(Este será um post longo.)
Eis Belém do Pará, das cidades que mais me encantei de conhecer este ano — uma capital estadual pujante, riquíssima de cultura.
Nós de outras partes do Brasil, sem conhecer o Pará, estamos um pouco como naquele escuro do famoso Mito da Caverna, vendo — de longe — apenas sombras e lampejos desta rica cultura amazônida. Que graça é poder finalmente ver de perto esta luz.
Cada lugar tem a sua, naturalmente. É que a paraense é por demais pouco conhecida ainda.
Eu conferiria pessoalmente a história dos encontros “antes ou depois da chuva”, o magnífico Theatro da Paz, do século XIX; o famoso Mercado Ver-o-Peso; a estonteante Basílica de Nossa Senhora de Nazaré (onde todo outubro se dá o Círio de Nazaré, a maior festa cristã do Brasil). Eu provaria das comidas paraenses típicas, e aprenderia sobre como este lugar foi fundado tão próximo de Portugal sob o nome de Feliz Lusitânia, antes de passar a se chamar Belém.
Por onde começar? Pela chegada, talvez.

Instalando-se em Belém: Onde ficar, onde fiquei
Eu não sabia bem o que esperar de Belém do Pará. Estrangeiros que já a haviam visitado me falavam dela como uma cidade agitada. Eu sabia ser ela uma cidade equatorial, por supuesto; portanto, o calor amazônico eu tomava por certo. Havia ouvido falar das mangueiras nas ruas; e no mais eu sabia do Círio de Nazaré, e buscaria aprender mais do que houvesse de histórico aqui.
Não sei que coquetel esses ingredientes aí todos fazem, sei que cheguei curioso, interessado, e a emenda saiu melhor que o soneto. Quando saí do Aeroporto Internacional Val-de-Cans, deparei-me com uma capital amazônica moderna.
Val-de-Cans, que eu (mal habituado com o meu próprio estado) achei que fosse o sobrenome de algum político local desconhecido, tem até uma história interessante. Aliás, duas, pois ninguém sabe se esse “cans” abrevia canus ou canis em latim.
Uma versão reza que se tratava de uma comunidade de negros idosos neste que é hoje um bairro de Belém. Canus em latim pode se referir a (gente de) cabelos brancos. Em 1895, o governador Lauro Sodré teria passado aqui de barco, visto toda aquela gente grisalha, e exclamado “Isto aqui é um verdadeiro val de canus!”
Já a outra versão sugere algo mais antigo, um “Vale de cães” que se referiria a um canil da fazenda dos missionários católicos da Ordem das Mercês que havia aqui no século XVII. Sim, Belém é relativamente velha, embora quase nada nós outros de fora saibamos acerca dela — ainda.
Val-de-Cans hoje é um aeroporto conveniente, a meros 8-10 Km do centro de Belém, e com até voos internacionais diretos para a Europa. Sempre houve mesmo, como muitos realçam, uma relação daqui mais próxima de Portugal que com o restante do Brasil.

Belém traz um misto de casas coloniais de estética portuguesa e prédios modernos — avizinhados aqui e ali pelas habituais farmácias 24h, bancos, e McDonald’s ou Burger King da vida. Belém, em certos aspectos, é mais semelhante a outras cidades brasileiras que supõe a vossa vã filosofia.
A boa arborização lhe quebra algo do calor que teria. Embora estejamos praticamente à linha do equador, eu não a achei mais quente que Salvador ou Aracaju ou Maceió, enquanto que é notavelmente mais fresca que Manaus ou Santarém.
As ruas têm valas imensas ao meio-fio para levar embora a água abundante das chuvas torrenciais que batem aqui de dezembro a maio, mas nesta época do chamado verão amazônico (julho a novembro) eu não peguei uma só gota de chuva, e tomando cuidado na rua você se assegura de não enfiar a perna no lugar errado.
Os bairros de Nazaré, Umarizal, e Campina são todos adjacentes ao centro e dos mais cotados na hora de escolher onde se hospedar em Belém. Guardadas as devidas diferenças, lembram lugares como a Savassi de Belo Horizonte ou o Batel em Curitiba — bairros suficientemente perto do centro, mas já mais tranquilos e de poder aquisitivo maior.
As atrações de Belém são algo espalhadas. Uber aqui lhe será de grande valia, já que não há metrô. O centro possui espaços muito agradáveis, mas é mais um lugar onde ir passar uma manhã do que onde se hospedar. Não falta o que ver em Belém do Pará para ocupar facilmente 3-4 noites — isto sem contar escapadas de 1 dia ou 2 à Ilha do Marajó.
Vamos. É hora de pôr os pés do chão e conhecer esta cidade.



