Até o próprio nome já nos evoca algo mimoso e belo: Alberobello parece uma cidadezinha de brinquedo ou feita sob medida para turistas, mas ela é real, habitada, e típica. Tanto que é Patrimônio Mundial da Humanidade tombado pela UNESCO por sua autenticidade.
Estamos no sul da Itália, cá no salto da bota na Região da Puglia, uma das mais fascinantes. (Ver mapa abaixo.)
Bari, a capital regional, é o lugar a ter como ponto de apoio. Escreverei sobre ela. Dali, o mar é o limite para vir conhecer as muitas cidades belas que a Puglia tem. Alberobello — embora longe de ser a única — é provavelmente a mais famosa delas.
“Os turistas japoneses e chineses adoram ir lá tirar foto“, disse-me risonho Pier, meu anfitrião. Era um italiano amorenado aqui do sul, com jeito cordato mas que não escondia sua irreverência italiana. Era o dono do apartamento onde fiquei em Bari.
Bem-vindos — é hora de iniciarmos umas andanças por aqui.



Os Trulli: As casinhas de pedra branca e sua história
Estas casinhas redondas de pedra branca se chamam trulli (um trullo no singular), e se encontram por toda esta região pugliesa chamada de Vale de Ítria, que tem Alberobello como seu sítio mais famoso. O lugar todo é hoje tombado pela UNESCO como Patrimônio Mundial da Humanidade pela singularidade e autenticidade histórica.
Estas edificações têm origem no século XVII, antes da Unificação Italiana. Todo o sul da Itália era posse da Coroa Espanhola. Havia uma coroa do Reino de Nápoles (todo o sul continental da Itália) e a coroa do Reino da Sicília (a própria), ambos então sob o controle dos espanhóis. Havia aqui um Vice-Rei de Espanha da mesma forma como havia nas Américas.
A Coroa cobrava um imposto por casas de argamassa, ao que o duque da região malandramente determinou que as pessoas fizessem casas aqui sem argamassa para não ter que pagar o imposto. Apenas pedra nua era permitido, o que levou os aldeãos daqui a então fazer casas redondas para maior estabilidade.
Eis o resultado: múltiplas casinhas de pedra calcária da região, caiadas direto na pedra (isto é, com um mão de cal para a brancura), enquanto que os telhados são deixados cinzentos.



Visitando Alberobello
Eu recomendo a todos vir conhecer de perto esta Puglia que pariu tanta beleza — e recomendo vir cedo no dia. Estamos no sul da Itália, cercados por rocha, sem muitas árvores, num ambiente que lembra a Grécia.
As ruas debaixo do sol ficam deveras quentes no meado do dia e durante a tarde, sobretudo se você vier entre maio e outubro.
Essa também é a alta estação (sobretudo entre junho e setembro), e não duvide por um instante sequer que isto aqui se transforma numa Disneylândia plena de turistas. O grosso deles, entretanto, chega só a partir das 10h da manhã (muito poucos dormem em Alberobello), então se quiser ter os trulli mais em paz para si, recomendo vir antes.
O site da Trenitalia, a companhia ferroviária estatal italiana, é o canal para identificar os horários de transporte. Há saídas de Bari quase todas as horas, e em coisa de 1h se chega a Alberobello. Eu vim logo às 8:00, e às 9:00 já estava por aqui a passear na manhã.



Eu não costumo gostar muito quando dizem que meu trem será substituído por um ônibus, portanto não tomei como boa notícia da Trenitalia. O único consolo foi que eu já sabia de véspera, quando pesquisei a passagem online e vi os horários de saída.
Na manhã da zarpada a Alberobello, descobri o quanto as estações ferroviárias de Bari Centrale — há umas 3 ou 4 Bari Centrales diferentes, cada uma de um lado da praça — são labirínticas.
Cada qual funciona para uma linha ferroviária distinta, mas depois eu explico isso. Daí a descobrir de onde exatamente o ônibus sairia foi uma adrenalina. A sorte foi encontrar uma gente com cara de turista ali esperando.


Depois do breve pega-para-capar para entrar no ônibus, já que não havia lugar marcado e parecia haver mais gente a embarcar que espaço, a viagem foi tranquila. Eram ainda meados da manhã quando eu cheguei a Alberobello, a cidade ainda terminando de acordar.
Não há muito o que ver na parte moderna. Detive-me numa padaria — pois ali as coisas são bem mais baratas que na parte turística dos trulli na cidade — e fui ver a Basílica dos Santos Médicos Cosme e Damião, dos poucos monumentos que há. Em estilo neoclássico, ela data dos albores do século XVII, no período espanhol.
Cosme e Damião foram irmãos gêmeos de origem árabe que viviam na Síria greco-romana da Antiguidade, e que praticavam a medicina de forma gratuita aos necessitados. Foram martirizados nos idos de 300 d.C., e seguem muito populares por todo o mundo latino e mediterrâneo. São os padroeiros aqui de Alberobello.



Circulando pelos trulli
Eu hoje teria um dia longo pela frente. Você pode passar o dia aqui “sentindo” os trulli e seu ambiente, mas a verdade é que umas duas horas aqui circulando e você já terá tido sua experiência. Ao menos foi assim comigo — e eu já me conheço, então planejei seguir ainda ao fim da manhã para Locorotondo, outra cidadezinha pitoresca aqui bem perto.
Há por Alberobello trulli autênticos que são residências ou até pequeninas pousadas, mas o grosso deles fica numa área de poucas ruas exclusivas a pedestres, com alguns sobes e desces, e quase todos eles transformados em lojinhas para turistas. Se os telhados fossem azuis, diria-se estar em Santorini.



Alberobello na área preservada dos trulli é mesmo uma coisa quase cenográfica, com casinhas brancas grudadinhas com seus “chapéus” cônicos no telhado.



A saber, algumas lojinhas destas só abrem a partir das 10h, quando começam também a chegar a maioria dos turistas. Vale a pena estar cá já um pouco antes para sentir a paisagem do lugar na paz, e depois adentrar para ver os souvenirs.
Por dentro, as lojas são “normais”, às vezes com o vão cônico sob o teto, mas tudo muito simples. O pitoresco é mesmo o exterior, que faz parecer que você está no Condado dos hobbits ou algo assim.




Há lugares que permitem que você suba ao teto, para ter a vista de belos belvederes. Há também a igreja feita em trulli, e que você verá sinalizada nas placas aqui.
É como estar um pouco num parque temático, mas com lastro histórico de autenticidade.




Cogitei almoçar por aqui, mas acabei por decidir tocar caminho para Locorotondo primeiro. Não há muitos trens regionais para lá, e haveria um dentro em breve. Dez minutos e você passa desta para outra joiazinha da Puglia. Esta região da Itália ia aos poucos me cativando…