Cabo Verde é aquele país-arquipélago lusófono de 10 ilhas que fica equidistante entre Lisboa e Fortaleza. Até 1975, foi colônia portuguesa, quando então ganhou independência e passou a ser considerado um país africano soberano.
Na prática, Cabo Verde é como andar pelo Brasil colonial — com sua negritude mestiça, só que com sotaque português. Parece MUITO mais o Brasil que a África propriamente dita.
As semelhanças com o Brasil são incríveis, e fazem você se perguntar por que não se fala mais de Cabo Verde nas escolas, nas mídia, etc. A gente também é super simpática. Se por posição geográfica (a 600 Km do Senegal) agruparam Cabo Verde na África, culturalmente ele pertence muito mais à América Latina e Caribe, e se um dia chegarmos a ter estados supranacionais definidos por laços históricos e culturais como a União Europeia, Cabo Verde e o Brasil certamente estarão juntos numa mesma entidade cultural.
Mas como é visitar Cabo Verde? As ilhas de Cabo Verde são relativamente diversas. Não dá para você vir rapidinho só à Ilha do Sal e dizer que viu o país. (Igual aos estrangeiros que vão a negócios a São Paulo e acham que conheceram o Brasil.)
Abaixo segue o meu pacote de dicas acerca do que fazer em cada ilha, quais ilhas visitar, a logística dos voos domésticos, quais podem ser visitadas de ferry, etc. — mas primeiro um balanço da minha experiência pessoal após ir às 4 mais visitadas das 10 ilhas.
- O que mais gostou. De descobrir as incríveis semelhanças com o Brasil (de língua, História, culinária, música, etc.). Com todo o respeito à soberania dos cabo-verdianos, parecia que eu estava visitando um arquipélago brasileiro no Atlântico.
- Visita obrigatória. A Ilha de Santo Antão com as mais incríveis paisagens do arquipélago. Se eu julgo que Praia e a Cidade Velha na Ilha de Santiago têm seus méritos, eu diria que Santo Antão é essencial — ainda que por ora ela pouco apareça dos roteiros dos brasileiros.
- O que não gostou. Do fato de o calendário de voos entre as ilhas mudar a cada estação do ano e às vezes só ser disponibilizado poucas semanas antes, o que dificulta o planejamento. Também você quase sempre precisa voltar à capital, e daí só tem voo para ilha X ou Y no dia seguinte ou dali a dois dias (mais na seção abaixo sobre Transportes).
- Queria ter visto mas não viu. Mais da Ilha de Santiago (onde fica a capital Praia), além das ilhas Fogo e Brava. Lá há vulcão e também paisagens que dizem ser incríveis. Certamente constarão numa segunda viagem a Cabo Verde no futuro.
- Comes & bebes a experimentar. Cachupa — um misturão de feijão, milho, carnes e verduras — é praticamente o prato nacional de todo dia em Cabo Verde. Tampouco se pode ir embora sem experimentar os pontches à base de grogue, como chamam aqui os licores à base de cachaça.
- Momento mais memorável da visita. A descida pelo Vale do Paúl, facilmente o lugar mais bonito que vi em todo o país.
- Alguma decepção. Sal me foi um certo desapontamento. É a ilha mais famosa e visitada de Cabo Verde. Eu achei que seria mais badalada, ou com mares mais estonteantes, mas as praias não são melhores que as do Brasil, e o lugar tem um nível apenas mediano de movimento. Muitos turistas ficam em resorts isolados, o que faz sentido a europeus que não conhecem os trópicos, mas eu não sairia do Brasil por causa de Sal.
- Maior surpresa. Que tudo seja tão culturalmente semelhante ao Brasil. As comidas, a música… há particularidades, mas não maiores que as que há entre os estados brasileiros. Foi uma surpresa acalentadora.
PRINCIPAIS DICAS
Visto & imigração. Brasileiros e portugueses não precisam de visto para visitar Cabo Verde a turismo.
Basta pagar uma tarifa de 3.400 escudos cabo-verdianos (o equivalente a cerca de €30 ou R$160) online alguns dias antes ou no ato da chegada. Não é um visto, mas um chamado pré-registro — ainda que do ponto de vista econômico dê no mesmo.
Não é obrigatório fazê-lo antes da chegada, embora alguns sites digam isso. Eu próprio cheguei e paguei no ato, no guichê de imigração, com recibo dado e tudo. Só se certifique de ter consigo cartões de crédito (Visa ou MasterCard) habilitados para uso no exterior. Não sei, mas não me pareceu que aceitem pagamento em espécie. Se tiver dúvidas e quiser se sentir seguro, você pode tentar pagar antes pelo site oficial: https://www.ease.gov.cv/ (o site às vezes sai do ar, mas não entre em pânico; se isso ocorrer, tente uns dias depois).
Não há necessidade de foto nem nenhuma documentação além do habitual: comprovação do voo de saída de Cabo Verde, informação sobre onde irá se hospedar, e no caso dos brasileiros o comprovante de vacinação contra febre amarela. Perguntaram se eu tinha, ainda que não tenham pedido para ver.
Fiquei com a impressão de que eles não são chatos, mas tampouco são relapsos nesta imigração.