Feliz Lusitânia: a Belém histórica
Eu sempre gosto de começar pelo começo, para ajudar tudo o mais a fazer mais sentido.
Feliz Lusitânia foi como Belém do Pará começou, em 1616. À época, o domínio português sobre a colônia ainda era tênue e muito limitado às principais cidades costeiras como Olinda, Salvador e Rio de Janeiro. Os franceses haviam então vindo e ocupado parte desta costa norte, tendo explorando as costas da Guiana em 1604 e instalado na colônia portuguesa uma chamada França Equinocial em 1610. Em 1612, fundaram a atual capital maranhense, São Luís, assim batizada em homenagem ao rei Luís XIII de França.
Os franceses já haviam tentado — e falhado em — tirar um quinhão de terra dos portugueses com sua França Antártica no Rio de Janeiro em 1555-1560. Agora, tentavam uma segunda vez cá no norte, e prontamente estavam enviando exploradores a mapear as terras do atual Pará.
Isso acendeu a luz vermelha entre os portugueses, que em 1615 enviaram expedições desde a Capitania de Pernambuco para expulsar os franceses. Conseguiram vencer a 4 de novembro daquele ano, e pouco mais de um mês depois — no dia de Natal — já estavam despachando uma expedição militar sob o comando do capitão Francisco Caldeira Castelo Branco para estabelecer uma posição portuguesa Amazônia adentro, no que se tornaria Belém do Pará.

Belém, presépio… Todos esses nomes advêm do fato de a expedição daquele Castelo Branco ter partido de São Luís no dia de Natal.
Quando chegou aqui a 12 de janeiro de 1616, a expedição fez um fortim de madeira — que precedeu esse de pedra da foto — e fundou Feliz Lusitânia, o primeiro nome que este novo povoado teve antes de ser elevado a município com o nome de Santa Maria de Belém do Pará.
É claro que, entre portugueses e franceses, todos eram cobiçosos invasores. Povos Tupinambá, Pacajá e outros habitavam esta terra há milênios, incluso com a frutuosa cultura marajoara. Seguiu-se, porém, aquela conhecida sequência de dizimação das populações indígenas por doenças contagiosas trazidas de fora e, depois, campanhas militares de conquista.
Portugal iria aos poucos instalar-se no atual Pará ao longo do século XVII, iniciando a fundação das 23 cidades paraenses que hoje levam nomes homônimos de cidades portuguesas, como Santarém, Aveiro e outras, sobre o sangue indígena. Em revanche, o sangue e a cultura indígena penetrariam-lhe: o Pará de hoje é inegavelmente mais indígena que português.
Os resquícios do que foi Feliz Lusitânia estão hoje na praça do que hoje é chamado Cidade Velha em Belém, um complexo que inclui: a Catedral Metropolitana, o Forte do Presépio, a Casa das Onze Janelas e outros prédios históricos tombados. É uma ótima (e pequena) área onde circular a pé por algumas horas e almoçar.


Com a expulsão dos jesuítas do Brasil por ordens do Marquês de Pombal em 1759, essa igreja passou a estar dedicada a Santo Alexandre, bem-quisto lá na terrinha.
Belém cultivaria uma relação próxima e toda especial com Portugal. Como já realcei noutro post, o Grão-Pará teve governo próprio — distinto do Estado do Brasil — durante muito do período colonial, como se fosse uma colônia à parte.
Além disso, Belém ficava a apenas 7 semanas de navio da Europa, comparadas às 15 semanas que os portugueses levavam para chegar a Salvador e 20 a 21 semanas para chegar ao Rio de Janeiro. Sendo assim, muito daqui vinha direto de Portugal.


