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Polônia

Zakopane no inverno e as montanhas Tatra, Polônia

Estou eu ali de costas na ponte tirando foto. Há um quê de mágico em Zakopane, a principal cidade montanhosa da Polônia.

A Polônia tem montanhas??“, você pode estar se perguntando. Sim, sempre teve. As Montanhas Tatra fazem a fronteira natural entre a Polônia e a Eslováquia, e há muito elas são famosas em todo o chamado Leste Europeu.

Se, durante a Guerra Fria, os ocidentais na Europa iam todos aos Alpes, aqueles deste lado de cá, oriental, sob a cortina de ferro comunista vinham às Tatras — como são carinhosamente chamadas. Apesar do que possa ser dito em termos de liberdades civis ou direitos políticos, as pessoas ainda assim tinham vida, e vinham às montanhas.

Zakopane ainda hoje é um destino bem mais em conta (e perto de casa) aos poloneses que ir às comparativamente caras Suíça ou Áustria. Tchecos, eslovacos e húngaros vão às Tatras do lado sul, na Eslováquia. Eu vim cá do lado polonês a conhecer esta cidade famosa na região, em plena véspera de Natal.

Montanhas Tatra
As Montanhas Tatra durante os meses quentes do ano são excelente ambiente onde fazer caminhadas. Seus picos ficam entre 2.000-3.000m de altitude.
Zakopane no mapa
Onde estamos.
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No inverno, o lugar naturalmente adquire outra atmosfera. Muitas pessoas vêm aqui para esquiar. Há teleféricos os levando às estações no alto das montanhas.
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Eu aqui neste inverno em Zakopane, com suas típicas edificações em madeira e os pinheiros.

Zakopane no inverno

Eu não esquio — em verdade, tenho pavor de esportes de inverno; já os pratiquei, e sempre tenho a impressão de que só não quebrei uma perna ou qualquer osso por sorte.

Zakopane, no entanto, não faz questão de que você esquie, ainda que seja esse o interesse de muitos que vêm aqui no inverno (dezembro-março). A cidadezinha de seus 30 mil habitantes em si, aos 1.126m de altitude, é um charme e um lugar pitoresco onde passear.

É claro que, se você for da turma das trilhas e não da neve, melhor vir cá nos meses quentes do ano (maio-setembro). Mas, mesmo sem esquiar, você vê as crianças escorregando com prancha das colinas e morretes da própria cidade na neve, adultos engraçadões tacando bolas nos amigos, e toda uma atmosfera de montanha com pinheiros, casas de madeira, comidas típicas à venda e, se você vier em dezembro, muita decoração natalina.

Casa tradicional de madeira em Zakopane
O casario típico de Zakopane em madeira.
Zakopane no inverno, Polônia
As casinhas típicas, acompanhadas de plantas, rochas, riachos ainda correndo, e toda uma atmosfera pitoresca com as montanhas ao fundo.

Vindo a Zakopane

Para chegar a Zakopane, a forma mais fácil é a partir de Cracóvia (Krakow), a antiga capital histórica da Polônia, de que já lhes falei anteriormente. Cracóvia é certamente a cidade mais turística que há no país, que antes (até os idos de 2010) me parecia só conhecida dos estrangeiros mais viajados, mas que hoje caiu no conhecimento geral. Foi descoberta.

De Cracóvia a Zakopane, a melhor forma de viajar é de ônibus. Um FlixBus, que você reserva online com facilidade pelo site oficial da empresa, parte todas as horas da rodoviária e faz o trajeto em cerca de 2h15. Viajar de trem também é possível, mas ele é muito mais lento (3h30) e dificulta um bate-e-volta.

Em Cracóvia, basta buscar pelos sinais na estação Krakow Glowny (ou no reluzente shopping anexo Galeria Krakowska) dizendo Dworcec Autobusowy. É a rodoviária, às vezes indicada nos tickets como Krakow MDA, e que fica logo atrás da estação de trens. A de Zakopane também fica junto da ferroviária. Não há mistério.

A FlixBus oferece wi-fi a bordo, é pura seda, e o tempo de viagem permite que você faça tranquilamente um bate-e-volta desde Cracóvia. Se quiser explorar as vizinhanças, conhecer mais da natureza da região ou praticar esportes de inverno (ou trilhas no verão), aí eu recomendo hospedar-se uma noite ou mais.

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A estação rodoviária em Cracóvia, anexa à ferroviária principal, Krakow Glowny. Fica no fundo. Note que há dois andares, e as plataformas G (de onde saiu meu FlixBus) ficam no andar superior.
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Você, ao entrar na cidade, já vislumbra as montanhas cobertas de neve ao longe no horizonte.

Passeando por Zakopane na véspera de Natal

Tal qual Regina Duarte, eu tive medo; neste caso, medo de dar com os burros n’água e encontrar uma cidadezinha vazia, com tudo já fechado pelo Natal.

Quem circula pela Europa sabe que, em muitas partes do continente, dias 24 e 25 já são aquele ambiente vazio — meio pós-armagedon — nas cidades. As pessoas estão com as suas famílias, as lojas estão fechadas, e as coisas só reabrem 26 ou, muitas vezes, 27 de dezembro (já que 26 de dezembro também é feriado em muitos países europeus).

Não foi esse o caso aqui em Zakopane. Para começo de conversa, a cidade se revelou maior do que eu a imaginava. Não se trata de um vilarejo perdido na montanha (talvez há 100 anos atrás), mas de uma cidade com certo porte, muitas redes de hoteis e lojas internacionais conhecidas (H&M, Costa Coffee, McDonald’s, etc.) 

Ao que desembarquei na rodoviária para aquelas ruas molhadas e geladas, de neve derretendo, não faltavam famílias circulando, gentes polonesas e alguns estrangeiros, e pais ainda puxando crianças pequenas em trenós de plástico sobre o gelo que ainda havia.