Clima, quando vir & melhor época. Cabo Verde tem um clima tropical seco, bastante seco. Espere um tempo semelhante ao do litoral do Nordeste brasileiro, só que menos quente, menos úmido, e com bastante vento.
Isso significa que chove pouco, e praticamente tudo entre julho e outubro. Essa, portanto, não é uma época indicada.
No mais, praticamente toda hora é hora. De novembro a junho é tempo bom. Novembro e dezembro ainda pode chover um pouco em ilhas como Santo Antão, mas não necessariamente. Esses meses também têm ainda temperaturas ligeiramente maiores, coisa de 22-30ºC, enquanto que nos idos de fevereiro e março — inverno, pois aqui estamos no hemisfério norte — ela fica por volta de 19-25ºC. Pouca diferença, portanto.
No mais, só tenha em conta os feriados habituais como Páscoa e Natal, pois Cabo Verde é um país predominantemente católico à moda portuguesa.


Segurança. Eu, francamente, não tive a impressão de que insegurança seja um problema aos turistas aqui em Cabo Verde. Praia, a capital, tem suas quebradas, mas em geral só fora do centro histórico (o chamado platô, que até fisicamente fica mesmo bem separado do resto). Nesse miolo, tudo me pareceu tranquilo.
Praticamente o mesmo se aplica à cidade do Mindelo, enquanto que Santo Antão e Ilha do Sal são lugares cuja segurança me pareceu ter nível de Europa. Venha sem medo.

Dinheiro & Câmbio. Cabo Verde tem moeda própria, o escudo cabo-verdiano — nome que é legado colonial, dos tempos do finado escudo português, de antes do euro.
O câmbio, todavia, não é livre. A moeda é fixada no euro, e portanto flutua junto com ele para não criar variabilidade de preços aos cabo-verdianos, já que muito aqui é importado da Europa.
Um euro equivale a 110 escudos cabo-verdianos (CVE). Você pode tanto sacar escudos quanto usar casas de câmbio nos aeroportos, assim como nas cidades mais visitadas: Praia, a capital, e Santa Maria na Ilha do Sal. Porém, casas de câmbio não são assim feito água por toda parte, e em ilhas mais afastadas e menos urbanizadas como Santo Antão você pode ter dificuldade de encontrá-las.
Euro é a melhor moeda forte para trazer, mas não espere pagar as coisas do dia dia em euros, só mesmo aquilo que é realmente voltado apenas ao público turista: certas acomodações, pacotes turísticos na Ilha do Sal, e talvez traslado para o aeroporto — mas a cotação é, geralmente, em seu desfavor nesses casos. Vão converter 2000 CVE em 20 euros, sendo que 20 euros oficialmente são 2200 CVE. (Parece até que essa cotação quebrada de 1 EUR = 110 CVE já é de propósito.)
Cartões de crédito também não são tão amplamente aceitos quanto no Brasil. Restaurantes em Praia, Mindelo ou na Ilha do Sal, certamente sim, mas fora desses três lugares a coisa já fica mais rara, e mesmo algumas acomodações mais simples aceitam apenas espécie.
Minha recomendação é ter consigo uma quantidade já razoável de escudos cabo-verdianos a depender do seu perfil de gasto, e sobretudo se for a ilhas mais afastadas como Santo Antão. Como segurança, pode então ter consigo euros — que seguirão sendo úteis mesmo que sobrem — caso os escudos acabem e você tenha alguma urgência.