Esta Cidade Velha não é tanto um bairro inteiro como é o Pelourinho em Salvador nem uma cidade inteira como é Olinda. Ela é mais um conjunto arquitetônico em redor dessa praça, numa área bem vigiada, bem mantida, e voltada mesmo à visitação turística. (Em outras palavras, fez-se certa gentrificação aqui, isto é, uma transformação do ambiente urbano de modo a voltá-lo para pessoas de renda mais alta e sem grande envolvimento da população local.)
A Belém mais “povão” você encontrará no obrigatório Mercado Ver-o-Peso. Daqui a pouco iremos lá.


Esta Casa das Onze Janelas me lembrou em algo o Pateo do Collegio em São Paulo, aquele lugar histórico com jardim e transformado em centro cultural. Com a diferença de que aqui há calor equatorial e rio — as águas plácidas e tropicais da Baía do Guajará bem ali.



Ali você fica um tempo sentindo o ambiente agradável.
Entre as palmeiras e as arcadas amarelas claras que emolduravam a minha vista para a mangueira e as águas do rio Guamá, passavam visitantes, turistas vindos de longe no Brasil (não detectei nenhum estrangeiro), inclusive uma moçoila que muito me recordou Sierva Maria de Todos los Santos, a personagem principal — de longuíssimos cabelos avermelhados — de Do Amor e Outros Demônios (1996), obra de Garcia Márquez.
Eu divagava neste gozo idílico de tranquilidade tropical. Cartagena, afinal, está logo ali.
As salas de exibições em si não me acenderam muito o periquito, mas é que eu não ligo tanto para arte contemporânea. Já o restaurante Casa do Saulo me encantou. É por ele que vale a pena visitar esta parte de Belém à hora do almoço.

Vim, almocei, e gostei. O lugar todo é pacato e agradabilíssimo. Só não vou incensá-los ainda com as fotos de comida porque quero guardar o apetite de vocês para quando eu for provar coisas típicas noutros lugares aqui em Belém.
Basta saber que tomei um lindo suco de bacuri e comi bem, com creme de cupuaçu de sobremesa ao que escutava o “ai menina, vem, vem pra a roda, vem” de Lia Sophia, eu que já havia me familiarizado com o ritmo paraense do carimbó lá em Alter do Chão. Vale a pena passar uma manhã calorosa destas de Belém aqui, com suor na testa, e terminá-lo à brisa que sopra ali ao restaurante.
Visita obrigatória neste pedaço aqui ainda é a impressionante Catedral Metropolitana. Ela é humilde por fora, mas por dentro é um desbunde artístico que faz você pensar que está na Europa em vez da Amazônia. Cousas da nossa história.





Domenico de Angelis (1852-1900) passou mais de 20 anos aqui com seus alunos, ele que veio ao Brasil na prosperidade do ciclo da borracha (no fim do século XIX) e pintou também partes do Teatro Amazonas, em Manaus.
A catedral tem também o maior órgão de tubos da América Latina, com 13 mil deles. Parece realmente que você está na Europa, tão distinta que ela é das demais igrejas barrocas de época do Brasil colônia.



Quem só associa influência italiana ao Sul e Sudeste do Brasil terá um nó na cabeça. Mas é que a pujança amazônica da era da borracha atraiu gente urbi et orbi, como ameaça fazer de novo, desta vez espera-se que com a sustentabilidade e de maneira mais inclusiva. Belém tem a primeira catedral brasileira com 100% de energia solar.
Mas toquemos este amazônico barco, pois embora viva da graça de Deus, o homem também precisa de farinha e outros equivalentes brasileiros do pão encontrados nestas bandas do nosso Pindorama.

