A Tchéquia é forte nestas vistas imponentes com castelos e catedrais. Eis aqui Brno que não me deixa mentir — esta cidade de curioso nome que eu sempre achei estranho de pronunciar.
Praga, a esplendorosa capital do país, já caiu há algum tempo nas graças dos turistas, mas é preciso notar que a Tchéquia não se limita a ela. Eu já mostrei alguns outros recantos como Kutná Hora, Český Krumlov, e mais recentemente Olomouc — e há mais.
Brno é a segunda maior cidade tcheca, onde o frade agostiniano Gregor Mendel (1822-1884) fundou a ciência genética com seu famoso experimento de cruzamento de ervilhas. Sim, ocorreu aqui, e dá para visitar até o jardim onde a coisa toda se deu.
Vamos conhecer?

A Morávia de Mendel
No post anterior na cidade de Olomouc (aqui pertinho), eu tratei de como a Morávia é o nome da atual região leste da Tchéquia.

No passado, a Morávia já foi uma entidade soberana ou semi-autônoma.
Começou com a chamada Grande Morávia, um reino eslavo medieval do século IX. Ele em tempo seria absorvido ao Sacro-Império Romano Germânico como um margraviato.
Um margraviato é o domínio de um marquês. Um marquês era um nobre que representava o monarca (neste caso, o imperador). Ao contrário de condes e duques, o que caracteriza o marquês é estar na marca dos domínios — às fronteiras do império, dando-lhe portanto certa incumbência especial de defesa.
O Margraviato da Morávia (1182-1918) existiu por quase todo um milênio. Foi onde Mendel viveu.

Naquele tempo, as regiões e impérios não eram nações — ou seja, não havia a concepção moderna de que todo mundo ali forma uma comunidade nacional, igual perante a lei, etc.
O Império Austro-Húngaro (1867-1918), que sucedeu o Sacro-Império Romano Germânico (800-1806) nesta região, era plurinacional. Havia uma mistura de famílias germânicas, húngaras, eslavas, e de toda sorte, num total de 17 nacionalidades distintas coexistindo.

Mendel era de família austríaca, portanto falante de alemão. Ele viveu como frade agostiniano e abade na Abadia de São Tomé, aqui em Brno, a qual os germânicos chamavam de Brünn.
A Abadia de São Tomé é uma igreja gótica do século XIV que tinha um claustro em anexo para habitação monástica. (Mas não era isolamento completo, ao contrário do que costumamos sempre supor. Era uma confraria, mas as pessoas podiam sair e entrar. Mendel vivia aqui e também trabalhava na universidade.)
Você pode hoje visitar essa abadia, onde fizeram um museu a Mendel — o Mendel Museum — sobre sua vida, trabalho, e contribuição à formação da ciência genética.


Johann Mendel (1822-1884) adquiriu o nome de “Gregor” ao se juntar aos agostinianos — como os frades sempre costumam fazer, ao adotar um nome religioso que não o seu de batismo.
Ele nasceu num vilarejo a norte daqui. Trabalhava na roça e com colmeias de abelhas. Foi estudar filosofia na Universidade de Olomouc, mas não tinha condição de pagar pelos estudos. Acabou sendo ajudado pela sua irmã, que generosamente passou a ele o seu dote de casamento.
Mendel certa vez disse que entrou para a vida de confraria para poder estudar sem precisar pagar. Poupava-o daquela “perpétua ansiedade sobre os meios de vida“, nas palavras dele.
Ele aqui em Brno fez o sacerdócio, foi por uns anos estudar na Universidade de Viena (onde foi aluno de Christian Doppler, o físico que dá nome ao exame de ultrassom), e retornou a esta abadia.
Gregor fez uma colmeia de abelhas aqui, talvez para seguir com o que fazia na infância. Seguiu estudando, e permaneceu vinculado ao Departamento de História Natural da Faculdade de Filosofia da Universidade de Olomouc. Ele aprendeu bastante sobre o que já vinha sendo estudado ali sobre cruzamento de animais de fazenda (carneiros) e de plantas. (Raramente as ideias surgem do zero.)
Mendel teria iniciado seus próprios experimentos com camundongos na abadia, mas segundo dizem o bispo não aprovou essa ideia de experimentar com sexo animal ali. Passou-se então às afamadas ervilhas.


Você provavelmente aprendeu sobre herança mendeliana na escola.
Basicamente, Mendel demonstrou que nós herdamos características físicas não por simples mistura, como se acreditava até então. Embora se soubesse ainda dos genes, nem houvesse conhecimentos profundos de biologia molecular, ele entendeu como a herança de traços muitas vezes se dava e cunhou os conceitos de características “recessivas” e “dominantes“.
Mendel foi especialmente atento estava para traços que desaparecem numa geração mas reaparecem na geração seguinte — aquilo que você herdou do seu avô ou avó embora seu pai ou sua mãe não mostre.