Custos & Acomodações. Cabo Verde no geral é um destino relativamente barato, mas os preços variam bastante de uma ilha para outra. Desnecessário dizer que seu orçamento depende do nível de conforto da sua acomodação, mas necessário dizer que vai depender muito também do número de ilhas que você deseja visitar.
A grande maioria das 10 ilhas de Cabo Verde são acessíveis apenas por via aérea, o que significa que você precisará comprar passagens de avião para ficar entre lá e cá — fazendo o chamado island hopping, ou pula-pula entre as ilhas. Várias tampouco têm voos diretos entre si, ou os têm apenas um dia na semana, e você precisa ficar brincando de tentar encaixar tudo no roteiro. Muitas vezes, a solução acaba sendo pegar dois voos: por exemplo, um da Ilha de São Vicente para a capital Praia, e de lá um segundo voo no dia seguinte para a Ilha de São Nicolau, pois não há voos diretos entre as ilhas periféricas.
Sobre transportes nós trataremos melhor daqui a pouco. Em termos de acomodação, por €20-35 você consegue quartos individuais com banheiro em nível pousada. Não espere pousadas pitorescas profissionais — quase sempre é, na verdade, um puxadinho na casa de alguém, ou um apartamento no andar de baixo no prédio onde a pessoa mora, e não é raro que não sirvam café da manhã (você precisa ir à padaria), mas é gente simpática e acolhedora.
Não vi albergues do tipo com camas de dormitório em Cabo Verde, mas talvez seja uma questão de tempo até eles surgirem. Essas aí acima são as acomodações mais e conta. Se quiser algo mais fino e arrumado — uma pousada ou hotel profissional, quase sempre de donos europeus, com café da manhã etc. — prepare-se para pagar coisa de €70-90 por noite. Estas são relativamente escassas, então as reserve com meses de antecedência se puder.

Em termos de alimentação, achei Cabo Verde com preços algo semelhantes aos de Portugal — com alguma variação entre as ilhas.
Em lugares mais turísticos, como na Ilha do Sal, você facilmente paga 20 euros por pessoa num jantar. (Eles partem do princípio que toda a clientela ganha em euros — o que não está muito longe da verdade.) O mesmo macarrão frito do tipo asiático que custa 5 euros na Alemanha vai lhe custar 8 euros em Sal. Uma cachupa custa 10 euros facilmente, o dobro do que é normalmente.
Nos lugares populares voltados aos cabo-verdianos nas cidades principais, como Mindelo ou Praia, você compra pratos feitos à brasileira por coisa de 5 euros.
Transportes. Sendo um país espalhado por 10 ilhas, transporte se torna algo chave tanto na sua logística de roteiro quanto no orçamento. Temos aí três elementos: transporte dentro de cada uma das ilhas, transporte naval e transporte terrestre.
Transporte dentro de cada uma das ilhas é relativamente simples, e via de regra depende de táxis, motoristas arranjados com sua acomodação, ou do chamado aluguer — como eles aqui chamam as vans lotação que fazem certos percursos sem horário preciso. Não espere linhas de ônibus.
Já para ir de uma ilha a outra, os trajetos mais curtos você pode fazer em navio (até porque nem toda ilha tem aeroporto), mas não se iluda achando que a via marítima é onipresente. Ela está praticamente limitada às ilhas que são próximas uma da outra. Por exemplo, entre as ilhas de São Vicente e Santo Antão há ferries 2x ao dia.
Ali você até escolhe entre duas empresas, a Nôs Ferry e a CV Interilhas. Não há classes. Nos sites oficiais você encontra seus horários de partida, em geral duas vezes ao dia (exceto aos domingos, quando há apenas um horário). Porto Novo é o atracadouro de chegada na Ilha de Santo Antão. Atualmente, uma passagem só de ida custa 800 escudos (R$ 40) para uma viagem que dura cerca de 1h.


