Interior do Senegal 1 01b
Senegal

Visitando o Senegal: Dicas, custos e lugares para ver

Eis o Senegal, um dos países africanos mais populares entre os brasileiros. Ainda são raros os que vêm aqui (em grande parte, devido à pobreza de conexões aéreas), mas muitos são os interessados. A esses, compus aqui um balanço da minha experiência pelo país e deixo as várias dicas e considerações sobre o que esperar do Senegal.

  • O que mais gostou. De conhecer de perto a cultura senegalesa — esta cultura muçulmana negra que tanto tem de vínculos com os árabes e o Mediterrâneo, mais do que comumente se imagina.
  • Visita obrigatória. A Ilha de Gorée, que funciona como um centro histórico ex situ de Dakar, fora da cidade, numa ilhota a 20min de ferry, onde ficava uma feitoria histórica. Não dá para vir ao Senegal e não ver.
  • O que não gostou. Do jeito interesseiro das pessoas que o abordam (igualzinho no Egito ou na Índia) e a constância das abordagens na rua, especialmente em Saint-Louis. Enche o saco, e é sempre com interesse no dinheiro.
  • Queria ter visto mas não viu. As praias de Cap Skirring na Casamansa. Planejei ir, mas não apareceram para me pegar no aeroporto, e tive que mudar de rota. 
  • Comes & bebes a experimentar. Tchiebu-djienne, o prato nacional senegalês — primo da paella — de arroz com peixe e legumes. Não saia sem experimentar. 
  • Momento mais memorável da visita. Zanzar pelas formosas casinhas coloniais na Ilha de Gorée, um ambiente muito gostoso apesar da história triste como feitoria. 
  • Alguma decepção. O famoso Lago Rosa que não estava mais rosa, e também Saint-Louis foi uma decepção pra mim. Pelo tanto que eu ouvia falar da cidade, achei que fosse um lugar mais preservado, um centro histórico mais amplo e mais bonito, mas há pouco o que se ver lá. Vá se você vier ao Senegal, mas calibre as expectativas. A meu ver, um dia na cidade basta.
  • Maior surpresa. Que Dakar seja uma cidade tão desenvolvida. Eu imaginava um lugar mais simples, mas você se sente quase como numa capital estadual brasileira.  

PRINCIPAIS DICAS

Visto gifVisto & imigração. Brasileiros e portugueses não precisam de visto para visitar o Senegal a turismo.

Entretanto, procure ter consigo sua passagem de avião de saída do país. Nos guichês de imigração à chegada no Aeroporto de Dakar, ninguém me pediu absolutamente nada. Porém, após os guichês ficam guardinhas pedindo pra olhar seu passaporte pra ver mesmo se você obteve o carimbo, e ali eles às vezes lhe perguntam coisas e podem lhe chatear. No meu caso, como contei em detalhes, um guarda — que me viu viajando sozinho (portanto, sem testemunhas) e sem uma passagem de saída, pois eu planejei sair por terra para a Guiné-Bissau — quis me extorquir, sem sucesso. A polícia aqui na África não merece a menor confiança.

Ainda nessa toada, cuidado se planejar fazer conexão no Aeroporto de Dakar. Ele tem se tornado um certo hub aqui na África Ocidental, com a Air Senegal vindo muito a calhar com boas rotas diretas e preços competitivos. Porém, o processo de conexão internacional aqui é bastante novelesco: você precisa passar por um balcão de conexão onde às vezes não há ninguém (e alguém chama a pessoa por telefone, e manda você esperar), depois pela polícia, e por fim por uma segurança. Não há mistério, mas é trabalhoso e demorado. Evite ousar conexões internacionais apertadas por aqui. 

Não há mais qualquer exigência em relação à COVID-19. Eles exigem dos brasileiros o certificado internacional de vacinação contra a febre amarela. Não me pediram, mas em tese é preciso ter. 

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Senegal no mapa da Africa Ocidental
O Senegal na África Ocidental.

Clima, quando vir & melhor época. O Senegal tem um clima semi-árido, espremido entre o grande Deserto do Saara e o Oceano Atlântico. A região da Casamansa (aquela faixa de terra no sul do país) tem um clima mais úmido, mas via de regra tudo — a variação de umidade, o calor, a sensação térmica — lembra um tanto o Nordeste do Brasil.