É preciso notar que nem todas as características seguem esse padrão. A genética evoluiu bastante desde então. Coisas como cor de olho, cor da pele etc. são multigênicas. Ou seja, vários genes regulam a característica, e sua herança é muito mais complexa.
As leis mendelianas de hereditariedade, porém, seguem vivas e embasariam muitos estudos posteriores.
Uma curiosidade é que ninguém deu muita bola para Mendel até bem depois da sua morte. Sua publicação do estudo foi citada meras três vezes em 35 anos — coisa que levaria muito jovem cientista de hoje à depressão, e a não conseguir financiamento de pesquisa.
Charles Darwin, embora contemporâneo de Mendel, não o conheceu. Somente em 1900 — após a morte de ambos — é que novos estudos em genética resgatariam estes estudos mendelianos, e em 1930 o britânico Ronald Fisher combinaria as colocações da seleção natural com a hereditariedade, vinculando pela primeira vez genética e evolução.

Brno para além de Mendel
Os cientistas, sobretudo biólogos ou agrônomos, sem dúvida verão significado em visitar este lugar histórico, mas Brno é interessante a todos — sejam entusiastas da genética ou não.
Ainda que a cidade não se compare a uma Praga ou Viena, ela tem seu centrinho jeitoso e uma certa tranquilidade não-turística que as duas outras não têm.
Um dia tranquilo aqui é bem passado. Foi o que eu fiz, vindo desde Vsetín, e após visitar Olomouc. (A depender do passo, você pode ver as duas num mesmo dia, mas se estiver acompanhado e preferir pegar leve, melhor vê-las em dias separados.)
Da estação ferroviária central de Brno (Brno hl. nádraží), você facilmente caminha a pé por todo o centro histórico, sua principal zona de interesse.



Eu por ali andava, naquele dia de verão, pelo centro da cidade movimentada de tchecos e bem pouco visitada por turistas.
Não demorei a encontrar a famosa torre da prefeitura e, logo, a colina central da cidade onde se encontra o seu principal monumento.


A Catedral de São Pedro e São Paulo, principal marco da cidade, fica numa breve colina apelidada de Petrov — pelo nome do santo.
Você vai devagar subindo, e encontra imagens sacras em tamanho real pelo trajeto, até chegar ao esplendor arquitetônico que combina elementos góticos, neogóticos, e barrocos (no interior).


Esta catedral teve o início da sua construção ainda no século XI, mas ela demorou de deslanchar.
Séculos se passaram com a edificação em obra (como se sabe pela atualidade, às vezes falta dinheiro). A Guerra dos Trinta Anos no século XVII (1618-1648), entre católicos e protestantes, também viu estas terras tchecas atacadas pelos partidários da Reforma vindos do norte da Europa.
Foi assim que o interior da igreja acabou sendo barroco, por a obra ter se dado — ou sido reconstruída após os ataques — no século XVIII. Já o exterior, em estilo neogótico, foi completado no século XIX. Quase um milênio depois, em 1905 é que a obra se deu por completada.



Brno é uma visita breve. Há algumas outras igrejas na cidade, assim como o Castelo Spilberk (não confundir com Spielberg) numa outra colina aonde você pode subir para ter a vista aérea de Brno. Não cheguei a conhecê-lo, mas fica a dica.
Falando em castelos e guerras, a famosa Batalha de Austerlitz (1805) se deu bem pertinho daqui. Foi a chamada “Batalha dos Três Imperadores”, quando Napoleão enfrentou os austríacos dos Habsburgo e o imperador da Rússia — e os venceu.
Foi das grandes vitórias napoleônicas, que entre outras coisas poria fim ao milenar Sacro-Império Romano Germânico (800-1806). Não vi nada sobre a batalha na própria Brno, mas se você for aficionado pode ir à vila hoje chamada de de Slavko u Brna — dantes Austerlitz — a poucos quilômetros de distância hoje há uma exibição. (Mais neste site oficial.)
Por ora, eu encerrava a minha peregrinação a esta segunda cidade da Tchéquia. Prazer em conhecê-la.
Nossa!… que cidadezinha encantadora. Linda !… Cada cidade é mais bonita que a outra!…. Uauu. Que região magnífica é essa, meu jovem amigo viajante? inusitadas. Nem sabia desses tesouros escondidos na Europa Central. Apaixonantes, todas elas. Voce olha e fica fascinad@. E fica sem saber qual a mais bela. Sua amiga aqui, no momento está nesse dilema hahaha. Lindíssima.
Não consigo descobrir o que mais me atrai e balança o coração encantado, nesta Brno, se as belas linhas arquitetônicas, se o casario lindo colorido, de encher os olhos, se seus templos pujantes, se seu conjunto harmonioso e delicado se seu espírito medieval ou se tudo junto., hahah. É simplesmente fascinante essa região central da Europa, em particular esse pedacinho lindo de chão e rico de história que é a Tchequia. Impressionante. amei.
Salve, salve Gregor Mendel e suas descobertas fantásticas. Não conhecia a cidade nem o sabia nascido ai. Os livros falavam apenas que era abade. Muito famoso e importante. E eu ficava a refletir como os religiosos eram interessados pela ciência nesses tempos antigos. Diferentes de hoje, quando alguns dizem e/ou aceitam que a a Terra é plana. hahaha.