Pense numa cidadezinha fofa e pitoresca, com o seu castelo, e de que você provavelmente nunca ouviu falar. Essa é Vianden, uma das pequenas cidades no interior do pequeno país de Luxemburgo.
É que a gente até esquece que Luxemburgo tem outras cidades para além da sua capital homônima, pequeno que ele é. O país pode ser menor que a área da Região Metropolitana de São Paulo, mas é o suficiente para ter uns vilarejos como este aqui, de pouco mais de 2.000 habitantes, mas com um vetusto castelo do tempo dos romanos.
O que você vê hoje não é mais a fortificação romana, por supuesto, mas o que se erigiu sobre ela no medievo e, depois no Renascimento. O Castelo de Vianden chegou a ser abandonado nos tempos modernos, para então ressurgir hoje como destino turístico — que nós vamos ver.
A cidadezinha em si também é um charme. Como diria um suíço amigo meu: “Fede a dinheiro“, com os carrões de marcas impossíveis a passar nas ruas estreitas de casario antigo. Descontam-se os carros (a menos que você seja fã), que são uma certa inconveniência ao transeunte; aproveita-se o belo lugar, suas casas e seu entorno histórico, neste rico país que nada em dinheiro e bem preserva o seu legado.




Quem és tu, Vianden?
“Quem é?“, pergunta aquela voz de interesse de alguém bem apessoado, mas cuja existência era desconhecida.
Vianden já foi um dos condados do Sacro-Império Romano Germânico, aqui neste miolo da Europa, na interseção entre o que são hoje França e Alemanha.
Os condes de Vianden são mencionados pelo menos desde 1090, e para lhe dar uma referência dessa boniteza que você acaba de conhecer, a família governante é uma dos ancestrais dos Nassau, aqueles holandeses que governaram parte do Brasil no século XVII.
O Condado de Vianden foi o mais poderoso desta região que abarca hoje o sul da Bélgica francófona, o extremo oeste da Alemanha, e a região da Lorena na França. Isso nos idos dos séculos XI e XII. Logo depois, acabariam por se tornar vassalos dos condes e então duques de Luxemburgo.
Entretanto, o título distinto se manteve — como em Portugal se dizia por muito tempo ser rei de Portugal e Algarves —, e quem chegou a ostentá-lo como conde de Nassau e de Vianden foi Guilherme de Orange, o taciturno (1533-1584), quem liderou a revolta holandesa contra o domínio espanhol e que constituiria os Países-Baixos como um estado independente.

Ele chegou a viver aqui, até que em 1566 partiu para liderar a revolta local contra Filipe II da Espanha. As terras a norte daqui eram parte constituinte do Sacro-Império então governado pelos espanhóis, e passaria a se tornar a República dos Países-Baixos.
Eles, holandeses, viriam a brigar com Portugal nos idos de 1600 menos por inimizade contra os lusos e mais porque Portugal havia passado à coroa de Espanha entre 1580 e 1640.
Vianden e todo o então Ducado de Luxemburgo, porém, não teve sucesso em se juntar às sete províncias que formariam a Holanda — foi como aquele amiguinho que não conseguiu escapar quando todos deram em debandada.
Os Habsburgo de Espanha e depois os da Áustria, parentes reais que se alternavam no controle imperial, reteriam estas terras até a dissolução do Sacro-Império com Napoleão em 1806.

Chegando a Vianden
Vianden tem se tornado uma das principais atrações turísticas deste pequenino país, mas o trajeto aqui segue sendo pouco prático. Se você não vier de carro, como fiz eu com meus amigos vindo da Lorena, é preciso tomar um trem desde a cidade de Luxemburgo até Ettelbruck e de lá o ônibus 570 até aqui. Essa parte de ônibus leva cerca de 35 minutos.
Uma vez na cidadezinha, tudo é perto. Ela é uma dessas que basicamente se estende comprida ao longo da estrada, tendo como o seu coração a ponte sobre o rio Our.




Quem gostava muito deste ambiente de colinas verdes das Ardennes e veio várias vezes aqui foi Victor Hugo (1802-1885), o escritor francês. Pelo menos quatro vezes ele veio aqui passar temporadas e, como não era raro aos homens da época, chegou até a ter um caso meio “Lolita” com uma moça de 18 anos daqui. Há hoje um hotel-restaurante que leva o seu nome, assim como um pequeno museu sobre as suas estadias aqui.





Visitando o Castelo de Vianden
O Castelo de Vianden é o que nenhum visitante aqui pode deixar de ver. O próprio caminho até ele, a pé, já traz um cenário pitoresco na paisagem com as colinas atrás.
O seu estilo é ainda hoje romanesco, com suas torres redondas e arcos circulares. Data dos idos dos séculos XI a XIV, quando então recebeu elementos góticos e depois renascentistas. A época renascentista, especialmente no século XVI, é quando os castelos destes norte europeu começam a ser decorados como moradas — em vez de meras fortalezas de ocasião — e gradualmente vão se transformar nos palácios da Era Moderna (1600-1900).


O castelo chegou a cair em abandono a partir do século XIX, quando o próprio grão-duque de Luxemburgo o vendeu para quitar dívidas. Vendeu a alguém que estava pouco interessado em castelos e que, aos poucos, foi ele também vendendo pedaços do castelo a quem quisesse — eixos de madeira, pedaços do telhado, etc. (!)
A comoção popular foi tanta com aquele descuido que o rei comprou a propriedade de volta, arruinada como ela estava.
Foi, entretanto, apenas no decorrer do século XX — sobretudo após a Segunda Guerra Mundial — que as atenções retornaram à restauração do castelo. Ele só ficaria pronto na condição em que você o vê hoje em 1990, aberto ao público.
A visita inclui um audioguia no preço do ingresso. Os horários e custos exatos você consulta no site oficial. Venhamos dar umas voltas





Os elementos medievais misturam-se aos do Renascimento no interior, conforme você percorre salas e salões decorados à moda dos duques de Luxemburgo da época.



Você passa uma boa hora ou duas aqui circulando. Não é nada muito extenso, mas é uma visita agradável, sobretudo se o dia estiver bonito como este domingo.
Engraçado foi eu, à saída, escutar de dentro do banheiro (contemporâneo, nem medieval nem renascentista, graças a Deus) um grupo de brasileiros. Mais tarde eu os veria ao longe, comentando com meus amigos franceses que lá iam uns compatriotas.
“Você acha?“, me indagou Max com típico ceticismo francês, achando-os brancos demais para serem brasileiros.
“‘Acho’ não, eu tenho certeza“, retruquei. Como se eu fosse confundir meu próprio idioma. Não sabe ele ainda o arco-íris que é o Brasil.
Por ora, tocamos o barco. Era preciso seguir viagem, de volta à Lorena e, depois, eu me despediria dos amigos gauleses para continuar sozinho em direção à Borgonha. Nos vemos lá.