O melhor período para visitar o país é de novembro a abril, inverno aqui, período mais seco e menos quente. Foi quando eu vim. Após maio, as chuvas são frequentes, e o calor também aumenta.

Observe, todavia, que os senegaleses são quase todos muçulmanos, e vale a pena evitar o mês sagrado do Ramadã, quando os seguidores de Maomé jejuam durante o dia. Isso muda toda a dinâmica desses países de maioria muçulmana, com lugares fechados — e, dizia uma amiga turca, até aumento de acidentes na rua, já que as pessoas ficam mau-humoradas e nervosas sem comer. 

O calendário islâmico é lunar, o que significa que o Ramadã varia no calendário civil, mas entre 2023-2025 ele ocorre nos idos de março. Depois, passará a ser fevereiro. (Você pode ver as datas exatas do Ramadã até 2033 neste site.)

Por fim, a partir do começo de dezembro até os idos de março, chegam os ventos áridos vindos do Deserto do Saara trazendo poeira, o chamado harmattan. Tudo se cobre de pó, a visibilidade fica reduzida, e a qualidade do ar para a respiração não é das melhores.

Novembro, portanto, é o mês de ouro para vir ao Senegal se você quiser escapar das chuvas, do Ramadã e do Harmattan. A segunda alternativa seria abril, após o Ramadã e antes das chuvas.

Goree 1 36
Nas áreas históricas da Ilha de Gorée, com os adolescentes a jogar futebol.

Segurança. Insegurança sempre uma preocupação a quem vem à África, mas o Senegal é dos países mais estáveis que há no continente. Você não deve ir lá para o remoto interior do país, seja pelo risco jihadista na beira do deserto, seja pelos separatistas de Casamansa, mas tampouco há o que ver lá pelo interior distante. O grosso dos lugares de interesse do Senegal estão perto da costa, onde não existem tais riscos.

As ruas de Dakar, Saint-Louis e demais cidades são bem mais seguras que as do Brasil (triste constatação para um brasileiro). Não é comum haver assaltos a mão armada; você precisa ficar de olho é em furtos oportunistas e nos conversadores de rua que são muito criativos em arrumar formas de tirar dinheiro de você.

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Não faltam meninos pedintes nas ruas do Senegal. São os talibê, alunos de escolas islâmicas que mendigam durante o dia. Eu tratei sobre eles neste post. Não lhe fazem mal, mas saiba que no Senegal há mais pobreza e mendicância que no Brasil.

Via de regra na África (e em outros lugares), não deixe dinheiro no quarto do hotel. Você não tenha dúvida de que muitos(as) camareiros(as) passarão a vista. Vale mais a pena levar esses valores consigo, bem escondidos num porta-dólares debaixo da roupa, onde ninguém vai lhe furtar, e já que assaltos são incomuns.

Tenha atenção para não cair naquelas conversas dos matutos de rua querendo lhe mostrar uma coisa ou tal lugar, e depois pedindo dinheiro por isso, ou levando você para alguma quebrada. Não tenha muita confiança em estranhos, pois as pessoas de rua aqui são interesseiras (mais que em outros países africanos que visitei).

No mais, venha com suas anteninhas latinas ligadas e seja feliz.

Como sempre na África, eu recomendo ter consigo seu passaporte (bem guardado) quando sair. Aqui, a chance é muito maior de você ser parado por um policial que exija ver a sua documentação original (e queira extorqui-lo se você estiver sem) do que por algum ladrão que porventura quisesse lhe roubar o passaporte. Tenha-o consigo, deixe-o bem guardadinho, e aproveite a viagem.

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Togo 1 10
A moeda comum nestas bandas da África.

Dinheiro & Câmbio. O Senegal faz parte do grupos de países — quase todos eles ex-colônias francesas na África Ocidental — que utilizam o franco da África Ocidental, também chamado Franco CFA (Colonies françaises d’Afrique, que o politicamente correto depois exigiu que se alterasse para Communauté Financière Africaine) como moeda.

O franco CFA é pregado ao euro com o câmbio fixo de 1 euro = 656 francos. (A abreviação dessa moeda no sistema único internacional é XOF).