O Mercado Ver-o-Peso e a Belém popular
Se você gosta dessa coisa “de raiz” ou de cultura popular (tanto gastronômica quanto de artesanias), Ver-o-Peso é seu lugar.
Não é difícil deduzir a razão do nome desse mercado. Já nos idos de 1625, os portugueses trataram de instalar aqui um posto fiscal que se encarregava de medir — e taxar — os bens oriundos da Amazônia e exportados à Europa. Tanto incluía carne dos rebanhos postos na Ilha do Marajó quanto as chamadas “drogas do sertão“, o curioso nome da época para designar produtos nativos brasileiros como castanha-do-pará, guaraná, ervas medicinais e outros. Estes ficaram conhecidos também pelo nome de “novas especiarias“, já que eram distintas daquelas que os portugueses se habituaram a comerciar desde a Ásia (gengibre, cravo, canela, pimenta-do-reino, noz-moscada, etc.).
O que começou naquele século XVII como o entreposto fiscal da Casa de Haver-o-Peso virou, em 1900, o Mercado Ver-o-Peso que há hoje — uma quintessência de Belém.
Ele não é um mercado todo fechado nem contido em si; é um conjunto de galpões, mas também muito do lado de fora, ao (caloroso e odorífero) ar livre.








O Ver-o-Peso é um universo em que tudo cabe.
Se vier à hora do almoço, terá bem onde almoçar em meio à organizada barracolândia, cada área ou galpão dedicado a um tema — das garrafadas, às artesanias, e aos peixes.
Só se prepare para o calor. Os vendedores se queixavam da cobertura de lona que o governo lhes pôs, dizendo-a pouco arejada — e suar é preciso. Ao que se escapa do sol, entra-se no teor daqueles vendedores e espaços exíguos, em que se navegam os caminhos em meio a transeuntes, ervas, e o cacarejar de galinhas e patos engaiolados.
Só a parte de peixes é que fede, verdade seja dita. Ou, para usar o termo paraense, devora-lhe ali o forte pitiú de peixe, cuja força requer vocábulo Tupi para exprimi-lo com inteireza.
Se você quiser uma leitura romântica do Ver-o-Peso e até do pitiú, eu acho que não pode terminar este dia sem ouvir Dona Onete, esta força cultural do Pará, professora de História que só depois de aposentada aos mais de 60 anos começou a cantar.





A Estação das Docas: Experimentando açaí com peixe
Não há visita completa a Belém do Pará sem experimentar do quase-mítico açaí com camarão ou açaí com peixe. Todo mundo a esta altura já sabe que, se Brasil afora o açaí é consumido feito sorvete, aqui na origem ele é sobretudo um alimento de almoço, comido com pescados e farinha.
Você, naturalmente, pode bem fazê-lo no Ver-o-Peso, mas se preferir um ambiente climatizado e mais fino, pode vir à Estação das Docas, um dos espaços favoritos de Belém do Pará. Trata-se de antigas docas fluviais transformadas numa área boêmia de bares, restaurantes, sorveterias e algumas lojas. É um lugar excelente onde dar umas voltas — e vir experimentar o açaí original paraense no almoço.


Há artesanato e coisas-típicas-de-levar-pra-casa à venda aqui também, mas desnecessário dizer que quase tudo você encontra mais barato lá no Ver-o-Peso (onde se pode também negociar preço).
Meu foco era o almoço, para finalmente experimentar do açaí com peixe.

Algumas notas aos forasteiros. Embora estejamos na Amazônia, peixes como pirarucu e tambaqui não são daqui; você come deles no Amazonas e até em Santarém, mas aqui estamos mais longe e, se achar deles, será descongelado. Peixes mais característicos (e frescos) aqui em Belém do Pará são dourada, pescada amarela, e filhote (sim, há um peixe chamado filhote).
Segundo, ensinaram-me aqui que se come açaí com peixe, e não peixe com açaí. Ou seja, não se joga o açaí por cima do prato de peixe como se fosse um molho. Ao contrário, jogam-se os pedaços de peixe ou camarão dentro do pote de açaí (!), com farinha etc.


Esse açaí não leva açúcar nenhum — é somente mesmo aquele puro gosto de açaí.
O sal do peixe mistura-se à crocância da farinha grossa ali posta, envelopados todos no roxo caldo espesso do açaí. Você pode também alternar uma garfada no peixe com uma colher de açaí na boca.
Gostou? Eu não vou mentir dizendo que sim. Após uns pedaços, optei pelo peixe com farinha sem envolver o açaí nisso. É talvez um gosto de infância que eu não sei se adultos não-versados conseguem adquirir com facilidade. (Acho que houve motivos para o açaí ter ganho mercado mais como sorvete que como “sopa” de comer com pescado.)
Mas valeu a pena experimentar? Sem dúvida. Tudo pela experiência e pela etnografia, como eu às vezes digo quando chego nos lugares.
Depois, você dá um pulo na Cairu — sorveteria com quiosque aqui na Estação das Docas e em várias partes de Belém — para ficar com outro gosto na boca.