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Criança diante de um tio vestido de urso polar que parou para descansar e tomar um ar, em Zakopane neste inverno.
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As ruas de Zakopane cobertas de neve, com as suas típicas casas de madeira.
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A imponente montanha coberta de neve e meio escondida pelas nuvens como pano de fundo às casas de Zakopane, sul da Polônia.

O destino de quase todos aqui caminhando era a rua Krupówki, o calçadão central onde ficam as principais lojas, restaurantes, e todo o principal da vida turística desta cidade.

Ainda que fosse véspera de Natal, quase tudo estava funcionando. Não faltavam barraquinhas vendendo o típico queijo de ovelha defumado destas montanhas (oscypek), mel, e outros quitutes. Havia as vendas de quentão (o vinho quente com especiarias), e as lojas comuns.

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A rua Krupówki, no centro de Zakopane. Algo melada neste inverno, mas faz parte.
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Simpáticas barraquinhas vendendo produtos típicos da região: mel, geleias, queijo de ovelha defumado, e banha de porco (vendida no frasco), que eles aqui ainda usam para cozinhar ou simplesmente passada no pão.
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Oscypek, o queijo de ovelha defumado que você hoje encontra noutras partes da Polônia, mas que é típico aqui desta região das montanhas. É vendido assim grelhado, às vezes com bacon enrolado em volta.

Esse queijo lembra um pouco o provolone. Tem uma textura macia por dentro, sobretudo quando grelhado, e um sabor meio apertado no sal. Por isso que se come dele geralmente com compota de frutas vermelhas, para o açúcar “rebater” o sal um pouco. Vale a pena experimentar. É do tipo que você come um pouco e já se satisfaz.

Os interessados podem ir conhecer mais sobre o processo de feitura dele no Muzeum Oscypka Zakopane, todo dedicado a essa tradição daqui e o modo de vida dos poloneses das montanhas. Uma guia lhe explica o modo de preparo, etc.

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O queijo oscypek, talvez o produto mais típico das montanhas do sul da Polônia. É vendido assim também neste formato para você levar para casa.
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Serve também com um bom quentão para rebater. Na rua Krupówki, em Zakopane.
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Quentão ou vinho quente, doce, com uma rodela de laranja dentro, cravo e canela.

O curioso foi notar que o maior ânimo da rua nesta véspera de Natal eram, na verdade, uma trupe de refugiados fazendo música. Exultavam alegria.

Alguns com violão, outros tamborilando na caixa, e uma criança no meio que depois se pôr a dançar. Veja no vídeo abaixo. Quero entrar o ano com essa empolgação.

Cogitei tomar o teleférico até uma das estações de montanha para ver a paisagem, mas como nublou, eu não veria nada. Decidi por não ir, mas você pode fazê-lo se vier aqui com o dia claro.

Fui visitar o Santuário da Sagrada Família, a principal igreja no centro da cidade. Estava com belas e grandes bolas vermelhas de Natal à entrada, assim como uma imensa cruz — com coroa de espinhos e tudo — no pátio à frente da entrada. Os poloneses gostam de erigir cruzes. Aquilo de repente deu-me uma sensação meio Sexta-Feira da Paixão, fora de época, e recobrei-me que era Natal.

Embora cinzento por fora, por dentro o santuário é pleno de cores e cheio de vida. Surpreendeu-me, eu acostumado aos interiores por vezes soturnos das igrejas de pedra nesta Europa Central

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O Santuário da Sagrada Família (Sanktuarium Najświętszej Rodziny) em Zakopane, Polônia. Neo-romanesca, ela data de 1877.
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O belo — e colorido — interior do Santuário da Sagrada Família em Zakopane.
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O altar principal, com árvores de Natal ali embaixo.

Driblando poças d’água descongelada, pois que a temperatura subia um pouco acima de zero, eu segui caminhando toda a extensão da rua Krupówki até rever as montanhas.

As casas pitorescas de madeira me acompanhavam; algumas aparentemente vazias, outras com luzes acesas e gente dentro. Numa, uma moça que fumava na sacada escondeu-se ao me ver fotografar. Outras várias casas seguem  o mesmo estilo arquitetônico anguloso, mas já de tijolos e cores claras.

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Driblar o gelo é preciso.
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Eu ali na paisagem, sobre a ponte. Recobrando a vista para as montanhas.

Há uns belos riachos que ainda correm por entre essas pedras e debaixo da ponte, suas bordas já congeladas enquanto um filete segue rápido no meio, sem congelar.

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Em Zakopane, Polônia, com as Tatras lá atrás.
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O casario típico, com uma quituteria ali dentro.
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As casas me acompanham, ou eu é que as sigo.
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Cada uma parecia uma obra de arte de carpintaria maior que a outra.

Dali, eu retornava a Cracóvia, de onde vos escreverei em breve. Um dos últimos FlixBus do dia apareceriam à estação com o “sortudo” motorista que precisou fazer serviço à véspera de Natal. Uma família espanhola perambulava pelas placas fixas que diziam pouco na rodoviária, a se questionar se o ônibus viria mesmo ou se ficariam ali ao relento.

Seguimos. Caiu a noite na estrada. O motorista foi até simpático (eu previra alguém bastante ranzinza por ter que estar trabalhando neste horário), com seu polonês cortês. Negou entrada a alguém que estava sem passagem, não havia comprado pela internet e queria fazê-lo com o motorista, o que não é possível (tende em conta). Se a moça acabou por passar a noite de Natal ali com o namorado que a trazia até a rodoviária, eu não sei. Eu sei que segui embora a Cracóvia, Zakopane em meus olhos. 

Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

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