Há hotéis e restaurantes finos que aceitam cartão de crédito, o que não é tão raro em Dakar, mas fora disso espere pagar tudo em espécie e na moeda local. Há quem aceite euros no meio turístico ou em lojas, mas não é o normal. As pessoas aqui sempre lhe darão preços em franco CFA.

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Franco CFA, a moeda comum de 14 países da África Ocidental, chancelada pela França.

Como o câmbio é fixo, o ideal é trazer euros e trocá-los em qualquer casa de câmbio — pode haver modestas diferenças, mas coisa pouca.

Aqui não é o Sudeste Asiático ou a América Latina, onde você pode bater perna em busca da melhor cotação. Casas de câmbio são relativamente raras nas pobres cidades, então saiba que se perder a chance de trocar já na chegada no aeroporto, pode acabar tendo trabalho para encontrar outra ocasião. 

Há caixas eletrônicos onde tirar dinheiro com cartões internacionais, mas eles nem sempre funcionam. Os dos aeroportos tendem a funcionar bem, mas no mais, seria como fazê-lo nas periferias das grandes cidades brasileiras — ou numa cidade de zona rural que não tivesse a agência do Banco do Brasil.

Por fim, faça bem o manejo das notas. Quando trocar, peça já uns quebrados, senão vai ganhar tudo em notas roxas de 10.000 francos. Equivale a 15 euros, mas aqui é uma bagatela. São como as notas de R$ 100 no Brasil. 

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Air Senegal 1 05
O Aeroporto Internacional Blaise Diagne, que serve Dakar. Inaugurado em 2017, ele é o principal do país.

Transportes. Para os padrões africanos, o Senegal até que é bem servido de transportes.

Primeiro, para chegar até aqui, nada tão prático quanto a Air Senegal. Eu experimentei a companhia e dei meu relato sobre ela aqui. Voa direitinho, e tem preços bastante competitivos.

Afora ela, a Vueling tem boas opções de baixo custo saindo de Barcelona, e no mais as várias cias aéreas europeias quase todas vêm cá. Se você estiver saindo do Brasil, pode sair mais barato ir primeiro à Europa e comprar separadamente o trecho Europa-Senegal-Europa.

Uma vez no Senegal, dentro de Dakar tudo é à base de táxis — umas arabacas velhas, amarelas, que você verá em abundância circulando pela rua, mas que são baratas. Sempre negocie o preço antes de entrar no carro. No centro (onde recomendo se hospedar se quiser sentir a cidade como ela é), tudo se faz a pé, mas para as atrações mais distantes, o táxi virá a calhar.

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O interior do Aeroporto Blaise Diagne no Senegal. Não espere um mundo de serviços, nem opções de alimentação abundantes como no Brasil ou na Europa, mas ele é, sim, um aeroporto moderno, espaçoso, e confortável.

O principal deslocamento intra-Senegal a se resolver é Dakar – Saint-Louis, as duas principais cidades do país. É coisa de 4h de estrada em média — 4h30 de ônibus ou 3h30 de carro. “De carro” significa conseguir um motorista particular, aí o preço varia muito. Chegaram a me oferecer a corrida por 200 euros.

Pelo equivalente a 10 euros, todavia, você viaja numa boa com a Senegal Dem Dikk, empresa de ônibus interurbanos com ar condicionado. Fiz a viagem, e os ônibus são relativamente confortáveis. Não é muito diferente de uma viagem interurbana no Brasil se você for na categoria executiva simples, sem os charminhos de ônibus leito etc. Vale muito a pena.

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Ônibus da Senegal Dem Dikk no seu pequeno terminal em Dakar.
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O interior dos ônibus com ar condicionado. A viagem entre Dakar e Saint-Louis dura coisa de 4h30.

A página oficial da Senegal Dem Dikk é esta. Porém, digo-lhe por experiência que não confie demais nesses horários ditos na internet. O melhor é pedir a algum senegalês da sua acomodação para chamá-los pelo telefone e, se puder, comprar para você a passagem usando o tal Orange Money que eles utilizam aqui — como crédito de telefone que você recarrega na rua com alguém, mas aqui usado para certas compras, igual o Apple Pay ou o chinês WeChat pay. Dinheiro virtual que serve.

