Olomouc me lembra até o Pelourinho. Vivazes cores, torres, igrejas, casario enfeitado e ruas de pedras no chão.
Estamos, porém, na Europa Central e não na Bahia. É que a arquitetura barroca e seu urbanismo dos séculos XVI-XIX guarda certas semelhanças por todo o Ocidente. (Hoje é que temos uma arquitetura sem graça e quadrada, se querem a minha opinião.)
Estamos, mais exatamente, na Morávia — mais uma destas regiões do finado Sacro-Império Romano Germânico, na Europa Central, que alguns vão reconhecer de nome sem necessariamente saber apontá-la no mapa. Foi uma entidade medieval que hoje é uma região no leste da Tchéquia.
Se você achou que a Tchéquia tinha apenas Praga enquanto cidade histórica e bela, enganou-se. Olomouc [lê-se o-lo-môuts], da qual eu duvido que muitos tenham ouvido falar, está aqui para mostrar o que é que a Morávia tem.

Quem foi a Morávia e onde fica
Eu nunca vou me esquecer de um colega meu, no primeiro ano de universidade, comentando que um certo alguém havia sido aqui da Morávia.
— “E onde é que fica a Morávia?“, perguntei eu com sinceridade, pois tampouco sabia.
— “Sei lá, cara. Sei que foi na Morávia“, respondeu ele meio atravessado, aderindo ao método decoreba de aprendizado.
Levei vários anos para finalmente aprender, e ainda outros tantos para vir aqui, mas a Morávia fica na Europa Central, no que era o mesclado de germânicos e eslavos que era o Sacro-Império Romano Germânico na Idade Média, e hoje é a região leste da Tchéquia.
A Tchéquia é sobretudo formada por duas grandes regiões históricas: a Boêmia, onde fica Praga, e a Morávia, este lado de cá, no leste do país. (Há um pedacinho do país também na Silésia, região que ficou mais com a Polônia, e que você vê na minha visita à Breslávia lá.)



A Morávia é das primeiras entidades eslavas a aparecerem na Europa durante a Idade Média.
Os eslavos migram para oeste a partir de sua região de origem, que se crê ser mais ou menos onde é hoje a Ucrânia, e ocupam espaços deixados pelos (outros) “bárbaros” germânicos — que haviam nos fins da Idade Antiga invadido o Império Romano e ocupado muito do que são hoje a França e a Alemanha, efetivamente colonizando essas áreas.
Os eslavos vêm nessa esteira e até cá onde é hoje a Tchéquia, enquanto que no sul vão para a Dalmácia (atual Croácia, onde fica Dubrovnik), para o incômodo dos bizantinos e dos papas romanos, que já à altura do ano 600 d.C. se queixam de eslavos “em grande número” adentrando as suas fronteiras.
Os eslavos eram pagãos, cultuando o deus do relâmpago e dos céus (Perun) — um tanto como o Zeus dos gregos e, a saber, todos os deuses-pai indo-europeus, comumente associados ao céu. Somente no século VII começam a ser convertidos ao cristianismo, num processo que levará centenas de anos para ser consolidado.
Eis que surge então em 833 d.C. a chamada Grande Morávia, centrada aqui onde estamos, às margens do rio Morava — daí seu nome.

Olomouc no medieval Margraviato da Morávia
Um margraviato é como um condado ou um ducado, só que na fronteiras do império.
O nome vem das “marcas” do Império Romano, que eram os seus limites — onde, portanto, ter certa proteção e cuidado adicionais era fundamental. (O nome Dinamarca, por exemplo, provem da “marca” de onde ficavam os daneses.)
Graf era um título franco-germânico análogo a “conde”, então os condes das marcas foram chamados de margraves, e os seus domínios de margraviatos. Em português, é o equivalente ao título de marquês.
Pertencer ao império, é claro, era algo controverso. Por que não obter autonomia total? Foi o que a Grande Morávia buscou fazer no século IX, entrando em guerra contra as tropas imperiais. Acabaria, porém, sendo invadida e tomada pelos húngaros.
A lógica do império era essa: coesão em face aos inimigos externos aqui na fronteira oriental.