O maior monumento de Belém: O Theatro da Paz
O Theatro do Paz, inaugurado em 1878, é o irmão paraense do Teatro Amazonas em Manaus. É um irmão ligeiramente mais velho, diga-se de passagem, já que o amazonense se inauguraria quase duas décadas depois, em 1896. Aqui no Pará, usou-se e ainda se guarda a grafia antiga do tempo do Império.
Ambos são monumentos neoclássicos de (muita) inspiração europeia criados no período de bonança do ciclo da borracha na Amazônia. A Revolução Industrial estava a todo vapor no século XIX, e além de combustível fóssil e aço, as indústrias haviam descoberto as miraculosas propriedades da borracha para fins indispensáveis como o capeamento da fiação elétrica e a fabricação de pneus. Sem a borracha amazônica, esqueça a substituição das charretes por carros.
Este teatro era para ser chamado Theatro de Nossa Senhora da Paz. A paz evoca o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870), o maior conflito armado internacional da América Latina. Porém, a Igreja se negou a envolver-se com aquela coisa de mudanças peças de teatro que o conservadorismo da época ainda censurava, e proibiu a referência a Nossa Senhora. Ele seria apenas Theatro da Paz portanto, um lindíssimo monumento de época para se visitar aqui em Belém.
A entrada, mais acessível que aquela do Teatro Amazonas, sai por meros R$ 6 a inteira. Há saídas frequentes que você compra diretamente à porta do teatro durante o dia. Se preferir, há também peças nas noites. (Você confere a programação no site oficial.)
Venhamos conhecer.



O Theatro da Paz de Belém é uma fascinação. Cada canto guarda uma obra ou um detalhe.
O lustre no teto é francês, em cristal Baccarat, e o pano de boca também foi pintado na França — em Paris por um brasileiro, fazendo uma versão nossa da Mariane, figura feminina francesa usada na Revolução para representar a república.
A pintura no teto é mais uma obra dele, Domenico di Angelis, o pintor italiano radicado aqui. A obra chama-se Céu, e mostra os deuses greco-romanos Apolo e Diana no meio dos indígenas, com as musas gregas usando colares amazônicos nos pescoços e de peitos expostos à moda indígena.
O detalhe que mais chama a atenção é a figura da índia recusando o pergaminho da ciência, o que tanto pode ser lido como ingratidão diante das das “dádivas” do homem branco ou como uma não-subjugação cultural com crítica ao que os europeus lhes tentavam impor.




O Mangal das Garças e o Manjar das Garças
As belezas de Belém do Pará não param por aí. Eu ainda quero lhes mostrar o Mangal das Garças e a Basílica de Nossa Senhora de Nazaré, dois dos pontos mais visitados aqui.
Ao Mangal das Garças eu fui num destes fins de manhã, sol já no alto, e o calor a cobrar seu preço. Trata-se de jardins para a visitação, uma espécie de parque urbano com espelhos d’água, plantas nativas, e aves exuberantes.
Todo o acesso é gratuito, mas para os ambientes internos (museus, borboletário, etc.) se requer um ingresso-combo que você pega à bilheteria na entrada.
Há também uma simpática cafeteria e um dos restaurantes mais bem-quistos de Belém, o Manjar das Garças, mas que não é para os que estiverem viajando com o orçamento apertado, nem para os que comem pouco. Nos fins de semana ou feriados, paga-se R$ 99 para o buffet à vontade no almoço (bom estar aqui às 12h em ponto, pois lota. Algo caro, mas dizem ser das melhores comidas de Belém. (Criança paga meia.)