Caso você não consiga fazer isso, o jeito analógico é indo até o Liberté Terminal 5 (não o 6), e resolvendo tudo lá pessoalmente ao guichê. Eles não vendem passagem pela internet ainda.

Por fim, para ir à Casamansa, há um ferry Dakar – Ziguinchor, com partidas 4x por semana. Você pode ver os detalhes nesta página oficial do serviço. Eu imagino que seja uma aventura. Se não quiser, ou as partidas não coincidirem com sua estadia, há sempre a opção de voos domésticos com a Air Senegal. Quando eu vim, o Aeroporto de Ziguinchor estava desativado, então era preciso voar até a vizinha Cap Skirring, à beira-mar.

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O caudaloso rio Casamansa no sul do país, por onde o ferry vindo desde Dakar chega até Ziguinchor, cidade que já foi portuguesa.

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Custos & Acomodações. Seu orçamento de viagem dependerá muitíssimo do nível de acomodação que você escolher. A África costuma ser mais visitada por dignatários estrangeiros (prontos para ficar em hotéis 5 estrelas) que por viajantes como eu e você, então há geralmente poucas opções boas de baixo ou médio custo.

Por exemplo, em Dakar eu fiquei no Hotel Saint-Louis Sun Dakar, que me custou o equivalente a €40 por noite. O hotel não é uma fábula, é relativamente simples, mas bem localizado e superior a outras opções no centro da cidade. Se Aicha ainda trabalhar lá à recepção quando você for, conte com ela para o que precisar — e lhe mande um abraço meu.

Saint-Louis é mais turística que Dakar, então lá as acomodações têm preços maiores. Eu fiquei na Ndar Ndar House e recomendo. Saiu-me €50 por noite. Lembre que eles, via de regra, esperam o pagamento em francos CFA (não em euros e muito menos dólares), e nem sempre aceitam cartão de crédito. Você pode ver isso na hora da reserva.

No mais, se você viajar com a Senegal Dem Dikk, sai o equivalente a menos de €10 cada passagem. Comida na rua vai depender de onde você fizer suas refeições. Geralmente, por coisa de €5-7 você come muito bem em lugares senegaleses arrumadinhos — sem se expor demais à falta de higiene dos mercados.

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O Hotel Saint-Louis Sun Dakar, onde fiquei no centro da capital senegalesa. O que seria um três estrelas bem simples, mas bonzinho e com ótima localização. De quebra, Aicha à recepção foi uma mão na roda.

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Tchiebu-djienne, o prato nacional senegalês de arroz com peixe e legumes.

Comes & Bebes. No Senegal se come bem, mas a comida daqui tem muito pouco a ver como que você talvez imagine de comida africana. Se o seu ponto de partida é a comida baiana de matriz afro-indígena, então passou longe. (Essa você encontra muito mais no Togo e no Benim, mais ao sul.)

A comida senegalesa — como outros aspectos da sua vida social — é muito mais influenciada pelos árabes e o Mediterrâneo que pela África mais tropical mais ao sul.

Também não imagine árabe sírio-libanês, que é o que se vende como árabe no Brasil, mas árabe marroquino. A comida aqui é um tanto semelhante, com muitos guisados, legumes temperados, uso de algumas especiarias, e uso abundante de peixes, frango, cordeiro e até coelho. Não achará nada de porco, já que 97% da população é muçulmana. 

Basta trocar o cuscuz norte-africano de trigo pelo arroz, comido aqui em tanta abundância quanto no Brasil — crédito dos árabes, que difundiram esse cultivo asiático desde lado de cá, popularizando-o no sul da Itália como também nos países da Península Ibérica e, vejam só, aqui no Senegal.

O prato nacional senegalês que não se pode ir embora sem experimentar é o tchiebu-djienne (nome da língua local wolof e que você encontrará em muitas grafias distintas). Trata-se de um primo da paella espanhola: arroz de grão curto cozido no tempero, tipicamente acompanhado de peixe e legumes. (Há variações, com outras carnes, mas peixe é o original e o clássico.) Eu recomendo experimentar o de Chez Loutcha em Dakar, que é uma delícia.