Voos internacionais para Cabo Verde são mais abundantes vindos de Lisboa, mas há também oriundos de localidades na França, Itália e Suíça, a depender da empresa. Se estiver num périplo pela África Ocidental, a Air Senegal tem voos saídos de Dakar também. Sal (SID) e Praia (RAI) são os aeroportos cabo-verdianos com maior número de opções internacionais. Nos idos de 2019, houve voos ligando Cabo Verde ao Nordeste do Brasil, mas daí veio a pandemia, e eles se foram. Acredito ser uma questão de tempo até retornarem, mas pode ainda levar uns anos.
Os voos domésticos em Cabo Verde são todos operados pela mesma empresa: a BestFly, que já foi chamada de Transportes Interilhas de Cabo Verde (TICV). Os aviões são bonzinhos, sempre aqueles com disposição de 2 x 2 assentos. A passagem automaticamente inclui sempre 1 pc de bagagem despachada (até 23 Kg), e eles servem apenas água a bordo. Tomei três voos, e todos foram razoavelmente pontuais, com atrasos bobos de 10-15 min. As viagens entre as ilhas costumam levar pouco menos de 1h.
Note que não há check in online nos voos domésticos de Cabo Verde. Basta se apresentar no aeroporto com suas coisas, à moda tradicional.
Você pode tranquilamente adquirir todas as suas passagens direto no site oficial, sem precisar de intermediários. Alguns fóruns de internet falam em precisar usar uma agência de Cabo Verde, mas isso já está ultrapassado. Nem se intimide com a única opção de pagamento sendo algo chamado Vinti4, pois ao selecioná-la você poderá usar qualquer cartão Visa ou Mastercard habilitado para compras no exterior.
A única coisa um pouco traiçoeira é que eles só divulgam os dias e horários dos voos a cada estação do ano — às vezes com uma antecipação razoável de uns 4-5 meses, mas noutras vezes apenas 2 meses antes. Por exemplo, neste momento em que vos escrevo, estamos com sorte, pois já há divulgadas as datas e horários até o fim de março. Entretanto, se o seu plano for uma viagem para abril, terá que esperar até eles divulgarem a nova tábua de horários daqui a uns meses.

Compre suas passagens com uns dois meses de antecedência pelo menos, se puder. À altura de um mês antes da data, as passagens de preço PROMO estarão praticamente esgotadas e você terá só as FLEX, mais caras. Se deixar para muito em cima da hora, já não acha passagem nenhuma, pois os aviões lotam. Portanto, fique esperto.
Quanto aos preços, minha sugestão é que você experimente ver no site oficial. Comprando com antecedência, minha experiência foi de conseguir passagens por coisa do equivalente a 50 euros. Já se deixar para em cima da hora (e ainda houver passagens), elas saem por mais de 100 euros cada.

Comes & Bebes. A culinária carbo-verdiana lembra a alimentação brasileira do dia-dia — feijão com arroz, carne ou peixe, salada, legumes cozidos — sem as especialidades das cozinhas regionais.
Exceto a cachupa (às vezes lida ou escrita Katxupa na língua crioula daqui), não há lá muuuuito de novo a conhecer. Há o midje, que é a feijoada deles com menos carnes que a brasileira, além de uma série de coisas familiares aos brasileiros, como canja de galinha ou caldo de peixe.
A própria cachupa — como que a confirmar nosso parentesco cultural e a origem histórica comum entre Brasil e Cabo Verde — é bastante semelhante ao pintado ou mungunzá salgado que se faz no sertão do Nordeste: feijão e milho acompanhado de carnes.
A cachupa aqui muda um pouco de ilha pra ilha, mas em todas ela é um “tudão”, pois surgiu com os trabalhadores misturando tudo o que tinham em casa. Nas ilhas do Sal e de Santiago, ela parece mais um guisado, com caldo. Já em São Vicente e Santo Antão, é mais seca — pois as pessoas removem o caldo para tomar em separado como uma sopa noutra hora do dia — e meu paladar gostou mais.