Você aí vê o céu sempre azul nestas minhas fotos de Belém, e eu preciso lhe dizer que nesta época do chamado verão amazônico (julho a novembro) não presenciei nem um dia sequer aquela coisa famosa do “antes ou depois da chuva”. Não choveu uma única gota d’água na semana que eu passei em Belém.
Ao contrário, o sol inclemente e nem sempre misericordioso só era amainado pela brisa e pelas mangueiras que decoram e purificam o ar de Belém.
Se vier cá ao Mangal, eu inclusive recomendo observar o horário, pois ao fim da manhã o senhor astro-rei já estará torrando as suas cabeças.
Os espaços internos são gostosos e climatizados, como as sombras também são frescos e o sol mesmo quente não deixa de ter a sua gostosura; mas eu me furtei a merendar neles, e acabei optando por uma água de coco com chopp à entrada do parque.
“Oi?? Água de coco com chopp?!”. “Os turistas sempre perguntam“, disse-me rindo o vendedor. Aqui no Pará, chopp é geladinho, sacolé, essa coisa de sorvete dentro de um saco, que cada estado do Brasil escolheu chamar de um jeito.




São muitos os cantos e recantos de Belém, mas eu não posso encerrar esta postagem sem falar no mais visitado de todos eles, aquele que atrai milhões de pessoas aqui todos os anos.

A Basílica de Nossa Senhora de Nazaré: o lugar mais visitado de Belém
A Basílica Santuário de Nossa Senhora de Nazaré nem é assim tão antiga. Sua construção foi iniciada apenas em 1909, quando muitas igrejas coloniais já estavam precisando até de uma reforma.
Porém, apesar da relativa juventude, ela é aos meus olhos uma séria candidata a ser a igreja mais bela do Brasil. Isso é até certo ponto subjetivo; objetivo é o fato de que ela atrai milhões aqui todos os anos no Círio de Nazaré, a maior manifestação católica em todo o país.
Uma visita aqui, independentemente da sua religião, seja por espiritualidade ou por apreço à arte, é uma visita a parte importante do coração de Belém.


O ventinho leve soprava, as pessoas aglomeravam-se a ver a missa. Do lado de fora, misturavam-se pedintes e estudantes sorridentes a vender coisas feitas em casa, de comer ou não. Coisas do Brasil nestes tempos.
A praça é agradável, um pátio calçado e cercado de grades, uma samaumeira imensa a despejar suas flores e seus odores sobre todos na outra ponta do largo em face à igreja.
Ao anoitecer, viam-se as figuras angelicais e de Nossa Senhora de Nazaré sob as luzes já acesas, a fachada neoclássica trazendo (mais uma vez) um quê de Europa a esta amazônica cidade.

A devoção, como tantas, vem de Portugal. Diz a lenda que a imagem original — hoje lá na igreja da Nazaré portuguesa — de Jesus sendo amamentado por Maria teria sido esculpida pelo próprio São José, carpinteiro, e que teria sido levada embora da Terra Santa por um monge cristão.
Os detalhes aí se seguem sobre como a imagem sumiu e foi redescoberta na Idade Média, mas os detalhes disso eu vou deixar pra contar quando visitar a Nazaré portuguesa.
Aqui, as pessoas parecem-me pouco preocupadas com esse passado ou simbolismo português conferido a Nossa Senhora de Nazaré. Acredito que, no Pará, ela ganhou devoção própria.
Aqui, um caboclo teria encontrando uma imagem num igarapé. Levou-a para casa, onde começou a operar milagres. Daí, ainda no século XVIII, começariam as romarias que se desdobrariam no círio (nome que, do latim, vem de “cera” e se refere a uma vela grande). A festa aqui se dá no segundo domingo de outubro, e reúne mais de dois milhões de pessoas todos os anos.




Há, naturalmente, a lojinha ao lado onde comprar souvenirs, fitinhas coloridas de amarrar (ao estilo daquelas do Senhor do Bonfim da Bahia), e até “vinho canônico” (!).
Belém é mais que uma caixinha de surpresas, é uma cornucópia de abundância cultural e coisas para conhecer. Eu quis aqui dar uma palhinha, um amostra do que esta cidade me mostrou.
Tenho certeza absoluta de que vou retornar.
Maníssimo, cá estou lendo suas dicas, a caminho de Belém! Obrigada ❤️