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Um bom tchiebu-djienne vem assim servido na panela igual uma paella. Arroz temperado acompanhado de peixe e legumes. Note também o limão (outra importação árabe do oriente para o Mediterrâneo e o Senegal). Os senegaleses põem limão em quase todos os seus pratos típicos.
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Este é um yassá de peixe — também com arroz e limão —, outro prato típico. Esse molho leva cebola e um pouco do sumo do limão, então é levemente azedinho. Já aquele suco verde ali é de ditakh, uma fruta daqui com gosto de kiwi batido com folhas. Vale a pena experimentar tudo isso.
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Este é um yassá de camarão. Depois de muito comer arroz, eu pedi que o meu viesse com batatas acompanhando. Note também a influência colonial francesa lá no pão baguete servido à refeição com manteiga.

Como o Senegal foi colônia da França até 1960, os hábitos de café da manhã — ao menos nos hotéis — são plenamente franceses: pão branco, manteiga, geleias industriais de frutas temperadas, café e talvez até croissant. 

A exceção a muito do que eu disse acima é a região da Casamansa, no sul do Senegal, uma região de história diferenciada e que há décadas busca se separar. A região foi inicialmente colonizada pelos portugueses, anexada pelos franceses apenas em 1886, e partilha muito mais com a vizinha — e lusófona — Guiné-Bissau que com o restante do Senegal. 

Na Casamansa, você já encontra pratos com azeite de dendê e que às vezes lembram a culinária brasileira. Por exemplo, o prato mais típico da Casamansa é o um etodjey (às vezes escrito étodié ou dito ainda etodjai), que lembra uma maniçoba. É folha de mandioca cozida com azeite de dendê, amendoim e peixe defumado (Huuum!).

No mais, como não estamos numa ilha, o Senegal também recebe influência da vizinha Guiné (às vezes dita Guiné-Conakry, que fala francês), paupérrima e de onde vêm muitos migrantes. Eles, claro, trazem sua gastronomia que por vezes você também encontra em Dakar. Participam daquele mesmo universo culinário da Guiné-Bissau, com coisas que levam dendê e quiabo — como a culinária baiana.

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Com um etodjey, o prato mais típico que há na região da Casamansa. Folhas de mandioca cozidas com azeite de dendê, amendoim e peixe defumado. Come-se com arroz, e é uma delícia.
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Aqui um supukanja, prato guineense que encontrei em Dakar. Com quiabo e azeite de dendê (e também comido com arroz), ele lembra um caruru baiano, só que com carne em vez de camarão seco.

No Senegal, eu já não vi mais as massas de milho nem de inhame que são tão comuns África subsaariana afora. Entretanto, fica a semelhança do comer apimentado. Não se ouve falar isso fora da África (pois pouco se conhece no estrangeiro sobre culinária africana, é a verdade), mas eles em geral adoram comida picante, e o Senegal não é exceção. Você pode até pôr mais, mas com respeito, pois é forte.

Já no reino das bebidas, predomina o café, e há sucos por vezes exóticos, como aquele de ditakh. Como — pelo menos em tese — os muçulmanos não devem beber álcool, não há muito de típico no campo das bebidas alcoólicas.

Uma observação final: há um paradigma na África de oferecer “comida internacional” (leia-se: versões chinfrim de pratos sem nenhuma assinatura cultural, tipo peixe frito com arroz, ou macarrão com molho) aos turistas, que vêm e vão sem conhecer aquilo que os africanos comem.

Aqui no Senegal, é até mais fácil encontrar comida típica que noutros países da África, mas saiba que se ficar em hotel chique, ou comer em restaurante fino com ar condicionado, dificilmente encontrará nada disso que mostrei acima. O Hotel Saint-Louis Sun Dakar oferece comidas típicas, assim como o mui recomendado Chez Loutcha em Dakar. No mais, pergunte às pessoas, e elas não hesitarão em indicar.

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WifiWi-fi e conectividade. O Senegal até que tem uma conectividade digna. Atualmente, as pessoas estão começando a viajar com planos de deslocamento (roaming) em lugar de adquirir chips locais. Aqui no Senegal, saiba que existe um tal Orange Money, que é como crédito de celular que se usa também para fazer compras em alguns lugares — como com a Senegal Dem Dikk.

