudur teria ficado pronto em 825 d.C., e o que se diz é que Prambanan (inaugurado em 856) teria sido uma resposta hindu dos Sanjaya a esta grande obra budista dos Shailendra.
Melhor para nós, que hoje temos dois conjuntos impressionantes a visitar nas vizinhanças da cidade de Yogyakarta, em Java Central.
Borobudur fica a 40 Km dessa cidade, e qualquer acomodação que se preze organizará o transporte para você visitá-lo. Como comentei, evite as horas próximas do meio-dia, pois o calor é de respeito e não há nada coberto.
Eu vim aqui tomar um sol de final de manhã quando visitei a Indonésia pela primeira vez, há 10 anos atrás. Note-me abaixo de sarongue, o saião budista obrigatório — e que eles emprestam ou alugam — a todos os que visitam.

Visitando Borobudur de madrugada
Enquanto que você pode os detalhes do templo durante o dia naquela postagem da minha primeira visita, eu desta vez o veria sob a luz do amanhecer. (Fica ainda mais especial e, como está na moda dizer, eu super recomendo.)
Prepare-se para acordar cedo. Borobudur fica a cerca de 1h de viagem de Yogyakarta. Normalmente, sai-se da cidade por volta das 3:30h da manhã para estar pelas 5:00h comprando as entradas.
Custa 450,000 rúpias indonésias (aprox. USD 30) por pessoa esta visita ao raiar do sol. Quem organiza esta visita especial é o Hotel Manohara, único a obter acesso ao Templo de Borobudur antes de sua abertura oficial às 6:00h da manhã. No entanto, a maioria das acomodações ou agências na cidade organizam o passeio. Você não precisa contatar o Hotel Manohara por contra própria.
Pode ir vestido com qualquer roupa. Sequer tivemos que vestir sarongues, ao contrário do que ocorre nas visitas normais.




O nascer do sol desde Borobudur
Como você pode reparar na foto, neste horário se por vir aqui vestido à vontade — mas não subestime o friozinho. A depender da sua sensibilidade, pode valer a pena trazer um casaco leve para antes de o sol raiar.
Assim foi: subir aqueles degraus a passadas altas e cuidadosas, com a lanterna na mão, até o topo. No alto, há uma plataforma de onde se pode melhor observar o entorno do templo enquanto clareia.
Nunca se sabe muito ao certo de antemão o quanto o céu estará nublado. Desnecessário dizer que é melhor se você puder ver o sol.
Na prática, bem possível que você tenha um misto: um parcialmente nublado em que, se você esperar, o sol lhe dá um beijo, ainda que temporário, daqueles que passam mas que você recordará.

Apesar de haver dezenas de pessoas ali conosco, eram apenas murmúrios. Como se o escuro remanescente fizesse com que as pessoas silenciassem.


O sol ainda não havia dado as caras; apenas a sua luz começava a despontar. Com o clarear, víamos o entorno vegetado de Borobudur, suas matas e, mais adiante, as montanhas do interior aqui de Java.






No alto com o dia claro: placidez budista
Ouvir os sons da manhã, uma daquelas manhãs tropicais, em que o friozinho da madrugada vai gradualmente ficando para trás, os pássaros despertam e a luz vai aparecendo.
No horizonte, uma névoa envolvia as árvores. O céu ia ganhando cores róseas.
Era uma placidez, uma placidez budista naquele ambiente.




O espaço é amplo, e há um número limitado de visitantes por aurora. Conosco, creio que aqui havia uns 30.
Não posso mentir-lhes dizendo que é silêncio absoluto ou quietude completa, mas posso dizer que não houve algazarra (talvez por as pessoas ainda estarem com sono). Há sempre espaços onde as pessoas se aglomeram mais e outros onde você pode circular quase sozinho, em meditação.



Quando o sol finalmente raiou
Há sempre uma incerteza se veremos o sol ou não, caso o dia esteja nublado. Você pode até olhar a previsão do tempo, embora não necessariamente resolva. O que você não deve é ir embora rápido demais, pois às vezes há uma janela de oportunidade por dentre as nuvens.
Quando o sol finalmente raiou sobre o templo, entre olhares extasiados, expressões de felicidade e até alguns sons de satisfação, parecia ter havido um orgasmo coletivo em pleno topo de Borobudur.









Não exagero ao dizer que há uma certa magia mística no ar, quando se admira a natureza neste espírito de conexão com a transcendência. É, em grande medida, uma questão de sintonia — e ir além do ordinário no nascer do sol que tanto banalizamos, e contemplá-lo com inteireza. Ali, é como se Borobudur lhe fizesse parar e ver, como se a dizer: “Olhe. Repare.“
O sol não durou muito. Evanesceu-se entre as nuvens equatoriais enquanto que o calor subia.