Quanto aos bebes, você aqui vai encontrar sucos do fruto do baobá, que eles aqui chamam de calabaceira. Mas o mais característico são mesmo o grogue (aguardente de cana, a cachaça de Cabo Verde) e os pontches, que são os licores. Você aí vai encontrar pontches de toda sorte, desde aqueles caseiros vendidos em garrafa pet reutilizada aos mais arrumadinhos tipo exportação. Há de figo, de coco, de café, e muita coisa.

Música & Cultura a apreciar. A música cabo-verdiana é seu principal produto de exportação hoje em dia. Eles aqui são dotados de uma forte cultura crioula — como eles chamam — de inspiração musical que combina as violas portuguesas com um quê de musicalidade negra. O resultado acaba se parecendo muito com a música brasileira ou caribenha. Lembra mais a América Latina que a África.

Não perca por nada neste mundo a oportunidade de ver música ao vivo em Cabo Verde — é das coisas mais fundamentais que há a se fazer aqui. Tanto a capital Praia quanto Santa Maria, na Ilha do Sal, têm performances em abundância aos fins de semana. Programe-se de acordo e, se possível, peça à sua acomodação que faça uma reserva com dias de antecedência. Isso se aplica sobretudo ao Quintal da Música, lugar mais famoso de Praia.
A música segue o estilo das mornas e coladeiras, dois dos tipos principais de música cabo-verdiana. Se ainda não conhece, dê-se um afago escutando a inconfundível Cesária Évora, que canta de ambos. Você pode também ir ver sua pequenina casa-museu no Mindelo, cidade natal da chamada “diva de pés descalços”.
Wi-fi e conectividade. Cabo Verde em matéria de conectividade se parece muito mais com a Europa que com a África continental. Qualquer pousadinha neste arquipélago terá melhor sinal de Wi-Fi que alguns hotéis finos da África Ocidental — cortesia do cabo de fibra ótica submarino que o conecta à Europa.
Praticamente todo lugar pega sinal de celular também. Se quiser estar online o tempo inteiro, pode adquirir um chip local ou ver os planos de deslocamento que as operadoras brasileiras hoje disponibilizam.
Idioma & trato com as pessoas. Os cabo-verdianos todos falam português (com um sotaque de Portugal, pois foram território português até 1975), mas sua língua do dia-dia entre si é também o crioulo, um português temperado com palavras africanas e várias pronúncias mudadas. Eles dizem que é praticamente o mesmo crioulo falado também na Guiné-Bissau — e, não, não dá para entender nada ou quase nada —, mas se nessa outra ex-colônia portuguesa há muita gente que só fala crioulo, aqui em Cabo Verde todos usam com fluência a língua de Camões.
Quase todo mundo aqui é mestiço, e eles se veem como algo original que nem é Europa nem África. Têm predominantemente de um biotipo mulato, uns mais amorenados e outros mais escuros — um tanto como muitos brasileiros, mas sem o componente indígena no sangue. Aqui, eles também não aderem ao linguajar norte-americano oriundo dos mitos de pureza do supremacismo branco de achar que qualquer pessoa com algum sangue africano é imediatamente um “negro”. Eles aqui todos se dizem “crioulos”.
Não espere que todo mundo aqui tenha o famoso “biotipo Cabo Verde”, supostamente de pele escura e cabelo liso. Isso é um exagero de quem ouviu o galo cantar e não sabe onde foi. Eles, geralmente, têm cabelos ondulados ou cacheados, não liso feito cabelo de índio. Já as feições variam, com as pessoas de Santo Antão e São Vicente mais puxadas para os traços europeus, e as pessoas da Ilha de Santiago com feições africanas mais visíveis.
As pessoas de uma ilha às vezes têm rixa contra os de outra (o que talvez não seja de surpreender), mas no fim das contas toda é uma gente sociável e que, inclusive, vê o Brasil com admiração. Vale muito vir conhecer estes irmãos.