Mas eu só recomendo ir tão longe a quem planejar ficar aqui um bom tempo. No mais, é perfeitamente possível depender de wi-fi. Praticamente, todas as acomodações que experimentei tiveram wi-fi funcionais. Pode não ser uma velocidade coreana de conexão, mas funciona bem.  

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Aonde ir, e quantas noites em cada cidade? O Senegal é um destino onde eu recomendaria passar 5-7 dias. Depende um pouco do seu gosto e estilo de viajar, mas eu diria que 3 noites em Dakar são um ideal. Sugiro muito agregar aí 1 noite na Ilha de Gorée. A maior parte dos visitantes faz um bate-e-volta a essa ilha a 20min de ferry de Dakar, mas eu curti demais pernoitar. Permite sobretudo que você aprecie aquele entardecer (mais do que a noite, em que tudo se aquieta).

Dakar pode não ser aquela cidade divina, gostosa de estar — embora certamente vá ter sua curriola de fãs —, mas é sem dúvidas uma cidade grande, com bastante o que fazer. Você não deve sair dela sem ir ver o Monumento da Renascença Africana, as mesquitas da Divindade e Massalikul Djinane, a catedral, e pode conferir também seus museus. Há museus mais à moda antiga e o novo Museu das Civilizações Negras, que tem uma pegada meio puxada às artes contemporâneas (mais que propriamente sobre História). Você confere esses vários lugares na minha postagem na capital senegalesa.

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O interior da impressionante Massalikul Djinane em Dakar. Cerca de 97% da população senegalesa é muçulmana.
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Dakar, de modo geral, lembra uma versão mais baixa-renda das cidades brasileiras. É uma cidade andável, ainda que tenha sua muvuquinha. Aos que gostam de conhecer um país a fundo, sugiro hospedar-se no centro — na área chamada de Dakar Plateau.
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A Ilha de Gorée, a 20 minutos de ferry, funciona um pouco como o centro histórico de Dakar. É uma antiga feitoria onde andaram portugueses, holandeses, e que foi controlada pelos franceses desde o século XVII.
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Vendedoras com roupas típicas na Ilha de Gorée, Senegal.

Há partidas várias vezes ao dia — via de regra, a cada 2h — do porto (Gare Maritime) de Dakar até a Ilha de Gorée. A ilha é miúda, e lá tudo se faz a pé. Esse porto de Dakar também se acessa fácil a pé se você estiver no centro. Fica perto da estação ferroviária, outro lugar lindo que você não deve deixar de ver de perto.

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A estação ferroviária de Dakar, do tempo colonial francês. Hoje, funciona como uma estação de trens suburbanos. Estão criando uma linha de ligação ao distante aeroporto, mas só deve funcionar a partir de 2024.

Temos aí, portanto, 4 noites e 5 dias, um pacote bastante básico para o Senegal — caso isso seja todo o tempo de que você dispõe. 

O famoso Lago Rosa seria motivo para ficar uma noite extra em Dakar e fazer um bate-e-volta de meio dia, mas como mostrei na minha postagem lá, devido à deterioração ambiental o lago atualmente não está mais rosa. Não vale a pena, a menos que consigam de alguma forma corrigir a situação e ele volte à sua cor original. 

Se você insistir em ir — caso ele quem sabe volte a ficar rosa — o melhor é acertar o preço com algum motorista que o leve de Dakar e depois o traga. As acomodações costumam poder acertar isso para você. Pode-se almoçar por lá ou então ir logo após o café da manhã e voltar para almoçar em Dakar. Leva coisa de 1h de carro do centro de Dakar até lá, a depender um pouco do trânsito (fim de semana é melhor nesse sentido).

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O Lago Rosa já não é mais nem um pouco rosa. Degradação ambiental nestes arredores de Dakar fez com que a água das chuvas escoassem para cá e diluíssem o sal.

Saint-Louis é a segunda cidade do país, antiga capital colonial francesa até os idos de 1900. Eu digo abertamente que achei a cidade um pouco aquém do que eu imaginava — boa parte da herança histórica está caindo aos pedaços, e há uma presença chateante de gente querendo lhe vender coisas —, mas você pode querer conferi-la com os próprios olhos.