Detalhes desta obra budista
Não é possível ir ficando em Borobudur para o dia.
Você pode permanecer um tempo (creio que até as 8h) e visitar algo antes de ir embora, mas para ver as obras do templo em detalhes, recomendo fazer também uma visita diurna normal.
O sol se escondendo novamente, as pessoas começaram a partir. Entendiam que ele não voltaria mais hoje, pelo menos não por enquanto.
Foi somente o tempo de dar uma última mirada nas vistas (pelo menos até a próxima visita aqui), e de rever alguns detalhes da obra, como as gravuras em alto-relevo que mostro a vocês.

Há 5-7 andares, a depender de como você contar. Isso porque os “andares” finais não são espaçados como os mais baixos.
Há escadarias entrando das quatro direções cardeais, e o templo como um todo — visto do alto — tem a estrutura de uma mandala.
Isso significa não apenas quatro caminhos até o centro, mas também que o templo está em “camadas”. Mais próximo da base estão ilustrações de planos de existência mais terrenos, que se elevam até chegar ao topo com seus 35m de altura. Veja na ilustração abaixo.
A ideia original não é subir todo direto até o topo como nós fizemos parar ver o nascer do sol. Borobudur, como bom templo budista, foi concebido também para ser um centro de peregrinação. Você vai subindo e dando voltas em sentido horário, percorrendo estes planos mais baixos até chegar ao alto.
Ao contrário dos grandes templos budistas em Bagan (Myanmar), pela Tailândia, ou o grandioso Bayon, no Complexo de Angkor no Camboja, Borobudur não possui câmaras internas. Ele é todo esta mandala maciça.

Para dar-lhes uma noção geral,
- Kamadhatu (mundo dos desejos) é a categoria mais vulgar dos planos de existência, onde dominam a sensualidade, os apelos, a fome, os vícios, e os vários desejos dos sentidos. É a realidade dos seres humanos, outros animais, e de tantos espíritos na cosmologia budista.
- Rupadhatu (mundo das formas) inclui os vários planos de existência onde os seres têm forma, porém feita de uma substância sutil e invisível ao olhar de quem vive nos planos dos desejos.
- Arupadhatu (mundo sem formas), dos planos de existência mais elevados, onde os seres já não têm nem forma física nem localização espacial específica. São pura “mente”, numa tradução contemporânea algo grosseira.
Cada um desses mundos têm vários planos e seres de diferentes gradações. Quando um ser do mundo das formas (o intermediário), por exemplo, quer se manifestar a alguém do mundo dos sentidos, precisa adotar uma forma mais grosseira para ser percebido. E assim vai.
O espiritismo ocidental abraçou mais coisas do budismo do que os próprios espíritas às vezes se dão conta.





Até a próxima, Borobudur
Desci meio que já no fim da turma, dentre os últimos conforme o guardinha nos dizia que já havia dado a hora. Afinal, este horário havia sido para apreciar o nascer do sol. Para visitá-lo com templo livre, basta fazer uma visita normal durante o dia.
Ainda dei umas olhada nuns painéis conforme ia descendo as íngremes pedras da escadaria de Borobudur. Agora, com a luz do sol, era possível vê-las todas bem.
Lá embaixo, no gramado que o cerca, ainda dava para olhá-lo em sua inteireza. Tal como numa despedida de alguém de quem você gosta e que sabe que pode demorar a rever, você fica a todo momento olhando mais uma vez para trás — como que a teimar que aquela anterior ainda não havia sido a última olhada, que ainda dava tempo para mais uma.



A lanterna em minha mão parecia meio boba, agora com tudo já iluminado pelo dia.
Como a devolvi, ganhei de brinde um xale de Borobudur que conservo de lembrança. Ganhamos também um cafezinho com bobagem doce de cortesia, que tomei enquanto duas moças filipinas do outro lado da mesa estavam ao celular.
Breve, eu seguiria rumo para meu reencontro com Bali, noutras bandas aqui da Indonésia.
Uuuuuuuu. Meu jovem, que espetáculo!…. Que maravilha!… Que imponente complexo. Altamente significativo, belíssimo, esplendoroso, uma joia da cultura e religiosidade desse povo impar. Deslumbrante, harmônico, rico, pujante e de detalhes incríveis!… Que belas estruturas, que arte maravilhosa, que tons de pedras, espetacular conjunto!… De encher os olhos de admiração e do beleza. Seguramente merece o pódio. O mais belo de todos os que o senhor já nos mostrou, nessas suas maravilhosas viagens.
E com o nascer maravilhoso do astro-rei, a magnifica paisagem sob as vistas do estupendo Merapi, então, é a Gloria. Oh Gloria, diria uma boa amiga. Maravilha mesmo. É de babar. Que rico, diriam alguns amigos latinos que hablam Español.
Fascinante a postagem. congratulations.
Amei. Fiquei encantada. Coisa de cinema, diria um velho amigo. Nota mil.