Aonde ir, e quantas noites em cada cidade? Cabo Verde é um pequenino mundo sobre o Atlântico, e ver tudo nele requer tempo. Embora muito se fale e mostre da Ilha do Sal, para mim as duas ilhas fundamentais numa visita aqui são Santiago e Santo Antão. Na primeira estão a capital Praia e a histórica Cidade Velha, Patrimônio Mundial da Humanidade tombado pela UNESCO. Já em Santo Antão estão as paisagens mais dramáticas e melhores trilhas que vi e fiz em Cabo Verde.
Sua escolha, entretanto, dependerá do seu propósito de viagem.
- Praia? Ilhas do Sal e de Boa Vista.
- Cultura e História? Santiago e São Vicente.
- Trilhas e paisagens? Santo Antão e Ilha do Fogo (com um bate-e-volta dessa última até Brava).
Eu diria que 2 noites são o suficiente na capital Praia, com tempo o bastante para você fazer o passeio de um turno até a histórica Cidade Velha e ao Forte Real de São Filipe. Praia em si não tem lá taaaanto o que ver, mas há um centrinho arrumado, um museu legal sobre Amílcar Cabral e a guerra de independência (fechado aos fins de semana), e os bares-restaurantes com música ao vivo (sobretudo aos fins de semana).
Como tem coisa melhor nos fins de semana e outras não, o ideal caso você queira visitar várias ilhas de Cabo Verde é distribuir suas atividades em Praia entre mais de uma estadia, já que provavelmente passará por aqui de novo — e provavelmente pernoitará — para se deslocar entre as ilhas periféricas.



Não espere praias em Praia, já lhes digo. A alcunha apenas é porque a cidade oficialmente se chama Praia de Santa Maria. Praias aqui existem, mas não merecem seu tempo. Se quiser praia digna aqui na Ilha de Santiago, a recomendação é ir até a cidade de Tarrafal, em torno da qual há também algumas trilhas a fazer. Mas não é um lugar que eu tenha conferido pessoalmente (ficou para a próxima).
A Ilha do Sal — o outro grande nodo de voos domésticos e internacionais — tampouco é lugar onde se demorar muito. Eu diria que 2 noites são mais que o suficiente, a menos que você queira ficar lagarteando na beira-mar. As praias eu achei semelhantes às do Brasil, e o principal lugar onde ficar (a cidadezinha de Santa Maria) é relativamente pequena. O tour que há a fazer aqui é o chamado Tour da Ilha, que leva você até vários pontos curiosos desta ilha estéril de onde os portugueses resolveram extrair sal no século XIX.


Já as ilhas de São Vicente e Santo Antão são a casadinha que você faz juntas. Santo Antão não tem aeroporto, e só se chega a ela através de um ferry saído de Mindelo, a principal urbe de São Vicente. Mindelo acontece de ser a cidade natal de Cesária Évora e considerada a capital cultural de Cabo Verde. É uma cidade pequena, mas vale pelo menos 1 noite aqui para você dar seus bordejos e ver um pouco do centro antigo — além da casa-museu de Cesária Évora, se desejar. Há certa cena musical noturna também, sobretudo aos fins de semana.
Santo Antão requer pelo menos 2 noites, preferivelmente 3. Se você gosta muito de fazer trilhas, cogite até ficar mais que isso. As cidades aqui são pequenas e não têm quase nada, mas você precisa de pelo menos dois dias inteiros para fazer a descida pelo Vale do Paúl, do vulcão da Cova à Cidade das Pombas, e a trilha de Fontainhas. Essas duas são as principais, mas há outra a Cruzinhas e também uma que cruza o meio da ilha.



Eu fiz 2 noites no Sal, 2 em Praia, 1 em Mindelo e 3 em Santo Antão, num total aí de 8 noites. Não senti falta de mais tempo em nenhum deles. Teria, porém, gostado de agregar aí um par de noites na Ilha do Fogo, outro em São Nicolau e outro na Ilha da Boa Vista, mas estes destinos ficaram para outra vez. No geral, Cabo Verde não tem lugares onde permanecer muuuito tempo — os lugares são pequenos, mas há vários deles e espalhados em ilhas diferentes.
Se você ficou com alguma dúvida, quer algum toque, ou tem alguma pergunta que eu não respondi, é só pôr abaixo nos comentários.