Eu diria que um dia inteiro lá (portanto, 2 noites) é o suficiente. Como são várias horas de estrada, vale a pena pegar leve e ficar mais de uma noite. Você pode ler sobre a minha experiência lá em grandes detalhes nesta postagem.  

No mais, a região da Casamansa — que é culturalmente distinta e mais se assemelha às Guinés — eu só recomendo a quem realmente gozar de mais tempo ou planejar ir por terra até a vizinha Guiné-Bissau. Ziguinchor, na Casamansa, tem um consulado que emite o visto no ato, em 10 minutos.

Não há muito o que ver na região; o passeio meio que se limita a praia em Cap Skirring ou um passeio de barco pelo rio Casamansa em Ziguinchor. Claro, há afora isso a culinária casamançaise, distinta da do restante do Senegal, mas assemelhada à dos vizinhos ao sul.

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Saint-Louis foi a capital colonial da antiga África Ocidental Francesa até os idos de 1900. A cidade reserva ainda um centro histórico tombado pela UNESCO como Patrimônio Mundial da Humanidade, mas em mau estado de conservação. Mistura-se também a construções modernas sem sal. (Prepare-se também para o assédio constante de vendedores e desocupados nas ruas.)

Uma nota final sobre vida selvagem, algo que sempre atrai visitantes à África. Há parques nacionais no Senegal, em especial uma reserva de biodiversidade para quem quiser observar aves à beira-mar. De Saint-Louis se organizam passeios para lá. Entretanto, via de regra, se o seu interesse é vida selvagem, melhor você estará na África Oriental (Quênia, Tanzânia), ou mesmo na África do Sul, que aqui no oeste do continente.

Há também experiência de deserto em Lampoul, mas para isso o Marrocos pode ser mais interessante, com mais estrutura e número de opções.

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Roupas coloridas e badulaques vários à venda no Senegal.

Compras. Há muita coisa típica africana à venda no Senegal por toda parte, mas nem tudo que reluz é ouro.

Você encontra uma grande quantidade de badulaques industrialmente produzidos na China ou na Índia e vendidos aqui como artesanato — não são. Ambulantes abundam passeando com essas coisas, e eles não hesitarão em mentir dizendo que foi feito pela avó deles numa longa tradição de família.

O segundo grupo são as coisas várias que são de fato africanas, mas produzidas em massa não necessariamente aqui no Senegal. Estatuetas de madeira, roupas coloridas, e estampas de pendurar na parede. (Não estou dizendo que você não as compre, só estou dizendo o que são.)

Por fim, você pode conseguir encontrar artesanato de verdade e coisas originais. Em Saint-Louis, haverá alguns ateliês à là française e com preços de Europa, mas nos mercados populares em Dakar ou até na Ilha de Gorée você encontra coisas mais originais — assim como na Casamansa —, e sem preços de turista.

Por exemplo, algo muito original aqui do Senegal é artesanato em palha, inclusive uns cestos tradicionalíssimos em formato bojudo e que eles apelidam de ananás (abacaxi). Tive a sorte de achar uns hiper-baratos na beira da estrada.

(Ah, e os homens que me perdoem a discriminação estatística aqui — que neste caso não é pré-conceito, é pós-conceito —, mas as mulheres vendedoras no Senegal tendem a ser muito mais honestas que os homens, que frequentemente são uns enrolões.)

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Estes cestos de palha trançada são hiper-tradicionais aqui no Senegal, artesanato genuíno. Eles os apelidam de ananás (abacaxi em francês — ainda que a palavra seja de origem tupi) pelo formato. Há de vários tamanhos, inclusive uns leváveis na mala.
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Com uma vendedora de balangandãs em Saint-Louis, Senegal.

Sempre barganhe, pois todos os preços são negociáveis. Comece tentando baixar o preço de um item e, se quiser outro, deixe para agregá-lo depois e pedir mais uma redução “se levar este e também aquele”.  

Como no Pelourinho, cuidado com os “presentes”; são frequentemente uma forma de deixar você em dívida, e aí a pessoa pede que você retribua também lhe dando um presentinho (dinheiro) — o que acaba sendo uma venda disfarçada.