Se adiantarmos a fita um pouco, a 1100, tínhamos a ex-Grande Morávia repartida entre o vizinho Reino da Hungria e o Reino da Boêmia — o qual conseguiu retomar parte de volta ao império. É assim que chegamos ao mapa de acima, com o Margraviato da Morávia dentro do Reino da Boêmia dentro do Sacro-Império Romano Germânico.
Uma cidade que passa do medieval ao barroco
Tal Margraviato da Morávia passa a existir oficialmente em 1182 — e duraria mais de sete séculos, até 1918. É quando Olomouc finalmente aparece em cena como uma cidade importante desse lugar.
Você até hoje pode visitar o seu relógio astronômico do século XV, na prefeitura da cidade.



Embora esta cidade seja medieval, quase todo o seu aspecto, a sua textura, é barroca dos idos dos séculos XVII-XIX.
Uma das edificações que conserva o aspecto medieval é a grande Catedral de São Venceslau (St. Václav ou Wenceslas), originalmente do ano 1107, mas que ganhou os contornos góticos atuais nos idos dos séculos XIII e XIV. É um esplendor, das maiores que há na Tchéquia.


Esta coluna foi erigida em gratidão divina após a cidade ter superado uma peste que ceifou vidas aqui entre 1713 e 1715. (Imagina hoje se ergueríamos um monumento pós-covid?)

Você dá voltas e voltas tranquilas pela cidade, embebendo-se na arquitetura e apreciando tudo. Olomouc não é um lugar grande, tampouco uma cidade com muitos museus ou ambientes internos para conferir. Não; a graça principal de Olomouc é mesmo o exterior com suas ruas pitorescas e fachadas externas bem conservadas, um monumento aqui e uma edificação bela ali.
Você pode vir, passar 1 noite num périplo por estas bandas da Tchéquia, e ver tudo. (A localização da cidade não a faz muito prática para um bate-e-volta desde capital nenhuma. Um trem desde Praga leva 2h15min, e você pode forçar, mas eu recomendo pernoitar aqui na Morávia para ver tanto Olomouc quanto Brno, a outra cidade de porte na região.)



Eu chegava de Vsetín, a cidadezinha tcheca nas proximidades, onde eu estava na casa de uma amiga. No post anterior, contei sobre como acabei numa capa de jornal por lá.
Eu agora aproveitava para ver o que a Morávia tem de belo e interessante. Vi os monumentos mostrados acima e as casas em tons pasteis, típicas aqui da Europa Central, esta entidade que certo dia já foi uma, e que aos poucos vai se reencontrando enquanto entidade cultural — passada aquela divisão artificial, política, do tempo da Guerra Fria.


Éramos tão poucos turistas pelas ruas que fui abordado por uma daquelas moças que ficam de colete colorido na rua coletando assinaturas ou doações para alguma causa social.
Ela sequer falava inglês, mas era uma simpatia. (É incrível como os europeus jovens conseguem ser incrivelmente mais dados e mais simpáticos que seus ancestrais. Dai glória, pois nem tudo na mudança dos tempos é para pior.)
Esgotei o meu vocabulário de tcheco — que em geral quase que só me serve para eu saber ler cardápios — literalmente num minuto, explicando a moça que eu estava turistando aqui na República Tcheca.
De fato estava. Se você acontecer de vir por aqui, visite o site oficial de turismo cidade também, caso queira saber mais detalhes. Eu agora estava de rumo para Brno.
Nossa, que lindinha!… A cidade parece um presépio. Encantadora.
Belíssima em seu estilo arquitetônico. Lindo casario com seus majestosos tons e encantadoras floreiras. Amei as gostosas ruelinhas, suas ladeiras, seus belos arcos, aconchegantes pracinhas. Uma graça.
Impressionante essa coluna central. Deslumbrante essa sua prefeitura. Fantástica. Belíssima. Artística, parece feita a pincel. E os templos são de grande beleza. Magnífica essa catedral. Um monumento. A cidade é toda linda. Que arquitetura fabulosa!…E como mesclou bem os estilos. Tem traços da parte histórica de Salvador, na Bahia. Até o colorido do casario.
E que interessante a sua História. Os nomes Boêmia e Morávia são conhecidos aqui no Brasil, mas descontextualizados.
Curioso como os povos antigos dessa região gostavam desses relógios, Sao lindos.
O senhor , meu jovem amigo viajante, tem o dom de descobrir lugarezinhos fantásticos, fofos e sequer imaginados que existiam. Maravilha. Valeu. Adorei.