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keep calm and speak french 51Idioma & trato com as pessoas. O Senegal tem vários idiomas africanos nativos, sendo o wolof (ou jalofo) o predominante. Como foram uma colônia da França até 1960, é o francês a língua franca (sem trocadilhos) em muito do país e com os turistas.

Eles falam inglês? Há quem fale — fiquei até com a impressão de que mais gente que noutros países africanos francófonos como Benim e Togo —, mas não é tão comum. Nos hotéis, é habitual que haja alguém com algum domínio de inglês, assim como há matutos de rua que são anglófonos (veja só), mas não espere uma fluência generalizada. O francês vem muito a calhar se você é do tipo — como eu — que gosta de puxar papo com as pessoas e perguntar sobre isso ou aquilo no país.

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Com um vendedor senegalês (em trajes mui islâmicos) e seu filho.

De modo geral, eu achei os senegaleses bem menos abertos que outros africanos. Eles são islamizados desde a Idade Média, e me lembraram muito mais o jeito dos marroquinos, por exemplo, que o jeito dos togoleses ou beninenses. 

O que eu vejo é que toda essa cultura de influência árabe desde aqui até lá a Índia é muito uma cultura comercial, onde as relações entre estranhos são muito pautadas pelas relações de mercado, de vantagem, da barganha, do negócio.

Então há sempre ou quase sempre conflitos de interesses, e a cortesia costuma vir acompanhada de intere$$e monetário. Não é sempre, mas quase sempre — o bastante para você tomar isso como a via de regra. Diferente de um Japão ou de uma América Latina, onde as pessoas o assistem por uma questão de cortesia despretensiosa, ou pelo socializar-se sem envolver nisso o vil metal.

Se você pesquisar sobre o Senegal, lerá sobre teranga na internet, suposto valor crucial da hospitalidade na cultura local. A internet e a mídia aí fazem um romance até meloso sobre o conceito, como fazem sobre o namastê indiano e tantos outros conceitos exóticos que o Ocidente pega e romantiza.

Eu lamento dizer, mas na minha experiência isso costuma ser um bolodório sem nome para fascinar estrangeiro. Na Índia eles dizem a mesma coisa, e o mesmo anfitrião lá que num dia estava me dizendo que “o hóspede na Índia é como um deus”, dias depois estava tentando me trapacear no preço da acomodação. Aqui no Senegal, por todo o teranga, já no aeroporto o senegalês policial tentou me extorquir, e depois eu só veria essa palavra na boca de oportunistas de rua tentando me chamar a atenção. Certamente há ou houve uma base cultural para esse conceito, mas hoje ele é frequentemente corrompido.

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Algumas considerações finais. Permitam-me somente esta última reflexão pessoal aqui. 

A existência do Estado aqui na África me parece comparável àqueles planetas da periferia da galáxia em Guerra nas Estrelas, onde não há qualquer presença de bem-estar social — as pessoas viram-se com os recursos que ali há, fazendo negociatas, virando-se nos 30 (ou nos 20), lidando com quem aparece, em situações precárias, e a Ordem só aparece na figura de forças de segurança.

Os policiais são iguaizinhos aos agentes do Império que estão ali para proteger as atividades de mineração etc., mas sem dar bola às pessoas. São como os stormtroopers naquelas barreiras na estrada, onde você — que não é jedi — precisa engolir seco e torcer para não sofrer nenhum abuso, mas está sujeito a tal. E com paradas frequentes. Quem assiste Star Wars e quiser vir experimentar, venha. Que a Força esteja com você.

Comparações à parte, eu tenho minhas críticas (como sempre, prezo pela honestidade), mas o Senegal tem uma cultura pujante e, como mostrado, lugares interessantes a conhecer. Basta vir “esperto” e já sabendo o que vai encontrar. No mais, deixe-se surpreender. 


Se você ficou com alguma dúvida, quer algum toque, ou tem alguma pergunta que eu não respondi, é só pôr abaixo nos comentários.

Mairon Giovani
Cidadão do mundo e viajante independente. Gosta de cultura, risadas, e comida bem feita. Não acha que viajar sozinho seja tão assustador quanto costumam imaginar, e se joga com frequência em novos ambientes. Crê que um país deixa de ser um mero lugar no mapa a partir do momento em que você o conhece e vive experiências com as pessoas de lá.

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